Nise Yamaguchi questiona suspender estudo com hidroxicloroquina contra Covid-19
Médica criticou método de pesquisa publicada pela revista The Lancet, que relatou aumento na taxa de mortalidade entre os pacientes que utilizaram o medicamento
Médica defensora da hidroxicloroquina no tratamento contra o novo coronavírus e integrante do gabinete de crise criado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), a oncologista e imunologista Nise Yamaguchi questionou, em entrevista à CNN, a suspensão do estudo da hidroxicloroquina para tratamento da Covid-19 anunciado nesta segunda-feira (25) pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Ainda não há comprovação científica suficiente da eficácia da hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19.
Nise criticou o método da pesquisa publicada pela revista médica The Lancet na última sexta-feira (22), que relatou um aumento na taxa de mortalidade entre os pacientes que utilizaram o medicamento, e disse que ainda é cedo para suspender o uso.
Para ela, trata-se de um “estudo robusto do ponto de vista estatístico, mas que não responde algumas perguntas”.
“Se você pegar dois pacientes que passam mal, um toma o remédio e outro, não, ele morreu pelo fato da hidroxicloroquina e não pelo fato de que já estava grave?”, exemplificou ela.
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Com isso, a médica avalia que a decisão não deve significar a interrupção do uso do medicamento como tem sido feito e recomendado pelo próprio Ministério da Saúde.
“Acho que a OMS estava fazendo um estudo com um ‘braço’ [de pesquisa] bem esquisito e o fato de suspendê-lo é um espaço necessário, mas não deve anular o fato de que a hidroxicloroquina e a azitromicina devem ser dadas no início do tratamento”, defendeu. “É para não internar. Não é para pegar os pacientes que já estão grave e ficar comparando, daí diz que morreu por causa da hidroxicloroquina. Pode até ser, mas a gente não tem essa informação.”
“É um problema de ciência em que estudos retrospectivos sempre devem dar margem que esses dados não são substanciais o suficiente para anular a medicação. Agora, a gente vai ter mais cuidado com os pacientes, mas certamente naqueles com doenças menos avançadas a possibilidade de ter problemas é muito menor”, disse ela, que ainda reforçou o uso de baixa dosagem. “Eu sou favorável a doses mais baixas”.
A médica ainda defendeu o uso principalmente para os mais pobres. “Estamos sendo um pouco açodados em tirar a possibilidade do paciente do SUS conseguir se curar em uma fase inicial”, disse. “E o que vai acontecer? Os pobres vão continuar sofrendo mais por não ter acesso a um tratamento que pode salvá-lo e ter que ir para a UTI”.

Decisão da OMS
O diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus, anunciou que os estudos com hidroxicloroquina para tratamento da Covid-19 foram suspensos para avaliação de resultados. O anúncio foi feito durante a coletiva de imprensa nesta segunda-feira (25).
Na coletiva, o diretor-geral mencionou uma pesquisa publicada pela revista médica The Lancet na última sexta-feira (22), que relatou um aumento na taxa de mortalidade entre os pacientes que utilizaram o medicamento. O estudo também afirmou que os infectados tratados com hidroxicloroquina possuem maior probabilidade de desenvolver arritmias cardíacas.
A hidroxicloroquina tem sido estudada no ensaio clínico Solidarity (Solidariedade, em português), liderado pela OMS, que investiga a eficácia de quatro medicamentos no tratamento da Covid-19. “A Organização Mundial da Saúde continua trabalhando incansavelmente para obter mais pesquisas de desenvolvimento”, afirmou Tedros.
O ensaio acontece em mais de 400 hospitais, espalhados por 35 países. No Brasil, a organização do estudo é realizada pelo Instituto Nacional de Infectologia da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
O estudo
O estudo publicado na revista médica The Lancet apontou que pacientes infectados pelo novo coronavírus tratados com hidroxicloroquina ou cloroquina têm maior probabilidade de morrer ou de desenvolver arritmias cardíacas perigosas.
Os pesquisadores analisaram dados de 96.032 pacientes com Covid-19 de 671 hospitais. Todos foram hospitalizados do final de dezembro a meados de abril, e morreram ou tiveram alta médica até 21 de abril.
Ao todo, foram analisados 14.888 pacientes tratados com uma das drogas – apenas hidroxicloroquina (1.868) ou cloroquina (3.016) – ou um desses medicamentos combinados com um antibiótico – cloroquina e antibiótico (3.783) ou hidroxicloroquina com antibiótico (6.221). Foi formado também um grupo de controle com 81.144 pessoas que não receberam nenhum desses tratamentos.