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    Subespécie de bactéria da boca pode estar associada ao câncer colorretal

    Pesquisa identificou que sublinhagem da Fusobacterium nucleatum está presente em altos níveis em células desse tipo de câncer; o achado pode permitir avanços

    Fernanda Bassetteda Agência Einstein

    O câncer colorretal está entre os cânceres mais comuns do Brasil e é cada vez mais frequente em adultos jovens. Não à toa, pesquisadores do mundo todo buscam entender as causas da doença e o que leva esse tumor crescer e se espalhar pelo corpo. Entre os possíveis fatores pode estar um agente surpreendente, segundo um estudo publicado recentemente na revista Nature: uma bactéria presente na nossa boca, mais especificamente uma subespécie da Fusobacterium nucleatum (Fn).

    Essa linhagem (chamada F. nucleatum animalis C2, ou FnaC2) tem propriedades genéticas específicas que podem permitir que ela resista a condições ácidas no estômago, infecte tumores colorretais e potencialmente impulsione seu crescimento. Mas as novas descobertas sugerem que, no futuro, esse micróbio poderia ser usado como alvo para detectar e tratar o câncer colorretal mais precocemente.

    Segundo Christopher D. Johnston — um dos autores principais do estudo e pesquisador do MD Anderson Cancer Center, nos EUA —, em 2022 a equipe por trás da nova pesquisa descobriu que duas bactérias bastante conhecidas e comuns na nossa boca (Fusobacterium e Troponema) estavam presentes, em altos níveis, em células tumorais do trato gastrointestinal humano.

    No novo trabalho, a equipe se dedicou à análise das subespécies de F. nucleatum, batizadas de Fnn, Fnv, Fnp, Fna, para tentar descobrir qual delas estaria mais associada ao câncer colorretal. A ideia era entender se todas eram capazes de viajar da cavidade oral para o tumor ou se havia alguma com mais facilidade para isso.

    Para chegar ao resultado, coletaram amostras de tumores e fizeram o sequenciamento genético. Eles também usaram como base outros estudos genômicos comparativos, realizados in vitro e in vivo, além de cortes de validação de pacientes com e sem câncer.

    Descobriram, então, que nem todas as subespécies de Fusobacterim nucleatum são igualmente importantes no contexto do câncer colorretal — quem se destacou foi a FnaC2.

    Potencial vacina contra o câncer?

    O primeiro impacto dessa constatação é possibilitar que novos estudos se aprofundem na investigação dessa sublinhagem. “Comparar os genomas dessas subespécies e cepas que podem chegar aos tumores, versus aquelas que não podem, pode nos ajudar a descobrir a base genética da colonização do tumor”, observa Johnston, em entrevista à Agência Einstein.

    Além disso, a identificação da linhagem específica da bactéria que está presente no câncer colorretal abre novos leques de possibilidades para rastreamento de populações com maior probabilidade de abrigar esses microrganismos. “Com pesquisas adicionais, talvez esse conhecimento possa ser usado para projetar kits de triagem minimamente invasivos para detectar cânceres colorretais mais cedo e até mesmo influenciar quais tratamentos podem ser prescritos para pacientes que têm tumores com essas bactérias. Isso ainda está muito distante, mas é uma direção que estamos seguindo”, destaca Johnston.

    Mais do que isso: as implicações podem ser preventivas e terapêuticas. “Conhecer e entender as linhagens específicas de Fusobacterium nucleatum que estão realmente ligadas ao câncer colorretal é crucial, porque nem todas as Fusobacterium nucleatum contribuem para o risco de câncer da mesma forma”, pontua o pesquisador. “No caso da associação do HPV [papilomavírus humano] com o câncer cervical, por exemplo, esse conhecimento foi fundamental para o desenvolvimento de uma vacina eficaz contra as linhagens específicas associadas ao maior risco da doença.”

    Todo mundo tem essa bactéria?

    A cavidade oral contém cerca de 700 espécies diferentes de bactérias. A Fucobacterium nucleatum é uma das mais comuns, encontrada tanto no biofilme (placas bacterianas que se formam em torno do dente) quanto na saliva. “A frequência dessa bactéria aumenta com o acúmulo de biofilme, o que pode levar à gengivite, uma doença bucal presente na maioria da população e que pode evoluir para periodontite se não for tratada”, alerta Nidia Castro dos Santos, doutora em periodontia e professora do curso de Odontologia da Faculdade Israelita de Ciências da Saúde Albert Einstein.

    Para ela, a descoberta desse novo estudo é muito importante, porque poderá tornar a FnaC2 um possível marcador para tumores colorretais, oferecendo possibilidades para o desenvolvimento de exames diagnósticos ou até mesmo de avaliação de risco de câncer colorretal a partir de amostras orais. “Estudos futuros também poderão focar no desenvolvimento de medicamentos que tenham a FnaC2 como alvo terapêutico”, complementa.

    Santos destaca ainda que novas pesquisas devem avaliar se a presença dessa bactéria na boca aumenta o risco para o câncer colorretal somente em pessoas com doenças gengivais ou também em indivíduos com a saúde bucal em dia. “Seria interessante investigar se o tratamento da periodontite poderia contribuir para a prevenção ou tratamento do câncer colorretal, como já está estabelecido em pacientes com diabetes, por exemplo”, sugere a docente.

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