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    Especialistas avaliam benefícios e riscos de flexibilizar uso de máscaras

    Especialistas comentam cenário epidemiológico e critérios adotados para a flexibilização do uso de máscara em algumas capitais

    Ausência de máscara e desrepeito à quarentena em caso de contaminação foi punida com pagamento de indenização
    Ausência de máscara e desrepeito à quarentena em caso de contaminação foi punida com pagamento de indenização Agência Brasil

    Ingrid Oliveirada CNN

    São Paulo

    A cidade do Rio de Janeiro decretou na segunda-feira (7) o fim da obrigatoriedade do uso de máscaras em locais fechados. O decreto foi publicado em edição extra do Diário Oficial do Município.

    O estado de São Paulo liberou o uso de máscaras ao ar livre nesta quarta-feira (9). Isso se aplica a ruas; parques, pátio, centro de eventos e em jogos de futebol

    Ao menos 20 países flexibilizaram as medidas restritivas no combate à pandemia. O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, anunciou que as restrições sanitárias terminarão na Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte — que compõem o Reino Unido — na quinta-feira (24). No dia 1º de abril, testes gratuitos para a Covid-19 deixarão de ser fornecidos à população em geral.

    Outras capitais brasileiras já dispensaram a obrigatoriedade do uso de máscaras em ambientes abertos, segundo um levantamento feito pela CNN.

    Capitais e distritos que desobrigaram o uso de máscara em local aberto:
    • Belo Horizonte;
    • Cuiabá;
    • São Luís;
    • Boa Vista;
    • Florianópolis;
    • Macapá;
    • São Paulo;
    • e o Distrito Federal.
    Capitais obrigam o uso de máscara tanto em ambientes fechados quanto abertos
    • Vitória;
    • Curitiba;
    • Goiania;
    • Recife;
    • Aracaju;
    • Belém;
    • Porto Velho;
    • Palmas;
    • Campo Grande (deve decidir sobre o assunto hoje);
    • Porto Alegre (deve decidir sobre o assunto amanhã);

    Duas capitais irão desobrigar nas próximas semanas o uso de máscara em locais abertos, mas permanecerão o obrigando em fechados: Manaus (16/03) e Teresina (14/03).

    Algumas capitais não responderam quanto sua posição: Maceió, Salvador, Fortaleza, João Pessoa, Natal e Rio Branco.

    As decisões chegam em meio a uma queda nos registros diários de Covid-19 no país. Até a data desta publicação, a média móvel de casos era de 46.742, sendo uma redução de -28,8% em relação à média móvel da semana anterior (23 fevereiro a 1 de março), segundo dados do do Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass)

    A situação fez o governo federal avaliar a possibilidade de rebaixar o status de pandemia para endemia.

    Mas, é hora de flexibilizar máscaras?

    Liberação de máscaras

    A CNN entrou em contato com a Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, a primeira capital a liberar o uso de máscaras em locais fechados para entender quais critérios foram adotados para base da decisão.

    À reportagem, o secretário municipal de Saúde do RJ, Daniel Soranz, afirmou que a cidade está se preparando gradativamente para a retirada das medidas de restrição.

    “Associando alta cobertura vacinal ao baixo número de casos e baixa taxa de transmissão, é possível que a gente possa gradativamente ir retirando as medidas restritivas, faltando agora somente a retirada do passaporte vacinal, que deve acontecer quando a gente avançar um pouco mais com a dose de reforço na cidade do Rio”, afirma o secretário.

    Soranz aponta que um dos critérios é a cobertura vacinal avançada na capital. “Hoje a gente já tem uma alta cobertura vacinal na cidade do Rio de Janeiro. 99% das pessoas acima de 12 anos já tomaram as duas doses da vacina, 56% já tomaram a dose de reforço e gradativamente a gente avança nessa cobertura vacinal, o que dá um panorama epidemiológico muito favorável para a cidade.”

    Estêvão Urbano, presidente da Sociedade Mineira de Infectologia (SMI), disse à CNN que como a vacinação protege mais contra casos graves, mas nem tanto contra casos leves, é importante avaliar o momento antes de liberar máscaras — tanto em locais fechados quanto abertos.

    “É importante avaliar mais como será o comportamento da epidemia nas próximas semanas antes que essa desobrigatoriedade seja algo mais palpável e mais seguro”, diz o infectologista.

    Urbano ressalta que esta é uma “opinião pessoal e que não significa uma opinião da maioria. Nesse sentido, a vacinação não é suficiente para uma liberação tão grande assim das restrições”.

    O presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Juarez Cunha, falou à CNN que o ideal seria observar o andamento do vírus nos próximos dias.

