Falhas no diagnóstico respondem por 16% dos danos graves a pacientes
A maioria dos casos pode ser evitada; desafio é mudar a cultura das instituições e melhorar a integração entre os profissionais de saúde e quem procura atendimento
Falhas no diagnóstico são a principal causa de prejuízos a pacientes no mundo todo. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), esses erros representam 16% dos danos evitáveis que um paciente pode sofrer. Isso inclui eventos graves ou até mesmo catastróficos, ou seja, quando há danos permanentes ou morte. Estima-se que cerca de 5% dos atendimentos em ambulatório não recebam um diagnóstico correto, o que impacta todo o tratamento. Nos Estados Unidos, por exemplo, isso significa entre 40 mil e 80 mil casos todos os anos.
Além disso, um em cada dez pacientes sofre por erros em cirurgias e na prescrição e no uso de medicamentos, de acordo com a OMS. A cada ano, essa realidade resulta em cerca de 3 milhões de mortes. A maioria desses casos, porém, poderia ser prevenida.
Para alertar sobre o tema, a OMS instituiu o Dia Mundial da Segurança do Paciente, celebrado no dia 17 de setembro. O objetivo é propor ações e diretrizes para minimizar falhas evitáveis e reduzir o risco de danos desnecessários associados ao cuidado com a saúde. O tema central deste ano é “Melhorar o diagnóstico para a segurança do paciente”.
“A falha no diagnóstico é o problema número um em segurança do paciente, mas ainda é um tema pouco conhecido e pouco discutido no Brasil”, diz o médico intensivista Gustavo Janot, do Hospital Israelita Albert Einstein. “De modo geral, isso ainda não é prioridade nas instituições e não temos sequer a real dimensão da situação, pois é subnotificado e pouco estudado no nosso país”, completa a enfermeira Aline Pedroso, consultora de Qualidade e Segurança do Paciente no Einstein.
E não se trata apenas de erro médico. “As falhas são muito mais amplas e incluem falhas no modelo de cuidado (comunicação entre profissionais, transição do cuidado, laudos de exames, disponibilização de especialistas) e falhas cognitivas”, explica Janot.
Isso porque o diagnóstico deveria ser feito a partir de um processo em equipe, envolvendo várias fases: análise do histórico do paciente, exame físico, avaliações complementares e troca de informações entre diferentes profissionais da área da saúde, como enfermeiros, fisioterapeutas e farmacêuticos. Com isso, é possível estabelecer uma hipótese sobre o caso e traçar uma estratégia de tratamento.
Mas nesse caminho pode haver várias falhas. Segundo Janot, as principais são as que envolvem o fator humano, principalmente as tomadas de decisão dos médicos. “Os pacientes podem apresentar sintomas que são ambíguos ou inespecíficos e induzir conclusões equivocadas. Febre ou náusea e vômitos, por exemplo, são sintomas que podem estar por trás de algo muito simples ou muito grave”, exemplifica o médico intensivista.
Uma dor no peito tratada como ansiedade pode ser uma embolia pulmonar maciça, por exemplo. Mesmo os ataques cardíacos podem apresentar sintomas fora do comum, como dor abdominal. “O médico deve tomar a decisão de forma mais analítica, considerando todas as possibilidades”, diz Janot.
Dentre os vários fatores que levam a diagnósticos errados, um dos principais é a falha na comunicação, segundo Aline Pedroso. Isso inclui desde pacientes que não fornecem todas as informações do seu histórico até profissionais que não dialogam entre si. “Ainda que o diagnóstico seja um ato médico, o processo diagnóstico é um trabalho em equipe, incluindo o paciente, equipes multidisciplinares e multiprofissionais, mas o cuidado ainda é muito fragmentado”, avalia Pedroso. Daí a necessidade de mais integração entre as diversas equipes envolvidas.
Também pode haver problemas de treinamento, coordenação de cuidado e de protocolos. Sem contar o papel do paciente, que é essencial. “Muitas vezes, o paciente chega tarde ao sistema de saúde, ou não adere ao tratamento, ou não conta toda a verdade”, observa Janot. “Por isso, devem ser encorajados a participar do processo diagnóstico, perguntar, detalhar seu histórico e conhecer todo o seu tratamento”, diz o médico. A enfermeira concorda: “Temos que envolvê-lo para que ele se torne parte do processo.”
A boa notícia é que é possível reduzir os riscos dessas falhas. “Mas, para isso, é preciso uma grande mudança cultural”, frisa Janot. “Tanto do lado dos profissionais da saúde quanto das pessoas que buscam atendimento.”
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