TSE retoma julgamento com 2 votos a 1 para condenar Bolsonaro
Corte julga conduta no Bicentenário da Independência; um dos ministros também propôs deixar Braga Netto inelegível
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) vai retomar nesta terça-feira (31), às 19h, o julgamento de três ações contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e seu então candidato a vice, Walter Braga Netto (PL), pelas condutas durante as cerimônias do Bicentenário da Independência, em 7 de setembro de 2022.
Até o momento, a Corte tem dois votos a favor de condenar Bolsonaro à inelegibilidade por oito anos com imposição de multa de R$ 425 mil, e um voto para absolver o ex-presidente.
Um dos votos também defendeu tornar Braga Netto inelegível.
O julgamento será retomado com os votos dos seguintes ministros, nesta ordem: André Ramos Tavares, Cármen Lúcia, Nunes Marques e Alexandre de Moraes.
Bolsonaro e Braga Netto são acusados em três ações de suposta prática de abuso de poder político e econômico, uso indevido dos meios de comunicação e conduta vedada pela lei. Os processos foram movidos pelo PDT e pela então candidata à presidência Soraya Thronicke (Podemos).
Estão no alvo das ações os supostos benefícios às suas candidaturas com a participação em eventos no dia da Independência.
As solenidades foram feitas em Brasília e no Rio de Janeiro, custeados com dinheiro público e transmitidas pela “TV Brasil”. Eventos paralelos de campanha foram feitos próximos dos palanques oficiais, e tiveram a participação de Bolsonaro e Braga Netto.
Bolsonaro já está inelegível até 2030 por uma condenação anterior do TSE envolvendo a reunião feita pelo então presidente com embaixadores em que ele atacou o sistema eleitoral.
Uma eventual nova punição não aumenta o prazo que ele ficará de fora das eleições, mas será mais um revés que sua defesa terá que recorrer para tentar habilitar sua candidatura.
Placar
O relator dos casos, ministro Benedito Gonçalves, votou para condenar Bolsonaro à inelegibilidade, mas rejeitou essa punição a Braga Netto. Ele entendeu que não houve gravidade suficiente na conduta do então candidato a vice-presidente para justificar essa punição.
Benedito votou ainda para condenar ambos ao pagamento de multa: R$ 425.640 a Bolsonaro e R$ 212.820 a Braga Netto.
O ministro Floriano de Azevedo seguiu o relator nestes pontos, mas foi além e defendeu também a condenação de Braga Netto à inelegibilidade. Caso se confirme essa posição, o político ficará impedido de disputar eleições até 2030.
Esses dois ministros entenderam que houve ação deliberado para confundir os atos oficiais do 7 de Setembro com os atos eleitorais de campanha, com associação do simbolismo da data em proveito das candidaturas.
Já o ministro Raul Araujo divergiu, e defendeu a rejeição das ações por não ver irregularidade no caso.
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Voto do relator
Para Benedito Gonçalves, ficou comprovado abuso de poder político e econômico e prática de conduta vedada pela lei eleitoral na atuação de Bolsonaro.
“Comprovou-se indevida mescla entre atos oficiais e eleitorais, em Brasília e no Rio de Janeiro”, disse o ministro. “Para que o comício, na prática, se tornasse um movimento contínuo em relação ao ato oficial.”
Conforme o relator, houve “apropriação de bens simbólicos” no caso, o que envolve “desde uso eleitoral de imagens em propaganda eleitoral até o incalculável dano decorrente da captura da data cívica como fator de acirramento da polarização eleitoral”.
Para Benedito Gonçalves, ficou comprovada a associação das comemorações dos 200 anos da Independência com a campanha de Bolsonaro e Braga Netto. Isso foi feito em reuniões partidárias e propagandas eleitorais na televisão, em que apoiadores foram chamados a participar do evento.
“O que se viu nas manifestações feitas, na propaganda eleitoral de 6 de setembro, foi a inequívoca difusão de mensagem associando a comemoração do bicentenário e todo seu simbolismo a campanha dos investigados”, afirmou.
Ele disse que a atuação da chapa se deu de forma a “induzir a confusão” entre atos oficiais e atos eleitorais. “Esse direcionamento se fez explorando mote de campanha situando a festividade na narrativa mais ampla de luta pela liberdade e triunfo de um patriotismo militarizado”.