    “A decisão [de desobrigar o uso de máscaras em ambientes fechados ou abertos], na nossa opinião, é muito precoce. Achamos que seria necessário observar evolução da Ômicron mais duas outras semanas,  porque temos um número muito importante ainda de pessoas sendo diagnosticadas, apesar de termos quadros mais leves, as internações continuam acontecendo e as mortes também, em especial nas pessoas não vacinadas”, disse Cunha.

    Ele ainda destaca que há “a situação das crianças não vacinadas, que representam um número muito baixo. A flexibilização também vai levar a um risco maior para essas populações não vacinadas”, afirma.

    Já o infectologista e pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Júlio Croda, a favor da derrubada do uso de máscaras em locais fechados, diz que a situação da pandemia na cidade favorece a decisão da prefeitura do Rio de Janeiro.

    “O Rio tem uma cobertura em crianças acima de 50%, o que é maior do que em outras cidades do Brasil. Então, eu acredito que sim, estamos avançando e as medidas individuais devem ser avaliadas em cada contexto epidemiológico e as crianças não têm tanto risco. Acredito que a baixa vacinação não é uma justificativa para manter o uso de máscara, principalmente em escolas, já que o risco de hospitalização e óbitos nessa população é menor do que na população geral”, pontua o especialista.

    Há quem defenda a flexibilização parcial. Robson Reis, infectologista e professor da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública (EBMSP), disse à CNN que a não obrigatoriedade não significa que o uso de máscara não seja recomendável.

    “Eu acho sim que, diante do momento epidemiológico que estamos vivendo, ou seja, do número de casos diários notificados de Covid-19, com a queda acentuada na média móvel dos números de casos novos, bem como o percentual de leitos hospitalares, seja enfermarias de UTI, já nos permite avançar em relação a flexibilização geral. Seja no aumento da capacidade de pessoas em eventos esportivos, culturais e na não obrigatoriedade do uso de máscaras em locais abertos. Eu ainda seria um pouco conservador para o uso de máscaras em locais fechados, sobretudo para as pessoas que têm o risco de complicações”, disse Reis.

    Nos Estados Unidos, por exemplo, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) sugeriu que 78% das pessoas do país não precisam mais usar máscara em ambientes fechados.

    A recomendação tem como base três princípios de dados comunitários: o número de novas hospitalizações por Covid-19, a capacidade hospitalar e novos casos de Covid-19. O site do CDC inclui uma lista de regiões dos EUA e seus níveis atuais de Covid-19.

    Cenários epidemiológicos no Brasil

    De acordo com os especialistas ouvidos pela CNN, as medidas de flexibilização no uso de máscara podem trazer diferentes cenários epidemiológicos.

    Cunha lembra que, tanto a situação epidemiológica como a cobertura vacinal são muito diferentes nas cidades e estados. Para ele, é necessário “ter muito cuidado quando algum local toma essa iniciativa, porque não seria a realidade de outros”, afirma.

    Urbano aponta que quanto mais secretarias recomendarem a desobrigatoriedade do uso de máscaras, isso pode se ampliar a nível nacional. “Como eu não defendo ainda essa liberação, isso está muito precoce. Eu acho que tem pouco tempo da melhoria da pandemia para tomar decisões e restrições tão amplas como estão tomando muito precocemente” disse.

    O presidente da SBIm aponta que os recursos de saúde são completamente diferentes nas diferentes localidades. “Isso pode levar a um aumento no número de casos e pode impactar muito o sistema de saúde”, avalia Cunha.

    Os dados na cidade do Rio de Janeiro são favoráveis, de acordo com o secretário. Soranz aponta que o Rio de Janeiro tem um panorama epidemiológico muito melhor do que teve durante toda a pandemia.

    “Hoje a gente tem a menor taxa de transmissão de Covid-19, que está em 0.3. Também o índice de positividade dos testes para Covid-19 está abaixo de 5%, o que a gente considera ideal. Cerca de 0,8% das pessoas internadas na cidade de são internadas por Covid-19, também é um índice bastante baixo”, avalia.

    O secretário diz que com indicadores favoráveis a Secretaria Municipal de Saúde acredita que precisa ser coerente nas medidas descritivas.

    “Quando foi necessário, quando houve um aumento da disseminação, nós obrigamos as pessoas utilizarem máscara, colocamos medidas restritivas e agora que a gente tem um cenário mais favorável, muito melhor do que a gente teve qualquer outro momento da pandemia, a gente também tem certeza que é o momento de facultar das pessoas que não quiserem utilizar máscara”, ressalta Soranz.

