“Kit sexo”: saiba o que é preciso ter sempre à mão como estratégia de prevenção
Para encontrar os métodos de prevenção de gravidez e de infecções sexualmente transmissíveis mais adequados é preciso compreender como se vivencia a própria sexualidade
Durante anos, as campanhas de prevenção contra as infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) estiveram focadas no uso da camisinha, com destaque para o preservativo masculino. Nesse cenário, se tornou comum observar em vídeos informativos, folhetos e cartazes com alguém segurando o item ou tirando ele da carteira.
Embora a camisinha permaneça como uma das principais medidas de se evitar infecções durante as relações sexuais, ela não é mais a única.
A estratégia chamada prevenção combinada busca atender às necessidades e contextos individuais, de modo a evitar novas infecções pelo HIV, sífilis, hepatites virais e outras ISTs. De acordo com o conceito, a estratégia de prevenção pode ser mais eficaz quando adotada com base nas características específicas do momento de vida de cada pessoa.
As recomendações incluem o uso dos preservativos masculino e feminino, profilaxias contra o HIV, como a PrEP, a prevenção da transmissão da mãe para o bebê durante a gestação, a testagem regular, diagnóstico e tratamento precoce das infecções, além da imunização para HPV e hepatite B, e adesão aos programas de redução de danos para usuários de álcool e drogas.
Mas como saber qual forma de prevenção se encaixa melhor ao seu contexto? A CNN consultou infectologistas que apontam alguns caminhos.
Entender como se vivencia a própria sexualidade
O ponto de partida para encontrar o método de prevenção mais adequado – ou a combinação dessas estratégias – é compreender como se vivencia a própria sexualidade, como explica o médico infectologista Rico Vasconcelos, pesquisador da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).
“Começa com o conhecimento na cabeça, no sentido amplo de saber o que você quer, o que você gosta, como você gosta e, dentro daquilo que você considera como vida sexual satisfatória, saber ao que você está exposto. Esse tipo de conhecimento é fundamental até mesmo para você pode se proteger daqueles desfechos não desejados que uma relação sexual pode ter”, diz.
O especialista traça um paralelo entre a prevenção de ISTs e os cuidados para evitar uma gravidez indesejada. “É engraçado, mas quando a gente pensa na gravidez, isso parece ser muito mais natural”, afirma.
“Uma pessoa também precisa saber o que transmite e de que forma transmite, que parte do sexo transmite para poder saber de que maneira evitar uma infecção sexualmente transmissível”, completa Vasconcelos.
Na “hora H”
Os preservativos masculino e feminino permanecem como medidas eficazes na prevenção da gravidez indesejada e de uma série de infecções transmitidas durante as relações.
Especialistas recomendam tê-los sempre à mão em casa, no carro e na bolsa. Além disso, deve-se ter atenção especial aos prazos de validade dos produtos e com o armazenamento adequado. Guardar em carteira, por exemplo, pode danificar o material devido à pressão e ao calor.
Estratégia adicional, o lubrificante íntimo cumpre um papel relevante como medida complementar de proteção à saúde sexual, como explica o médico infectologista Álvaro Furtado, do Hospital das Clínicas de São Paulo.
“O lubrificante é algo pouco discutido com relação ao painel de prevenção das ISTs, por que se tem a falsa ideia de que ele é algo acessório, que não é importante dentro de prevenção e um mero artefato durante a atividade sexual e na verdade não é isso”, diz.
“É interessante que ele seja utilizado de forma adequada, um bom lubrificante à base de pasta d’água, que tem como característica diminuir o atrito durante a atividade sexual”, orienta. “A redução do atrito diminui as portas de entrada para ISTs, então é importante uma boa lubrificação”, acrescenta Furtado.
O uso da camisinha é eficaz, desde que seja feito de maneira regular, afirmam os especialistas. Para indivíduos que não se adaptam ao uso constante do preservativo, podem ser indicadas medidas complementares de prevenção.
Entenda se a PrEP pode ser indicada ao seu contexto
Uma possibilidade é a combinação da Profilaxia Pré-Exposição, conhecida popularmente pela sigla PrEP, que previne a infecção especificamente do HIV.
