Guia: veja o andamento e as principais dúvidas sobre as vacinas contra Covid-19
CNN preparou um guia sobre os principais pontos envolvendo os imunizantes contra a Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus
Reino Unido, Estados Unidos e Canadá começaram nos últimos dias a vacinar suas populações contra o novo coronavírus.
Ao mesmo tempo, o governo brasileiro divulgou o Plano Nacional de Imunização, que não contém uma data exata para o início da vacinação. Nas últimas semanas, o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, citou datas entre janeiro e março de 2021.
Além disso, apenas uma farmacêutica, a AstraZeneca, já entregou dados para a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) da Fase 3 de seus testes clínicos, etapa obrigatória para o imunizante pedir registro – emergencial ou definitivo – no país.
Esse cenário tem causado uma série de incertezas e dúvidas em relação às principais vacinas desenvolvidas contra a Covid-19.
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Veja abaixo o guia que a CNN preparou sobre os principais pontos envolvendo os imunizantes contra a doença:
• Quais as diferenças entre as vacinas em aprovação pela Anvisa?
A Anvisa divulgou uma tabela com a atualização do processo de andamento das análises no Brasil de cada uma das vacinas contra o novo coronavírus.
Segundo o órgão, apenas o imunizante da AstraZeneca/Universidade de Oxford apresentou dados sobre a Fase 3 de testes. A vacina é desenvolvida em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Os imunizantes da Janssen (da Johnson e Johnson), Pfizer e Sinovac apresentaram documentos sobre a Fase 2 de testes em novembro. O governo de São Paulo prometeu que enviará à Anvisa no dia 23 de dezembro os dados sobre a conclusão da Fase 3.
Tanto as vacinas da AstraZeneca quanto a do laboratório chinês Sinovac – em parceria com o Instituto Butantan – já iniciaram o processo de certificação de boas práticas.
Nesta semana, as farmacêuticas Pfizer e Janssen solicitaram à Anvisa o início do processo para obter esse mesmo certificado.
• Quem será vacinado antes?
De acordo com o Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19 entregue pelo governo ao Supremo Tribunal Federal (STF), a distribuição da vacina está prevista em três fases –misturada à vacinação contra a influenza – e deve durar quatro meses.
O plano inclui 108 milhões de brasileiros no grupo prioritário para receber a vacina contra a Covid-19.
O primeiro é formado pelos trabalhadores de saúde (quase 5,9 milhões de pessoas), seguidos pelas pessoas com 80 anos de idade ou mais (4,2 milhões).
Ainda entre os idosos, são 3,4 milhões com 75 a 79 anos; 5,1 milhões com 70 a 74 anos; 7 milhões com 65 a 69 anos e 9 milhões com 60 a 64 anos.
Dos grupos prioritários, a menor fatia é formada por funcionários do sistema prisional (144 mil pessoas).
O plano não traz, no entanto, a data de início da vacinação no Brasil. De acordo com o documento, para “a incorporação da nova vacina no Calendário Nacional de Vacinação faz-se necessária a aprovação da vacina pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)”.
• Quantas doses são necessárias para a imunização?
No começo de dezembro, o Ministério da Saúde divulgou que o “perfil da vacina desejada” é de um imunizante que tenha proteção contra o novo coronavírus garantida com apenas uma dose. Além disso, a pasta quer que a substância seja termoestável por longos períodos em temperaturas de 2ºC a 8ºC
No entanto, o Brasil só testa uma vacina que tem a proteção garantida com a dose única: a da Johnson & Johnson em parceria com a Janssen.
O imunizante da Universidade de Oxford utiliza a proteção dupla, assim como a da Pfizer-BioNTech (franco-norte-americana), da Moderna (norte-americana), da Sinovac (chinesa) e do Instituto Gameleya (russa).
A questão do armazenamento também pode ser um problema. As duas vacinas que já solicitaram autorização de uso emergencial nos EUA e na Europa precisam de uma temperatura muito abaixo das geladeiras dos postos de saúde do Sistema Único de Saúde (SUS). A da Pfizer precisa de -70ºC e a da Moderna, -20ºC.
Outra questão é o número de doses necessárias para imunizar toda a população brasileira. Em entrevista à CNN na semana passada, o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, afirmou que o Brasil tem previsão de receber 302 milhões de doses de imunizantes.
Seriam 260 milhões de doses da vacina de Oxford (100 milhões já contratadas e outras 160 milhões produzidas no país, no segundo semestres de 2021) além de 42 milhões de doses do consórcio da Covax Facility
• Como funcionam as vacinas contras o novo coronavírus?
