Anvisa rebate fabricante da Sputnik V e reafirma riscos em vacina contra Covid
Agência brasileira exibiu trecho de reunião e documento em que representantes do Instituto Gamaleya reconhecem risco de adenovírus replicantes
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) respondeu nesta quinta-feira (29) às críticas que vem recebendo por parte dos representantes da vacina Sputnik V, desenvolvida na Rússia pelo Instituto Gamaleya. Na segunda-feira (26), a diretoria colegiada da Anvisa rejeitou, por unanimidade, um pedido de importação do imunizante.
Em resposta, representantes do imunizante acusaram a Anvisa de agir sob pressão política dos Estados Unidos, e que por isso impediu a importação da vacina.
Em exposição à imprensa, a Anvisa reafirmou os riscos de segurança que basearam a decisão e exibiu documentos e trechos de reuniões gravadas em que técnicos do Gamaleya admitem a possibilidade de presença de adenovírus replicantes na Sputnik V.
De acordo com os técnicos da agência, os adenovírus replicantes podem provocar doenças e atingir tecidos e órgãos do corpo humano. A Anvisa argumenta que a presença desse componente é 300 vezes maior do que o orientado pelo FDA, seu equivalente nos Estados Unidos.
A agência ainda afirmou que remeteu os resultados de sua avaliação técnica a outras autoridades regulatórias estrangeiras e também à Organização Mundial da Saúde (OMS).
“A Anvisa foi acusada de mentir, de atuar de maneira antiética e de produzir fake news sobre a identificação do adenovírus replicante em documentos que tratam da vacina Sputnik V, objeto da decisão que não autorizou a importação excepcional da vacina para o uso na nossa população”, afirmou o diretor-presidente da Anvisa, Antônio Barra Torres.
Além dos dados , os diretores exibiram trechos da reunião entre os técnicos da Anvisa e representantes da Sputnik V.
No trecho exibido, os técnicos da Anvisa questionaram os desenvolvedores sobre o porquê do processo não ter sido refeito de forma que os adenovírus fossem impedidos de se replicarem.
Os desenvolvedores responderam à questão em russo, e a tradutora explicou que o Gamaleya usou uma “linha de células caracterizada, o que pode ser seus defeitos”. A tradutora disse ainda que os técnicos brasileiros “têm razão” ao afirmar que o processo poderia ter sido refeito com o uso de uma nova substância capaz de impedir a replicação dos adenovírus, mas que esse processo poderia “ter ocupado muito tempo, assim, nós optamos pela mesma substância que usamos no início”.
O gerente-geral de medicamentos da Anvisa, Gustavo Mendes, disse que, após a reunião, os russos enviaram à Anvisa novos documentos, mas que as justificavas apresentadas não contemplaram as questões consideradas críticas pelos brasileiros.
“O que norteia a análise técnica é que as vacinas precisam ser seguras. Uma vacina tem que proteger, uma vacina não pode causar nenhum dano. E essa avaliação é feita com base em critérios técnicos que mostram que não há presença, por exemplo, de um adenovírus replicando numa vacina que diz que é de adenovírus não replicante”, explicou Mendes.
Réplica e tréplica
O perfil oficial da Sputnik V no Twitter se manifestou, em português, depois da coletiva da Anvisa. Os fabricantes destacaram que “a Anvisa confirmou que não encontrou nenhum adenovírus replicante” no imunizante e que tão somente estava “preocupada com o limite regulatório teórico russo para esse parâmetro”.
O Instituto Gamaleya afirmou que os controles de qualidade “garantem” que não há adenovírus replicantes na Sputnik V. “Que bom que a Anvisa está começando a esclarecer a confusão que criou”, escreveu o perfil da vacina.
Em resposta, o diretor-presidente da Anvisa, Antônio Barra Torres, disse que a presença do adenovírus replicante foi constatada a partir da documentação apresentada à agência sanitária.
“No entendimento deles, é apropriado que seja ‘menos que’, mas que isso não é apropriado para a comunidade científica. O limite é zero”, disse Torres.
Negativa da Anvisa
Na segunda-feira (26), a Anvisa negou o pedido de importação da Sputnik V. A decisão da Anvisa foi rejeitada por todos os cinco diretores integrantes do colegiado.
De acordo com o gerente-geral de medicamentos e Produtos Biológicos da Anvisa, Gustavo Mendes, a vacina pode oferecer risco à segurança em razão dos chamados “adenovírus replicantes” encontrados em todos os lotes da vacina vistoriados pela agência sanitária brasileira.
“Isso significa que o vírus que deve ser utilizado apenas para carrear material genético do coronavírus para as células humanas e assim promover a resposta imune, ele mesmo se replica. Esse procedimento está em desacordo com o desenvolvimento de qualquer vacina de vetor viral”, explicou Mendes.
Pouco antes da decisão da Anvisa, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) havia aprovado a liberação comercial do imunizante. A medida foi tomada pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), ligada à pasta.
Resposta à Anvisa
Diante da decisão da Anvisa, o presidente do Fundo Russo de Investimento Direto (RDIF, na sigla em inglês), Kirill Dmitriev, demonstrou surpresa afirmou em coletiva de imprensa que a agência brasileira agiu sob uma suposta pressão política dos Estados Unidos.
Em resposta ao RDIF, Gustavo Mendes disse que “o corpo técnico da Anvisa não está embasado em questões políticas, internacionais ou outras que não sejam a ciência”.
Segundo Mendes, o principal motivo da Anvisa em não aprovar a vacina foi a falta de documentação consistente e confiável sobre o medicamento. “A pandemia exige critérios que sejam diferenciados, que considerem o risco-beneficio e a urgência da questão”, completou Mendes.
Nesta quinta-feira (29), representantes da Sputnik V ameaçaram mover um processo judicial contra Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) por difamação”
“Após a admissão do regulador brasileiro Anvisa de que não testou a vacina Sputnik V, a Sputnik V está iniciando um processo judicial de difamação no Brasil contra a Anvisa por espalhar informações falsas e imprecisas intencionalmente”, anunciou a conta oficial da vacina no Twitter.