STF define regras para indenização a proprietários, após derrubar marco temporal
Indenização pode envolver o valor da terra em si, além das benfeitorias feitas no local; Corte terminou julgamento nesta quarta (27), depois de 12 sessões
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, nesta quarta-feira (27), por unanimidade, que pode haver indenização a proprietários que tenham ocupado, de boa-fé, terras que venham a ser demarcadas como indígenas.
Essa indenização pode envolver o valor da terra em si, além das benfeitorias feitas no local.
Conforme a tese de julgamento definida pelos ministros, os proprietários poderão reter consigo a propriedade até que haja o depósito do valor referente à indenização.
Esses pontos foram definidos depois que a Corte derrubou, por 9 a 2, a validade do marco temporal para demarcação das terras indígenas.
As definições dizem respeito às regras que devem ser obedecidas no processo de demarcação de territórios aos povos originários. Essa foi a 12ª sessão da Corte a tratar do tema.
Com essa tese de julgamento, o Supremo define balizas que deverão ser seguidas em todas as instâncias da Justiça.
A decisão provocou a reação do Legislativo. Nesta quarta-feira (27), o Senado aprovou o texto-base do projeto de lei que estabelece um marco temporal para a demarcação de terras indígenas, contrariando a posição do STF. Os senadores ainda precisam analisar os destaques da proposta para a votação ser concluída.
Tese
A tese de julgamento foi construída a partir de uma proposta do ministro Dias Toffoli, com contribuições dos demais magistrados para se chegar a um consenso.
Entre outros pontos, a tese estabelece:
- Demarcação de terras indígenas não depende de marco temporal em 5 de outubro de 1988;
- Se houver ocupação indígena ou disputa pela terra em 5 de outubro de 1988, cabe ao proprietário ser indenizado pelas benfeitorias feitas no local, o que a lei já prevê hoje;
- Se não houver ocupação indígena ou disputa pela terra na data da Constituição, e caso o proprietário tenha ocupado de boa-fé o local que venha a ser demarcado como indígena, ele terá direito a prévia indenização pelas benfeitorias;
- Se for inviável reassentar esse proprietário, ele terá direito a indenização pelo valor da terra em si;
- A indenização pela terra em si poderá ser paga pela União, que poderá demandar os valores de estados ou municípios que tenham destinado a área, e será discutida em um procedimento à parte do processo de demarcação. O pagamento deve ser imediato e o proprietário pode reter a terra até que a quitação seja efetivada pelo poder público do valor incontroverso (ou seja, que não haja discussão entre proprietário e poder público);
- Não cabe indenização para casos já pacificados, como em terras indígenas devidamente demarcadas até aqui;
- É possível haver redimensionamento de terra indígena até cinco anos após a demarcação, desde que sejam comprovados erros graves ou insanável na definição dos limites do território.
O que é o marco temporal
O marco temporal é uma tese defendida por ruralistas estabelecendo que a demarcação de uma terra indígena só pode ocorrer se for comprovado que os indígenas estavam sobre o espaço requerido em 5 de outubro de 1988 – quando a Constituição atual foi promulgada.
A exceção é quando houver um conflito efetivo sobre a posse da terra em discussão, com circunstâncias de fato ou “controvérsia possessória judicializada”, no passado e que persistisse até 5 de outubro de 1988.
Derrubada
A maioria dos ministros do STF entendeu que é inconstitucional limitar a demarcação de terras indígenas à data da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988. Essa definição foi feita na última quinta-feira (21).
No Supremo, votaram contra o marco temporal:
- Edson Fachin (relator);
- Alexandre de Moraes;
- Cristiano Zanin;
- Dias Toffoli;
- Luiz Fux;
- Cármen Lúcia;
- Roberto Barroso;
- Rosa Weber;
- Gilmar Mendes.
Votaram a favor:
- André Mendonça;
- Nunes Marques.
O que foi decidido, incluindo a tese de julgamento, vale para todos os casos de demarcação de terras indígenas que estejam sendo discutidos na Justiça.
O Congresso passou a discutir o tema, com o objetivo de colocar o marco temporal na lei. Nada impede que os congressistas continuem com a deliberação. Em caso de aprovação, ainda é preciso que a proposta passe por sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Em um hipotético cenário de aprovação e sanção, o Supremo poderia ser acionado para derrubar a lei ou parte dela, dado que a Corte já considerou inconstitucional a tese do marco temporal.