Pesquisadores testam pílula de RNA mensageiro que pode substituir vacinas
Cientistas do Instituto de Tecnologia de Massachusetts desenvolveram uma pílula que entrega RNA ao estômago sem que haja degradação do ácido no processo digestivo
O processo de absorção de algumas vacinas modernas, que utilizam a técnica de RNA mensageiro (mRNA) não são simples.
Alguns ácidos nucleicos podem ser extremamente sensíveis à degradação, particularmente no processo de digestão.
Pensando em como não perder essas substâncias, pesquisadores do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) desenvolveram uma forma de entregar o RNA ao corpo por meio de comprimido — o que evitaria a perda do material e seria melhor recebido por aqueles que temem as vacinas.
Os resultados do experimento foram publicados na revista científica Cell.
Como esses ácidos nucleicos são suscetíveis à atenuação quando entram no corpo, eles precisam ser transportados por partículas protetoras.
A equipe de pesquisa, liderada por Giovanni Traverso, professor do MIT e gastroenterologista no hospital Brigham and Women’s, e por Robert Langer, também do MIT, usou um tipo diferente de nanopartícula polimérica — macromoléculas formadas a partir de unidades estruturais menores para gera essa ‘proteção’ ao RNA.
O polímero, chamado poli(beta-amino ésteres), é o material utilizado para formar as partículas que entregam o RNA com eficiência ao corpo.
Ensaios clínicos
A pesquisa inicialmente foi realizada com camundongos. Para testar a eficácia das partículas, os cientistas injetaram a substância no estômago dos animais, sem usar a cápsula desenvolvida no laboratório.
Os resultados mostraram que o ácido nucleico absorvido pelo órgão, codifica uma proteína específica, chamada de repórter, que pode ser detectada no tecido se as células absorverem o mRNA com sucesso.
No decorrer dos estudos, os pesquisadores encontraram a proteína repórter nos estômagos dos camundongos e também no fígado — algo que sugere que o RNA havia sido captado em outros órgãos do corpo e depois transportado para o fígado, que filtra o sangue e elimina as toxinas.
Num segundo momento, testando porcos, os cientistas desidrataram elementos das nanopartículas de RNA e os colocaram em suas cápsulas — como aqueles revestimentos de comprimidos tradicionais.
A equipe conseguiu colocar cerca de 50 microgramas de mRNA por cápsula, e a ingestão de três cápsulas, estômagos dos porcos, totalizando 150 microgramas de mRNA. Para ter ideia de comparação, as vacinas da Covid-19 têm entre 30 e 100 microgramas de mRNA.
“O que isso nos permite fazer agora é reduzir a quantidade total de nanopartículas que estamos administrando”, disse em comunicado Ameya Kirtane, pesquisadora do MIT.
A proteína repórter foi produzida com sucesso pelas células do estômago dos porcos. Contudo, os pesquisadores não encontraram em outro lugar do corpo — como em camundongos.
Abordagens diferentes
Em pesquisas anteriores da equipe, o grupo demonstrou que versões ramificadas (ramos ligados à cadeia principal) dos polímeros são mais eficazes do que os polímeros lineares (compostos de muitos fios longos unidos, como se fossem uma corda contínua) na proteção de ácidos nucleicos e na entrada deles nas células.
Em 2019, os pesquisadores projetaram uma cápsula que, depois de ingerida, entregava medicamentos sólidos, como insulina, ao trato digestivo.
Já na pesquisa de 2021, a equipe usou uma abordagem diferente e utilizou uma pílula ainda maior para fornecer anticorpos monoclonais na forma líquida. E com o sucesso nas respostas, decidiram tentar o medicamento para fornecer ácidos nucleicos, que também são moléculas grandes.
Com os resultados, os cientistas descobriram também que usar dois desses polímeros juntos é mais eficaz do que apenas um.
Traverso disse em comunicado que entregar com êxito o RNA ao trato intestinal abre várias abordagens para a terapia, incluindo a vacinação potencial por via oral.
Alex Abramson, da equipe do MIT, disse que os pesquisadores esperam aumentar a captação de RNA em outros órgãos, alterando a composição das nanopartículas ou dando doses maiores. “Entretanto, também pode ser possível gerar uma forte resposta imune com entrega apenas no estômago”, aponta.
Ele acredita que os resultados servem não só para fornecer uma alternativa às vacinas, mas também para tratar doenças que atingem estômago e intestino.
“Quando você tem entrega sistêmica através de injeção intravenosa ou injeção subcutânea, não é muito fácil atingir o estômago […] Vemos os resultados como uma maneira potencial de tratar diferentes doenças que estão presentes no trato gastrointestinal”.