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    TSE não inovou ao deixar Bolsonaro inelegível, avaliam especialistas

    Corte eleitoral condenou ex-presidente, que ficará fora das eleições até 2030

    Lucas Mendesda CNN , em Brasília

    O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) condenou na sexta-feira (30) o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e decretou sua inelegibilidade pelos próximos oito anos. O placar ficou 5 a 2.

    A maioria dos ministros entendeu que Bolsonaro cometeu abuso de poder político e usou indevidamente os meios de comunicação, ao fazer uma reunião com embaixadores no Palácio da Alvorada, em julho de 2022, e atacar sem provas o sistema eleitoral. O encontro foi transmitido pela TV Brasil e por perfis nas redes sociais do então presidente.

    Na visão de especialistas em direito eleitoral ouvidos pela CNN, a posição que o TSE tomou no caso não é inédita e segue precedentes da Corte. Além disso, dado o peso político do ex-presidente, servirá para confirmar as balizas de quais condutas são permitidas e quais são consideradas ilícitas em campanhas eleitorais.

    Para o advogado Paulo Ferraz, membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), que integrou também a Comissão de Direito Eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Paraná, o TSE “não inovou em nada” ao condenar Bolsonaro.

    “O TSE não saiu do direcionamento que sempre vinha tendo há muito tempo sobre fake news e desinformação”, declarou.

    Esse fator, inclusive, foi citado pelo presidente da Corte, o ministro Alexandre de Moraes, quando apresentou seu voto no julgamento.

    “O TSE está reiterando seu posicionamento consubstanciado em julgamento de inúmeras Aijes [Ações de Investigação Judicial Eleitoral]”, disse o magistrado. “Nenhum pré-candidato, nenhum candidato, especialmente o investigado, Jair Messias Bolsonaro, poderia alegar desconhecimento sobre o posicionamento dessa Corte eleitoral das principais premissas que deveriam ser observadas para as eleições de 2022.”

    Conforme Paulo Ferraz, Bolsonaro sugeriu sem provas que haveria alguma fraude nas urnas na reunião com embaixadores, o que entra no radar da Justiça Eleitoral como desinformação e ataque à confiabilidade do sistema de votação.

    O abuso de poder político ficou configurado pelo fato de Bolsonaro ter convidado os representantes estrangeiros para a reunião. “Não estamos diante de uma livre manifestação do pensamento. A questão é o chefe de Estado, nome maior do país, convocar a reunião. Essa convocação já pressupõe que só o chefe de Estado pode fazer”, disse o especialista.

    Já o uso indevido dos meios de comunicação ficou comprovada pela disseminação do conteúdo da reunião, transmitida ao vivo pela televisão pública e nos perfis de Bolsonaro nas redes sociais.

    “Foi usado não só canais de internet, que o TSE já há muito tempo tem entendimento de que internet é meio de comunicação, e pode gerar abuso. Mas também se passou em canais de concessão pública, na TV Brasil”, declarou.

    “Desde 2018, as eleições vêm tendo um número expressivo de fake news e desinformação. Vem de uma onda americana, que se acirrou aqui em 2018”, disse Ferraz. “O TSE acertadamente vem combatendo, e deixou claro que desinformação sobre urnas tem poder sim de cassar o mandato ou deixar inelegível”.

    O advogado Eduardo Rêgo, mestre e doutor em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), vai no mesmo sentido.

    Para ele, o voto apresentado pelo relator, ministro Benedito Gonçalves, e acompanhado pela maioria do TSE, segue a jurisprudência consolidada da Corte “sem trazer nenhuma inovação que represente, por assim dizer, uma mudança de entendimento”.

    “Desde o ano de 2021 já está assentado que o uso de redes sociais para disseminar fake news sobre as urnas eletrônicas pode conduzir à cassação de mandato. Assim ocorreu com o ex-deputado Fernando Francischini”, afirmou.

    O caso de Francischini foi simbólico por se tratar da primeira cassação de um político por esse motivo. O TSE cassou o político em 2021. Ele disputava uma vaga na Assembleia Legislativa do Paraná, e fez uma live lançando dúvidas sobre as urnas no final do dia das eleições de 2018.

    Para Eduardo Rêgo, o precedente firmado com o caso de Francischini foi importante no combate às fake news em contexto eleitoral, mas a inelegibilidade de Bolsonaro traz mais peso.

    “Não há dúvidas de que a condenação de Bolsonaro é muito mais eloquente no combate à desinformação sobre a confiabilidade das urnas eletrônicas”, afirmou.

    Berlinque Cantelmo, advogado criminalista e sócio do Cantelmo Advogados Associados, disse à CNN que, além dos precedentes da Justiça Eleitoral, o relator também colocou em seu voto um contexto grande de referências, com casos de desinformação tratados pelo Judiciário norte-americano, além de outros julgadores brasileiros.

    “Tudo isso foi realizado sob menção a verdadeira conexão entre o caso de Bolsonaro e a pertinência de aplicação do julgado ao qual se referia no voto”, afirmou.

    O advogado também entende que a condenação de Bolsonaro terá algum papel para fixar parâmetros a outros candidatos.

    “Evidente que a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro servirá de baliza comportamental para outros candidatos que, ao argumento de liberdade de expressão ou utilização deliberada do poder, utilizam-se de fake news ou ferramentas de desinformação como forma de tangenciar verdades ou ludibriar a sociedade, além de reforçar sobremaneira a legitimidade do processo eleitoral brasileiro e a confiabilidade das urnas”, disse.

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