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    Dez pesquisadores brasileiros contam o que estão estudando sobre o coronavírus

    Cientistas driblam falta de incentivos e verbas para tentar achar remédios e maneiras de combater a pandemia

    Luana Massuella e Julia Carvalho , Da CNN, em São Paulo

    Pesquisadores brasileiros estão somando esforços para encontrar caminhos para combater o coronavírus. Nesta semana, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão do Ministério da Educação, lançou um programa estratégico emergencial de prevenção e combate a surtos, endemias, epidemias e pandemia. O objetivo do programa é apoiar pesquisas voltadas ao enfrentamento à nova pandemia da COVID-19.

    Mesmo com a iniciativa, um corte de bolsas instituído por portaria no dia 9 já afeta grupos de pesquisa que buscam justamente respostas à pandemia de COVID-19, e traz novamente a discussão sobre as dificuldades da área no país. “O principal problema de ser cientista no Brasil é a falta de incentivo, e a dificuldade vem principalmente pelas políticas não serem contínuas no Brasil, e ciência depende muito de apoio a longo prazo”, diz Ester Sabino, que ficou conhecida por sequenciar o genoma do coronavírus em apenas 48 horas. “Quando deixam de existir bolsas, você vê um impacto enorme, e você percebe isso muitos anos depois”, completa. 

    Confira o depoimento de 10 pesquisadores brasileiros que estão estudando o coronavírus.

    Marcelo Urbano Ferreira, do Instituto de Ciências Biomédicas da USP

    Um estudo do Instituto de Ciências Biomédicas da USP está focando no desafio da baixa e média renda para lidar com o COVID-19. O estudo investiga a epidemiologia e o controle da infecção por SARS-CoV-2 em uma pequena cidade amazônica. “Nosso objetivo é traduzir as informações geradas pelo estudo de campo em evidências para orientar o controle de COVID-19 em uma das regiões mais pobres do Brasil”, diz Marcelo Urbano Ferreira, pesquisador do estudo do Instituto de Ciências Biomédicas da USP. 

    Segundo a pesquisa, o estudo partiu da hipótese de que muitas infecções por SARS-CoV-2 permanecem despercebidas e os portadores assintomáticos de infecção podem continuar disseminando o vírus em suas interações sociais cotidianas até sua eliminação espontânea, tornando-se imunes à reinfecção ou, pelo menos, à doença grave. 

    Os pesquisadores estão testando essa hipótese, tentando estimar o tamanho do surto de SARS-CoV-2 e identificar fatores de risco associados à soroconversão na comunidade. Estão fazendo isso identificando as interações sociais e os espaços compartilhados, como o domicílio, o local de trabalho, as escolas e as igrejas, que possam ter contribuído para a transmissão local de SARS-Cov-2. O estudo é financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

    Ester Sabino, diretora do Instituto de Medicina Tropical da USP

    Pesquisadores do Instituto Adolfo Lutz e das universidades de São Paulo (USP) e de Oxford, no Reino Unido, publicaram a sequência completa do genoma viral, que recebeu o nome de SARS-CoV-2. “Ao sequenciar o genoma do vírus, ficamos mais perto de saber a origem da epidemia, e de entender como o vírus está se dispersando pelo mundo”, diz Ester Sabino, diretora do Instituto de Medicina Tropical da USP.

    A sequência completa do genoma viral foi feita em apenas 48 horas após o primeiro caso confirmado de coronavírus na América Latina. E, segundo Ester Sabino, a informação é extremamente importante para o desenvolvimento de vacinas e testes diagnósticos.

    Daniela Barretto Barbosa Trivella, coordenadora científica do LNBio 

    No Laboratório Nacional de Biociências do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (LNBio-CNPEM) pesquisadores estudam o reposicionamento de fármacos, que consiste basicamente em encontrar um medicamento já conhecido e utilizado para uma outra doença, e que pode ser aplicado aos pacientes portadores de COVID-19. A pesquisa conta com o apoio da Rede Vírus do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC).

    “Essa é a melhor estratégia numa pandemia, porque já usamos anos de conhecimento que temos sobre um determinado medicamento para outra doença, uma vez que a gente prove a eficácia”, diz Daniela Barretto Barbosa Trivella, coordenadora científica do LNBio e uma das pesquisadoras envolvidas no estudo.

    O estudo atualmente está focando em dois potenciais medicamentos contra o coronavírus, e agora os pesquisadores irão avançar para uma nova etapa, de testes in vitro e posteriormente testes clínicos em pacientes. Essa força tarefa conta com mais de 40 cientistas no CNPEM. E esses cientistas são de diferentes especialidades. 

    Helder Nakaya, professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF-USP) 

    Um estudo feito na Universidade de São Paulo mostrou que pacientes com doenças crônicas têm expressão aumentada de gene que facilita infecção pelo coronavírus. “Começamos o estudo porque queríamos entender porque pessoas que têm comorbidades como hipertensão e diabetes, por exemplo, têm mais chances de desenvolver a COVID-19 severa”, comenta Helder Nakaya, professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP e coordenador da pesquisa.

    O estudo mostrou que alterações no metabolismo causadas por doenças crônicas levam a um aumento na expressão do gene ACE-2, que é responsável por codificar uma proteína à qual o vírus se conecta para infectar as células pulmonares.