As principais vacinas contra Covid-19 em desenvolvimento usam três métodos principais:
Vírus morto ou atenuado: Essa técnica é amplamente utilizada em vacinas já aprovadas, como a que é usada contra a gripe, por exemplo.
Por se tratar de um método já conhecido, os efeitos em longo prazo não são um mistério para os imunologistas, algo positivo para a execução de projetos de novas vacinas.
Segundo dados da Fiocruz (Fundação Instituto Oswaldo Cruz), o procedimento consiste em injetar vírus inativados por agentes químicos ou físicos no organismo, fazendo com que o sistema imunológico identifique o invasor e produza defesas contra ele. Assim, quando o corpo entrar em contato com o vírus ativo, não será infectado.
Uma variação famosa dessa tática é o uso do vírus atenuado. Nesse caso, o vírus não está completamente inativado. Ele está ativo, ou seja, sem capacidade de desenvolver a doença. Algumas vacinas que usam esse método são as contra a febre amarela e a poliomielite (oral).
A farmacêutica chinesa Sinovac está testando vacinas contra o novo coronavírus produzidas por meio desse método. O projeto está sendo testado no Brasil em parceria com o Instituto Butantan.
Engenharia genética: Outro método utilizado atualmente é produzido pela engenharia genética. Ele utiliza a informação genética de patógenos responsáveis pela codificação de proteínas importantes para a prevenção, segundo informações da Fiocruz.
Um dos empecilhos para a produção extensiva desse tipo de vacina é a dificuldade de produção em massa no Brasil, por ser uma tecnologia cara e avançada.
Novas técnicas: A Moderna, farmacêutica estadunidense, está desenvolvendo uma vacina que induz a imunização pela utilização do RNA mensageiro (mRNA).
Apesar de ser uma tecnologia muito avançada, alguns empecilhos podem atrasar a chegada dela para a população geral. Nenhuma vacina aprovada para uso em seres humanos anteriormente a utilizava.
Enquanto isso, a Universidade de Oxford, em parceria com a farmacêutica AstraZeneca está testando uma tecnologia também inovadora, mas diferente da citada anteriormente.
“A estratégia que eles usam é chamada de ‘vetores virais’. Basicamente se usa um vírus chamado ‘adenovírus’, um adenovírus do macaco. Modifica-se o vírus acrescentando uma parte do vírus do corona, o SARS-CoV-2 e injeta-se esse vírus na cobaia. Primeiro utilizou-se ratinhos, macacos, e agora estão testando em seres humanos”, explicou à CNN, Gustavo Cabral, imunologista formado em Oxford.
• Quem já teve Covid-19 pode se vacinar?
Para a infectologista Ho Yeh Li, coordenadora da UTI de Infectologia do Hospital das Clínicas da USP, a imunização é recomendada mesmo para quem já enfrentou a Covid-19.
“A maioria dos estudos fizeram acompanhamento de 3 a 5 meses, e boa parte dos pacientes mantém anticorpos detectáveis, mas ainda não dá para dizer o que isso realmente significa, porque há pacientes que, mesmo com anticorpos, se reinfectaram”, explica.
A especialista afirma que, como a doença é nova, as pesquisas ainda não conseguem definir com exatidão o tempo de permanência dos anticorpos no sistema imunológico de pessoas que já foram infectadas.
Já o infectologista Helio Bacha, consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), diz que, por experiências prévias, a resposta protetora de doenças virais respiratórias costuma ser “parcial e temporária” e que, por isso, a vacina reforça essa resposta imunológica.
“Mesmo quem teve a doença deve ser vacinado, porque não sabemos por quanto tempo o corpo mantém os anticorpos gerados pela própria doença”, afirmou. “Eu mesmo tive [Covid-19] e participei como voluntário no protocolo de uma das vacinas.”
• As vacinas são seguras?
Os cientistas dizem que as vacinas são a nossa ferramenta mais eficaz no combate a doenças infecciosas, prevenindo 6 milhões de mortes todo ano. E vários estudos provaram que são seguras.
Uma pesquisa de 2018, feita pelo Wellcome Global Monitor, descobriu que 95% das pessoas no sul da Ásia acreditam que as vacinas são seguras, mais do que em qualquer outra região.
Mas há controvérsias mais recentes. Nas Filipinas, um surto de sarampo no ano passado foi associado a uma forte queda na adesão às vacinas. A queda foi consequência da suspensão, em 2017, de um programa de vacina contra a dengue que, como se descobriu depois, poderia ter potenciais efeitos colaterais.