Embora a PrEP não seja capaz de evitar o contágio por outras infecções além do HIV, os usuários da tecnologia devem fazer o acompanhamento regular de saúde, que inclui a testagem para o HIV e outras infecções, como a sífilis.
Essa testagem periódica para o rastreamento de ISTs também é considerada uma forma de prevenção. A investigação oportuna de sinais e sintomas permite o diagnóstico e tratamento, evitando o risco de complicações e interrompendo a cadeia de transmissão.
Segundo o infectologista e professor da Faculdade de Medicina da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Gustavo Magalhães, a periodicidade da testagem pode variar entre três meses e uma vez ao ano, conforme a atividade sexual de cada pessoa.
“A prevenção do HIV e das outras ISTs passa por um conjunto de ações, não é somente o uso do preservativo que também é muito importante. Se fizermos a testagem com frequência, principalmente de pessoas com risco elevado, conseguimos detectar mais rápido a infecção, começamos o tratamento e interrompemos a transmissão”, afirmou Gustavo.
A PrEP é a combinação de dois medicamentos (tenofovir + entricitabina) que bloqueiam as vias que o HIV usa para infectar o organismo humano. Nesse contexto, existem duas modalidades indicadas: a PrEP diária e a PrEP sob demanda.
PrEP diária: consiste na tomada diária dos comprimidos, de forma contínua, indicada para qualquer pessoa em situação de vulnerabilidade ao HIV.
PrEP sob demanda: consiste na tomada da PrEP somente quando a pessoa tiver uma possível exposição de risco ao HIV. Deve ser utilizada com o uso de dois comprimidos de 2 a 24 horas antes da relação sexual, + 1 comprimido 24 horas após a dose inicial de dois comprimidos + 1 comprimido 24 horas após a segunda dose.
Segundo o Ministério da Saúde, a PrEP sob demanda é indicada para pessoas que tenham habitualmente relação sexual com frequência menor do que duas vezes por semana e consigam planejar quando a relação sexual irá ocorrer.
Além dos remédios de ingestão por via oral, a PrEP também pode ser realizada a partir de um medicamento injetável, chamado cabotegravir, aprovado neste mês pela Agência Nacional da Vigilância Sanitária (Anvisa) para uso no Brasil.
O cabotegravir é de ação prolongada, com as primeiras duas injeções administradas com quatro semanas de intervalo, seguidas por uma injeção a cada oito semanas. Assim como os medicamentos orais, a versão injetável da profilaxia pré-exposição tem como objetivo reduzir os riscos de contágio caso uma pessoa seja exposta ao vírus – saiba como funciona a tecnologia.
Diferentemente da PrEP, a Profilaxia Pós-Exposição (PEP) é um recurso emergencial para pessoas que possam ter sido expostas à infecção, seja por situações como relações desprotegidas, rompimento da camisinha, violência sexual ou acidentes ocupacionais por profissionais da saúde.
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Imunização
O conjunto de ações da prevenção combinada também inclui as estratégias de vacinação contra o HPV e as hepatites A e B. Segundo a Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), a prevenção das doenças causadas pelos diferentes tipos de HPV depende principalmente da imunização e da realização de exames preventivos.
Em relação ao HPV, o imunizante é oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS) para meninas e meninos de 9 a 14 anos, além de mulheres e homens de 15 a 45 anos vivendo com HIV/Aids, transplantados e pacientes oncológicos.
A vacina para a hepatite B é oferecida para todas as pessoas, independentemente da idade, de forma gratuita no SUS, nas unidades básicas de saúde.
Já o imunizante contra a hepatite A faz parte do calendário infantil, no esquema de 1 dose aos 15 meses de idade (podendo ser utilizada a partir dos 12 meses até 5 anos incompletos – 4 anos, 11 meses e 29 dias). Além disso, a vacina está disponível nos Centros de Referência para Imunobiológicos Especiais (CRIE), para indivíduos mais velhos com comorbidades e condições de saúde específicas, incluindo pessoas vivendo com HIV, com outros tipos de hepatite, com problemas de coagulação e candidatos a transplantes.