Conforme o relator, a responsabilidade de Braga Netto pelo caso é menor, por isso ele não propôs sua condenação à inelegibilidade. O ministro entendeu que o então candidato a vice tinha o dever de verificar a regularidade das propagandas veiculadas pela campanha.
“O segundo investigado [Braga Netto] também era responsável pela regularidade do material de propaganda exibida nas inserções eleitorais, não sendo possível considerar que tudo se passasses sem sua plena conivência com associação da chapa e a comemorarão do bicentenário”.
O ministro também afirmou que a mudança do local do desfile cívico-militar no Rio de Janeiro foi determinada para atender uma convocação prévia de Bolsonaro a seus apoiadores.
O evento tradicionalmente era feito na avenida Presidente Vargas, no centro da cidade, mas foi transferido para a orla de Copacabana. No local, havia uma manifestação convocada pró-Bolsonaro.
“A mudança era repleta de significado. Farta documentação demonstra a adoção de muitas providências por órgãos públicos par atender determinação de última hora.”
“A tradição do local do desfile, que se firmou em razão da proximidade coma sede do Comando Militar, foi solapada por determinação casuística destinada a atender convocação do primeiro investigado”, disse Benedito.
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Outros votos
O ministro Floriano entendeu que Braga Netto, enquanto candidato a vice e um dos coordenadores da campanha, também tinha responsabilidade. Para o magistrado, a sua omissão contribuiu para os abusos e, por isso, ele também deve ser condenado à inelegibilidade.
“Inegável sua contribuição para a consumação da grave prática de abuso de poder político”, disse Floriano. “Mesmo que coadjuvando, o Segundo Investigado [Braga Netto] também contribuiu, concorreu e colaborou, comissiva ou omissivamente, para a prática do ato”.
Para o ministro, “há inconteste participação, anuência e contribuição” de Braga Netto na “consumação dos atos abusivos”, o que “faz incidir as sanções legais”. Por isso, ele votou para condenar o então candidato a vice e Bolsonaro à inelegibilidade.
Já o ministro Raul Araújo entendeu não ter havido irregularidades nas condutas. Para ele, os atos oficiais e de campanha são eventos “claramente distintos”.
“O posterior ato de campanha político-eleitoral em local público próximo ao da realização do evento oficial concluído, pode ser realizado por qualquer candidato, não apenas por candidato à reeleição”, disse. “Se alguma vantagem existir para o candidato à reeleição é mínima, insusceptível de desequilibrar a disputa, inerente ao próprio instituto da reeleição, admitido na maioria das democracias dos países”.
Araújo também afirmou que “em nenhum momento” a lei proíbe a realização de ato de campanha “logo após evento oficial ou em local público próximo ao do evento oficial concluído”.
Defesa
O julgamento começou na terça-feira (24), quando se manifestaram os advogados de defesa e de acusação, e o Ministério Púbico Eleitoral (MPE).
A defesa de Bolsonaro e Braga Netto disse, na ocasião, que não existiu “qualquer aproveitamento intencional ou não da estrutura do 7 de Setembro para fins eleitorais”.
O advogado Tarcísio Vieira de Carvalho afirmou que, na ocasião, houve “uma cisão factual entre momentos diversos”, em que em um momento Bolsonaro era presidente e, em outro, era candidato.
“Atos não se confundem. Ocorreram, é fato notório, os desfiles esperados para comemoração dessa data revestida de simbolismo. E é evidente que houve para esse evento o fornecimento de estrutura de arquibancadas, banheiros públicos”, declarou, dizendo que os gastos com a solenidade oficial não têm irregularidades.
Ele também descartou ter havido “ingerência” de Bolsonaro na mudança do local dos desfiles no Rio de Janeiro, que coincidiu com o lugar onde havia um ato de campanha a seu favor.
Tarcísio também destacou que a campanha adotou uma “medida saneadora ampla e imediata” para apagar das redes sociais as imagens relativas aos eventos de 7 de Setembro.
“Essa opção pela remoção, mesmo das não relativas à fase pública, impediu que qualquer efeito nefasto irradiasse pela propaganda eleitoral, contaminando a cena política. Ela impediu que a força política expressa nesses supostos atos políticos do dia 7 de Setembro fosse contaminada aos demais eleitores”, declarou.