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    Novas epidemias de chikungunya incapacitam e matam no Brasil, revela estudo

    Cidades mais atingidas apresentaram alguma proteção contra novos surtos, mas municípios menos expostos a ondas anteriores continuam suscetíveis

    Lucas Rochada CNN , em São Paulo

    O aumento da incidência e distribuição geográfica de doenças como chikungunya e dengue, transmitidas pelo Aedes aegypti, representa um importante problema de saúde pública na região das Américas. O alerta foi feito pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

    A dengue é responsável pelo maior número de casos no continente, com epidemias ocorrendo a cada três a cinco anos. Embora a dengue e a chikungunya sejam endêmicas na maioria dos países da América Central, América do Sul e Caribe, na atual temporada de verão, o aumento da transmissão e a expansão dos casos de chikungunya foram observados além das áreas históricas de transmissão.

    De acordo com a OMS, 2023 mostra intensa transmissão de dengue. Além disso, são esperados maiores índices de transmissão nos próximos meses no hemisfério Sul, devido às condições climáticas favoráveis à proliferação dos mosquitos.

    Houve 2,8 milhões de casos de dengue relatados nas Américas em 2022, o que representa um aumento de mais de duas vezes quando comparado aos 1,2 milhão de casos relatados em 2021. A mesma tendência crescente foi observada para a chikungunya, com uma alta incidência de inflamação no cérebro (meningoencefalite) possivelmente associada à chikungunya.

    No nível regional, a OMS avalia o risco como alto devido à presença generalizada de mosquitos vetores, o risco contínuo de doenças graves e até morte e a expansão fora das áreas históricas de transmissão, onde toda a população, incluindo grupos de risco e profissionais de saúde, podem não estar cientes das manifestações clínicas da doença, incluindo quadros graves.

    Panorama epidemiológico no Brasil

    Um estudo internacional detalha a disseminação do vírus chikungunya (CHIKV) desde sua introdução no país há dez anos. A pesquisa, que conta com a participação da Universidade de São Paulo (USP), faz análise de 253.545 casos confirmados em laboratório entre 2013 e 2022.

    Os dados sugerem que a doença se distribuiu pelo território brasileiro de forma heterogênea, sendo que cidades mais afetadas apresentaram alguma proteção a novos surtos, enquanto municípios menos expostos a ondas anteriores permaneceram mais suscetíveis. Os resultados foram publicados no periódico científico The Lancet Microbe.

    “O CHIKV é uma grande ameaça à saúde pública global, e o vírus é transmitido principalmente entre humanos por mosquitos da espécies Aedes aegypti e Aedes albopictus, os mesmos vetores da dengue e da Zika. Durante os últimos 20 anos, a chikungunya teve mais de 10 milhões de casos relatados em mais de 125 países e territórios”, afirma o virologista William Marciel de Souza, da University of Texas Medical Branch, dos Estados Unidos, primeiro autor do artigo em comunicado.

    A doença é caracterizada por sintomas como febre alta de início repentino e dores intensas nas articulações. Apesar das semelhanças nos sintomas, a principal diferença entre a dengue e a chikungunya é a dor nas articulações, muito mais intensa na chikungunya, afetando principalmente pés e mãos, geralmente nos tornozelos e pulsos.

    O diagnóstico deve ser feito por um médico e pode ser confirmado por exames laboratoriais específicos, que podem ser feitos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Como a doença é transmitida por mosquitos, a medida de prevenção inclui a eliminação dos criadouros nas casas e vizinhança, que consistem basicamente em locais de acúmulo de água parada (veja abaixo).

    “A chikungunya é uma doença febril tipicamente caracterizada por sinais e sintomas humanos agudos e crônicos, geralmente com artralgia grave [dor nas articulações], muitas vezes crônica e incapacitante, mas também incluindo algumas complicações neurológicas e morte. Atualmente não há vacinas licenciadas ou medicamentos antivirais disponíveis para prevenir ou tratar a infecção”, explica o pesquisador.

    Conheça os principais criadouros do mosquito Aedes aegypti

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    Os pesquisadores estimam que 1,3 bilhão de pessoas vivem em áreas de risco para transmissão do vírus chikungunya, e o Brasil é o país com maior ocorrência de casos nas Américas.

    “Neste estudo epidemiológico, usamos dados de sequenciamento genômico, informações do vetor do vírus, o Aedes aegypti, e dados clínicos agregados de casos de chikungunya no Brasil, o que representa mais de 250 mil casos confirmados por exames laboratoriais. Em seguida, avaliamos a dinâmica espaço-temporal da chikungunya no Brasil por meio de séries temporais, mapeamento, distribuição de idade e sexo, letalidade e análises genéticas, entre outros fatores”, diz.

    Entre março de 2013 e junho de 2022, foram notificados 253.545 casos de chikungunya confirmados em laboratório em 3.316 (59,5%) dos 5.570 municípios, distribuídos principalmente em sete ondas epidêmicas de 2016 a 2022. A pesquisa revela que o Ceará foi o estado mais afetado, com 77.418 casos durante as três maiores ondas epidêmicas, ocorridas em 2016, 2017 e 2022.

    “Assim, sequenciamos os genomas do vírus e identificamos que a recorrência de chikungunya em 2022 no Ceará, após um hiato de quatro anos, foi associada a uma nova introdução de uma linhagem leste-centro-sul-africana, provavelmente originária de outros estados brasileiros. O estudo também estima que essa nova linhagem de CHIKV foi introduzida no Estado entre meados e final de 2021”, acrescenta Souza.

    “Com base na análise epidemiológica, identificamos que as recorrências de chikungunya no Ceará, Tocantins e Pernambuco foram limitadas a municípios com poucos ou nenhum caso relatado nas ondas epidêmicas anteriores, indicando que a heterogeneidade espacial da disseminação do CHIKV e a imunidade da população pode explicar o padrão de recorrência no país”, aponta o especialista.

    No Ceará, estado com o maior número de casos de chikungunya (77.418 casos) registrados no país, o número de mortes pela doença nos últimos dez anos foi superior ao da dengue. De acordo com o estudo foi 1,3 óbito por mil casos diagnosticados (a taxa de mortalidade da dengue é de 1,1 por mil).

    De acordo com os pesquisadores, o panorama traçado pelo estudo indica que as subsequentes epidemias de chikungunya não serão encerradas sem intervenções de saúde pública – como evidência, citam o surgimento de uma nova onda este ano, desta vez em Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Tocantins.

    De acordo com o virologista, os dados sugerem que as populações dos municípios mais afetados pelas ondas epidêmicas de chikungunya apresentaram algum nível de proteção imunológica contra a doença e transmissão que impediu temporariamente a recorrência de surtos explosivos. Em contraste, as populações de municípios menos expostos a ondas anteriores permaneceram mais suscetíveis. O que resulta na heterogeneidade geográfica da dinâmica de chikungunya no Brasil.

    “Nosso estudo mostra que as epidemias de chikungunya provavelmente continuarão a ocorrer se nenhuma intervenção for implementada, causando grandes ondas epidêmicas com milhares de casos e mortes devido à heterogeneidade geográfica associada à disseminação ou recorrência do vírus”, alerta Souza. “Por fim, destacamos que esses resultados serão úteis para informar o setor de saúde pública para antecipar e prevenir futuras ondas epidêmicas no país”, completa.

    (Com informações de Júlio Bernardes, do Jornal da USP, e de Julia Moióli, da Agência Fapesp)

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