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    Doença pulmonar causa o envelhecimento precoce do sistema imune, diz estudo

    Análises mostraram que os pacientes com a doença pulmonar obstrutiva crônica têm células que expressam características consistentes às do envelhecimento prematuro do sistema imunológico

    Cerca de 64 milhões de pessoas no mundo são afetadas pela DPOC, segundo estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS)
    Cerca de 64 milhões de pessoas no mundo são afetadas pela DPOC, segundo estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS) Getty Images/Prapass Pulsub

    Luciana Constantinoda Agência Fapesp

    A doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) reúne um conjunto de doenças respiratórias que inclui a bronquite crônica e o enfisema, que estão relacionadas ao tabagismo. A doença inflamatória crônica  é caracterizada pela obstrução do fluxo aéreo e comumente induzida pela fumaça do cigarro e pela poluição atmosférica.

    Cerca de 64 milhões de pessoas no mundo são afetadas pela DPOC, segundo estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS). No Brasil são aproximadamente 6 milhões, dos quais 60% dos casos seriam de fumantes ou ex-fumantes.

    Uma pesquisa desenvolvida na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) apontou que a doença pode levar a um envelhecimento precoce do sistema imunológico.

    Os achados, publicados na revista Immunity & Ageing, podem ser um caminho para explicar o motivo de indivíduos com a doença apresentarem menor resposta a vacinas e serem mais suscetíveis a processos infecciosos, por exemplo.

    Os pesquisadores identificaram que pacientes com DPOC apresentam um conjunto de alterações ligadas ao envelhecimento celular, processo chamado de imunossenescência, que afeta os linfócitos T CD4+ e CD8+, prejudicando a resposta imunológica.

    Para realizar o estudo, foram recrutadas 92 pessoas, distribuídas em quatro grupos: pacientes com DPOC, fumantes sem evidência de doença pulmonar, idosos saudáveis e adultos jovens. Os cientistas analisaram sete marcadores associados à diferenciação tardia das células, senescência e exaustão celular para cada um desses grupos.

    As análises mostraram que os pacientes com a doença pulmonar obstrutiva crônica têm células que expressam características consistentes às do envelhecimento prematuro do sistema imunológico.

    O professor Gil Benard, da USP, orientador do estudo, afirma que o entendimento dos mecanismos envolvidos na imunossenescência é importante especialmente no contexto do aumento da população idosa.

    “Compreender como lidar com o organismo dessas pessoas, mais propenso a cânceres, infecções e menos responsivas a vacinas, pode abrir caminhos para buscar um melhor funcionamento do sistema imunológico. Esse trabalho ajuda a entender o que acontece e onde é possível tentar atuar”, explica Benard.

    Primeira autora da pesquisa, resultado de seu doutorado, Juliana Ruiz Fernandes explica que, ao comparar dados de pessoas da mesma idade, as com a doença pulmonar tiveram envelhecimento das células T acelerado. “O fenótipo dos linfócitos desses indivíduos parece mais velho se comparado aos que não têm o processo inflamatório crônico”, diz Juliana.

    Já no grupo de fumantes, os resultados sugerem que o tabagismo crônico moderado a intenso não acelerou o ritmo da imunossenescência em comparação com os idosos saudáveis. “A DPOC acabou interferindo mais nos pacientes do que a idade, afetando drasticamente o sistema imune”, completa a doutoranda Thalyta Nery Carvalho Pinto, também autora do artigo.

    Em sua tese de mestrado, em 2016, Juliana havia mostrado o efeito do exercício físico na resposta imune de pacientes com DPOC, concluindo que o programa de reabilitação foi capaz de desacelerar alguns parâmetros da senescência celular, melhorando a resposta imunológica de linfócitos.

    À época, os resultados já sugeriam que indivíduos com a doença apresentavam maior proporção de células com perfil de exaustão e menor capacidade funcional. “Agora tentamos entender os tipos celulares envolvidos na DPOC e nos idosos”, diz a pesquisadora.

    Sobre a imunossenescência

    A imunossenescência é marcada pela diminuição do total de células T jovens (chamadas pelos cientistas de naive) e pelo aumento dos linfócitos de memória, que têm três dinâmicas de fase durante a vida humana.

    A primeira é caracterizada por um conjunto de células jovens, que ao longo do tempo se tornam células de memória em resposta à estimulação com antígenos (moléculas desconhecidas do organismo) específicos. A segunda fase (chamada de homeostase de memória) é caracterizada pela circulação de células T de memória, que atingem um platô e são mantidas durante a vida adulta.

    Na terceira etapa, após um longo período de estabilidade, a frequência e a funcionalidade das células T de memória mudam, aumentando a suscetibilidade a infecções causadas por desregulação imunológica como parte do declínio fisiológico.

    No trabalho, os pesquisadores detectaram uma “desordem” nesse ciclo do sistema imune em pacientes com DPOC. Eles apresentaram não apenas um conjunto reduzido de células naive disponíveis para respostas imunes, mas também frações aumentadas dessas células com características de diferenciação, senescência ou exaustão quando comparados aos idosos saudáveis e aos fumantes.

    “Vimos também que a imunossenescência e as alterações registradas em indivíduos com DPOC são mais acentuadas nos linfócitos T CD8+, que atuam como uma espécie de ‘soldado’ responsável por executar a resposta imune no organismo humano”, afirma Benard.

    Agora, com uma amostra de indivíduos diferente da anterior, o grupo de cientistas está estudando como é a resposta dos linfócitos do tipo B em pacientes com DPOC. Também busca avaliar como essas pessoas estão respondendo à vacina contra a Covid-19.