    A Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, no entanto, continua recomendando o uso de máscaras em locais fechados a pessoas que têm maiores riscos.

    “A gente mantém a recomendação para pessoas que não se vacinaram, pessoas com algum tipo de imunossupressão e comorbidade. Essas devem manter a utilização [de máscara] na Cidade do Rio de Janeiro”, afirma o representante.

    O professor da EBMSP concorda, mas com ressalva. “É importante a manutenção disso. Seria interessante que fosse realizado de forma gradativa [a flexibilização]”, avalia Reis.

    Riscos de uma flexibilização em massa

    Para Urbano, algumas dúvidas ficam em aberto sobre os próximos riscos da flexibilização acelerada. O presidente da SMI avalia que “o impacto das recomendações começam a ser sentidos até 21 dias depois da implementação”.

    “Se muitas pessoas aderirem, o impacto vai ser medido mais precocemente. Se houver um certo receio, e as pessoas continuarem usando máscara, isso pode demorar mais tempo”, disse Urbano.

    Cunha, da SBIm, explica que os riscos, além do aumento no número de casos, são especialmente importantes em grupos não vacinados.

    “Nós temos as crianças menores de cinco anos que não podem ser vacinadas; as de cinco a 11, ainda pouco vacinadas e nas outras faixas etárias também nós temos ainda muito a fazer, em especial com uma dose de reforço que tem um percentual bastante baixo de adesão”, disse.

    Para Reis, “diante do status epidemiológico atual, percentual de leitos hospitalares ocupados e avanço da vacinação, medidas como a não obrigatoriedade do uso de máscaras provavelmente não terão impacto no aumento do número de casos. Esse é um risco calculado, baseado em dados reais, em dados objetivos”, avalia.

    Urbano  avalia que, o que a comunidade científica espera, é que haja uma ‘barreira imunológica’ que possa evitar aumento de casos.

    Como muitas pessoas se infectaram com a Ômicron, desde dezembro, haveria menos pessoas suscetíveis ao vírus, explica o especialista.

    “Mas existe um risco. Sempre existe um risco dessas flexibilizações muito rápidas provocarem um novo novo fluxo de infecção e o surgimento de novas variantes”, alerta.

    Acho que ainda é cedo para gente tirar todas essas restrições, é como se nós tivéssemos voltado à vida normal ainda não está na hora”, afirma Urbano.

    Plano de contingência

    No ano passado, o estado de São Paulo avaliou a liberação da obrigatoriedade do uso de máscaras em locais abertos, mas voltou atrás na decisão. Na época, o Comitê Científico do governo apontou que havia incertezas quanto ao impacto da variante Ômicron às vésperas do fim de ano.

    O surgimento de novas variantes é algo esperado, segundo Estêvão Urbano, da SMI.

    “Esse é um problema mundial, não é um problema nacional. A gente tem que ter cuidado mundialmente para não facilitar o aparecimento de uma nova variante”, explica.

    Questionado sobre os planos de contingência para qualquer aumento no número de casos, Soranz disse que a “SMS-RJ já mostrou que tem um plano de contingência para a Covid-19, ampliou todos os leitos que foram necessários.”

    “A gente tem capacidade instalada para atender novos casos, mas a princípio não parece que a gente vai ter aumento de casos na cidade do Rio de Janeiro, o que que nos parece hoje, é uma redução de número de casos sustentada, e também uma redução de internações hospitalares. Hoje a gente tem o melhor cenário epidemiológico desde o início da pandemia”, diz o secretário.

    “É claro que com alta cobertura vacinal, a gente não teve uma demanda grande mesmo com a nova variante e também apresentamos uma grande capacidade de testagem nesse período, foram um milhão e 600 mil testes em um único mês”, Soranz.

    Para Reis, o cenário epidemiológico da Covid está muito mais confortável diante da média móvel de casos diários, percentual de ocupação de leitos hospitalares e do fator RT (fator que indica transmissibilidade).

    “Já é um momento que nos traz essa possibilidade de avançarmos em relação às medidas de flexibilização da não obrigatoriedade de uso de máscara. Contudo, não podemos esquecer que casos novos ainda continuam a ser diagnosticados, óbitos continuam ocorrendo; e que já são mais 29 milhões de casos no país e mais 650 mil óbitos pela doença”, diz o infectologista.

    Para o professor da EBMSP, “a orientação do uso de máscaras ainda deveria ser mantida locais fechados e podendo reavaliar gradativamente, até colocarmos um ponto final, de vez, na pandemia.”

     

    (Com informações de Danilo Moliterno e Giulia Alecrim, da CNN)