Medicamentos contra Hanseníase estão em falta há quase 1 ano no Brasil, diz SBH
A hanseníase é uma doença crônica e infecciosa, que pode ser transmitida no ar por meio da fala, tosse ou espirro
Desde março de 2020, a Sociedade Brasileira de Hansenologia (SBH) emite ao Ministério da Saúde alertas sobre a falta de medicamentos para tratar a hanseníase no Brasil, como a PQT (poliquimioterapia, coquetel de drogas composto por rifampicina, dapsona e clofazimina), principal no tratamento da doença.
O primeiro ofício formal foi enviado em agosto do ano passado, quando foram registradas denúncias no estado de Pernambuco. Agora, em fevereiro de 2021, a escassez continua e tornou-se ainda pior: 18 estados já reportaram a falta dos remédios, de acordo com o Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan).
Até medicamentos substitutivos estão em falta no país que registra 30 mil casos da doença por ano, mas a SBG alerta que os números podem ser até 5 vezes maiores. De acordo com o Ministério da Saúde, o Brasil é o segundo país com o maior número de casos da doença do mundo, atrás apenas da Índia.
A hanseníase é uma doença crônica e infecciosa, que pode ser transmitida no ar por meio da fala, tosse ou espirro. Os principais sintomas são lesões na pele e acometimento das terminações nervosas, o que causa a diminuição da sensibilidade no corpo.
Documentos obtidos pela CNN mostram que o Brasil foi informado pela OMS em dezembro de 2019 que haveria atrasos na importação dos medicamentos em virtude de complicações na produção e que, por isso, sugeriu o racionamento dos estoques.
O documento também mostra que, em março de 2020, o Ministério enviou uma carta aos estados brasileiros informando quais cuidados deveriam ser prestados aos pacientes com hanseníase, visto que o país não teria estoque para o próximo mês.
O documento, escrito em novembro de 2020 pela Missão Permanente do Brasil junto à ONU, atribuiu a seguinte resposta sobre a escassez dos medicamentos.
“Há um processo em andamento no Ministério da Saúde para fomentar a produção nacional de medicamento. As negociações estão sendo coordenadas pela Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS / MS) e a Secretaria de Ciência e Tecnologia e Insumos Estratégicos para a Saúde (SCTIE / MS). Ambos os órgãos estão realizando uma audiência pública para laboratórios nacionais e uma chamada pública de laboratórios governamentais.”
O documento também afirma que o ministério solicitou, pela primeira vez, em caráter emergencial, a importação dos medicamentos à OMS em agosto de 2020 – mas neste período, foi informado que houve problemas com a qualidade do produto.
“Como em todos os anos, estamos fazendo ações de conscientização sobre a doença e sobre a importância do tratamento. Mas, em muitos estados, se a pessoa for diagnosticada hoje com hanseníase, ela não vai ter acesso à medicação por conta da crise de abastecimento que afeta o país” alerta o coordenador nacional do Morhan, Artur Custódio.
A maioria dos pacientes se cura no tempo previsto de seis meses a 24 meses. O tratamento feito com antibióticos é fornecido gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Mas, segundo a professora da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), o Ministério da Saúde precisa liberar novas drogas para tratar o bacilo de Hansen – que causa a doença e tem ficado mais resistente ao atual tratamento – como claritromicina, moxifloxacina e levofloxacina. A claritromicina já é ofertada na rede pública.
Quando o paciente está medicado, ele não transmite a doença, portanto para a hanseníase, que tem cura e não ocasiona em morte, é primordial o uso contínuo dos remédios. A interrupção do tratamento pode fazer com que a doença evolua e cause incapacidade física.
Após receber denúncias da interrupção de tratamentos, a Morhan e a SBH acionaram o Ministério Público Federal e solicitaram a abertura de um inquérito civil para garantir a regularização do abastecimento dos medicamentos da doença no país. A CNN procurou o MPF para mais informações sobre o inquérito, mas ainda não obteve resposta.
De acordo com a Morhan, o Ministério da Saúde recebeu uma leva dos medicamentos para distribuição nas últimas semanas, que apesar de estar em processo de distribuição, ainda não chegou a todos os pontos que sofrem com a escassez. Além disso, a nova leva deve cobrir apenas um mês de tratamento. A Morhan ainda alerta que pacientes no início do tratamento podem ter que começar do zero, pois casos já em andamento serão priorizados.
Uma reunião será realizada no dia 10 de fevereiro com os laboratórios para discutir essa questão, de acordo com a Morhan.
Por meio de nota, o Ministério da Saúde informou que “vem tratando sobre a possibilidade da produção de medicamentos para hanseníase no país adotando medidas que viabilizem a produção nacional” e que aguarda projeto da Biomanguinhos/Fiocruz para essa finalidade.
A pasta também diz que, em janeiro de 2021, iniciou a distribuição de mais de 50 mil cartelas de poliquimioterapia (PQT) aos estados, regularizando o abastecimento.
Nota do Ministério da Saúde
“O Ministério da Saúde vem tratando sobre a possibilidade da produção de medicamentos para hanseníase no país adotando medidas que viabilizem a produção nacional.
No final de 2020, a pasta realizou audiência pública com produtores nacionais no intuito de viabilizar a produção da poliquimioterapia (PQT) em território nacional.
O esquema de tratamento da PQT é formado por três medicamentos: rifampicina + clofazimina + dapsona. Atualmente este tratamento é doado ao Brasil pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
A pasta deve se reunir novamente com as empresas para discussão das propostas que são encaminhadas ao Ministério da Saúde pelos laboratórios públicos e privados.
Paralelo a isso, a pasta já está em diálogo com Biomanguinhos/Fiocruz que também deve apresentar um projeto de produção de medicamentos para hanseníase.
Em janeiro de 2021, o Ministério da Saúde iniciou a distribuição de mais de 50 mil cartelas de PQT aos estados, regularizando o abastecimento.
Foram distribuídos, também, Minociclina e Prednisona. Atualmente, a pasta aguarda a liberação sanitária para autorização de embarque de nova carga no quantitativo de 103.680 cartelas de PQT-MBA.
As orientações para os estados sobre como agir diante deste imprevisto podem ser acessadas na Nota Técnica publicada pelo Ministério da Saúde.
(*Supervisão de Giovanna Bronze)