Embora o ceticismo da vacina tenha sido historicamente um problema na Europa e nos EUA, há sinais de que as dúvidas estão se espalhando.
No Brasil – onde empresas britânicas, chinesas e norte-americanas estão conduzindo testes – uma pequena porção de dissidentes se manifestou nas redes sociais contra a “vacina chinesa”.
• Posso escolher qual vacina tomar?
Num primeiro momento, não. A compra das doses das vacinas, bem como a distribuição, será feita pelo Ministério da Saúde.
Ainda não está claro se a pessoa será informada sobre qual das diferentes vacinas ela receberá ao se apresentar a um posto de vacinação para ser imunizada contra Covid-19
• Como sei qual a melhor vacina para mim?
Neste momento, não é possível fazer essa distinção. Seriam necessários estudos muito mais profundos e detalhados para identificar se algum dos imunizantes é mais eficiente para determinadas populações ou subpopulações.
“Durante muito tempo, havia duas opções de vacinas contra a poliomielite, da Salk e da Sabin. No começo, a da Sabin se mostrou superior, mas hoje é a da Salk que tem menos efeito colateral”, disse Bacha.
“Em princípio, para algumas populações ou subpopulações a vacina X pode ser melhor que a vacina Y, mas ainda é preciso avaliar a efetividade das vacinas para chegar a essa conclusão”, completou.
• Posso estar protegido mesmo sem a vacina?
Sim, é possível graças ao efeito da imunidade de rebanho, já que quanto maior for a quantidade de pessoas imunizadas contra a Covid-19, menor será a taxa de transmissão da doença.
“Quando nós vacinamos a população, a ideia é sempre gerar proteção coletiva e não apenas dos indivíduos”, explicou o infectologista Helio Bacha.
“Se 5%,10% não quer ou não puder se vacinar, eles acabarão protegidos pelo fato dos outros 90% terem sido imunizados”, completou.
É importante lembrar, porém, que essas pessoas não vacinadas continuarão sujeitas a se infectar e também a transmitir o novo coronavírus entre si.
• Ainda precisarei usar máscara depois da vacina?
Sim. Embora a eminente chegada dos imunizantes ao país seja um passo importante para enfrentar a disseminação do novo coronavírus, seu efeito não será visto da noite para o dia e, por isso, será preciso manter os cuidados básicos.
“É imprescindível que se mantenha todas as normas e diretrizes, inclusive o distanciamento social, o funcionamento de estabelecimentos com horário e público reduzidos e o uso de álcool gel”, afirmou recentemente à CNN Mônica Levi, presidente da Comissão de Revisão de Calendários Vacinais da Sociedade Brasileira de Imunizações.
Ela reitera que a máscara segue sendo um acessório indispensável, mesmo para quem for vacinado. A especialista estende a recomendação a todas as outras medidas de higiene.
Antônio Bandeira, diretor da Sociedade Brasileira de Infectologia, explicou que “toda vacina implica numa redução de transmissão”, mas que o combate efetivo ao vírus passa pela manutenção dos cuidados básicos “até que a quantidade de pessoas vacinadas seja suficientemente grande”.
• Posso tomar a vacina no trabalho?
Num primeiro momento, não. De acordo com informações recentes do Ministério da Saúde, a vacinação contra a Covid-19 será iniciada no país por meio do Programa Nacional de Imunização, no Sistema Único de Saúde (SUS).
Além disso, a vacina poderá ser oferecida por clínicas e laboratórios particulares, desde que de forma totalmente gratuita, apenas para diminuir a sobrecarga da rede pública.
Em nota, a Associação Brasileira de Clínicas de Vacinas (ABCVAC) afirmou que “foi feito contato com todos os fabricantes das vacinas contra o novo coronavírus que estão em pesquisa” e que a resposta unânime é que não existe “qualquer previsão de abastecimento do mercado privado, uma vez que todos os esforços estão direcionados para atender aos setores públicos em diversos países”.
Sendo assim, também não é viável, no curto prazo, que as empresas possam oferecer doses dos imunizantes para os funcionários.
• Quanto tempo demora até nosso corpo criar anticorpos?
Segundo Bandeira, “em média, uma vacina gera anticorpos a partir do décimo dia”.
A médica Mônica Levi também aponta para o fato de que o Brasil é um país com alta densidade populacional, o que aumenta o período de imunização.
“Vamos vacinar milhões de pessoas dos grupos de risco nesses primeiros meses, mas isso ainda representa muito pouco dentro da população geral do país”, explica.
(Com informações de Ana Paula Lima Ribeiro, em colaboração com a CNN Brasil)