    Anamelia Bocca, pesquisadora do Instituto de Ciências Biológicas da UnB

    A área de imunologia do Instituto de Ciências Biológicas da UnB está trabalhando em um estudo que pretende investigar a memória imunológica dos pacientes depois que contraem o coronavírus. Ainda não se sabe se o vírus é capaz de desenvolver essa memória imunológica permanente nos pacientes, isso é, se uma vez infectados eles não vão mais contrair a doença – e a pesquisa vai atuar nesse sentido.

    Aprovado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Distrito Federal, o projeto é fundamental para uma futura produção de vacinas contra o vírus. Além disso, por meio dessa pesquisa será possível entender se a Covid-19 é capaz de produzir mutações e, como o vírus da gripe, reinfectar a população a cada ano. Segundo a pesquisadora Anamelia Boca, que trabalha no estudo, a memória imunológica é fundamental para desenvolver estratégias de saúde pública.

    André Sposito, coordenador do Centro de Pesquisa Clínica da Unicamp

    O Centro de Pesquisa Clínica da Unicamp está desenvolvendo um estudo que tem como objetivo reduzir um tipo de morte celular chamada piroptose, comumente encontrado em indivíduos que são infectados pela Covid-19. “A ideia é investigar se há a redução das sequelas relacionadas à infecção do covid-19 quando esse procedimento é adotado”, diz André Sposito, professor e coordenador do Centro de Pesquisa. Financiada por órgãos públicos, a hipótese da pesquisa partiu de outro trabalho, realizado há três anos, que investigava o mesmo tipo de morte celular, só que em animais.

    O estudo envolverá 300 pacientes e vai investigar o efeito da inibição da piroptose nessas pessoas infectadas pelo coronavírus. A pesquisa tem capacidade de chegar a resultados em um período de seis meses a um ano e meio e poderá ajudar na diminuição dessas consequências a longo prazo.

    Henrique Marques Barbosa de Souza, pesquisador da força-tarefa Unicamp

    Também na Unicamp, um grupo de pesquisadores se uniu em uma força-tarefa e reuniu equipamentos, insumos e voluntários para a realização de testes do novo coronavírus em Campinas. Eles estudam novos métodos de detecção, e também a ação do vírus no organismo e fármacos que possam atuar contra a COVID-19.

    A força-tarefa da Unicamp envolve todo o tipo de investimento: do governo do Estado de São Paulo por meio da Fapesp, o Governo Federal por meio do CNPq, Capes, Finep, dentre outros; convênios de pesquisa com o setor privado, doações e a própria Unicamp, pelo seu fundo de apoio à pesquisa Faepex. “Todo esse investimento é tão importante quanto o que está sendo feito hoje na ciência, já que as descobertas de hoje são resultado do que foi investido no passado”, diz Henrique Barbosa, um dos pesquisadores da força-tarefa.

    Bergmann Ribeiro, pesquisador do Instituto de Ciências Biológicas da UnB

    Também no Instituto de Ciências Biológicas da UnB está sendo desenvolvido outro estudo relacionado à COVID-19. Bergmann Ribeiro, professor e pesquisador da universidade, explica que a pesquisa pretende sequenciar o genoma do coronavírus. A partir desse sequenciamento, será possível descobrir a origem geográfica do vírus e qual o comportamento dele ao longo do tempo.

    Além disso, o grupo realiza a expressão de proteínas para a produção de kits diagnósticos do coronavírus. Esses kits serão capazes de detectar anticorpos no sangue dos pacientes infectados e serão feitos em parcerias com outras instituições. O projeto está sendo mantido com verbas realocadas de outros estudos em andamento.

    Silvia Costa, pesquisadora do Laboratório de Bacteriologia do Instituto de Medicina Tropical da Faculdade de Medicina da USP

    O Laboratório de Bacteriologia do Instituto de Medicina Tropical da Faculdade de Medicina da USP está estudando técnicas laboratoriais para desinfectar e reutilizar o material de uso dos pesquisadores, como máscaras de proteção facial, N-95 e máscaras cirúrgicas.

    Eles estão trabalhando com validação de EPIs e também validação da sorologia e a importância da higienização dos celulares. “Diante da escassez de equipamentos de proteção no mundo, estamos validando o reuso de alguns equipamentos, como as máscaras”, comenta uma das pesquisadoras do estudo, Silvia Costa. Foi criado um método para validar o reuso de máscaras de proteção facial.

    Darlan Candido, pesquisador e estudante de doutorado da Universidade de Oxford

    Um estudo apoiado pela Fapesp no âmbito do Centro Conjunto Brasil-Reino Unido para Descoberta, Diagnóstico, Genômica e Epidemiologia de Arbovírus (CADDE), concluiu que 54,8% dos casos importados de COVID-19 para o Brasil até 5 de março vieram da Itália. 

    O estudo estimou que no Brasil mais de 300 pessoas começaram a epidemia, e a Itália foi a principal origem dos primeiros viajantes infectados pelo novo coronavírus, que chegaram ao país entre fevereiro e o início de março. A constatação foi feita por pesquisadores brasileiros, em colaboração com colegas do Reino Unido, Canadá e Estados Unidos. “Nós estamos agora sequenciando mais genomas de coronavírus do Brasil inteiro, para entender essa dispersão e essa evolução da epidemia no nosso país”, comenta Darlan Candido, primeiro autor do estudo. 

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