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    O ‘azarão’ que virou vice na chapa de Covas em SP, saiba quem é Ricardo Nunes

    Vereador do MDB será apresentado pela campanha do prefeito como um 'comerciante raiz', que 'veio de baixo' e venceu na vida

    O vereador Ricardo Nunes (MDB) foi escolhido como vice de Bruno Covas em São Paulo
    O vereador Ricardo Nunes (MDB) foi escolhido como vice de Bruno Covas em São Paulo Foto: Facebook/Reprodução

    Pedro Duran, da CNN, em São Paulo

    Passava das quatro da tarde do último dia 11 de setembro, quinta-feira, quando o emedebista Ricardo Nunes receberia uma ligação que o obrigaria a mudar radicalmente os planos de vida para os próximos meses. Do outro lado da linha, o prefeito Bruno Covas, que ligara para dar o aviso de que ele seria o vice na chapa do tucano nas eleições de 2020.

    A surpresa obrigaria o vereador a adaptar toda estrutura que estava montada para a campanha à reeleição para que seja absorvida pelo QG da campanha de Covas, que além do PSDB e do MDB, ainda terá pelo menos oito partidos na coligação.

    O trunfo de Nunes foi resultado de uma estratégia política bem-sucedida do partido. O MDB abriu mão da Secretaria de Habitação para ficar com o posto de vice na chapa. O pasta foi aceita por outro partido da coligação, o Progressistas, que por sua vez desistiu de pleitear a divisão de chapa.

    Mas para que isso acontecesse, outro partido da coligação, o Democratas, já tinha desistido do posto. É que o partido preferiu ficar com a influência em áreas-chave da administração municipal, como os transportes, e também está nos planos dos tucanos para 2022, quando o vice governador, Rodrigo Garcia, que é do Democratas, já teria o sinal verde do PSDB pra suceder João Doria.

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    Mas antes de entregar o posto a Nunes, a equipe de Bruno Covas havia mirado um outro emedebista: o apresentador José Luiz Datena, que foi tido por muitos apoiadores do tucano como o ‘vice dos sonhos’, pelo peso eleitoral que poderia ter, visto que chegou a liderar as pesquisas de intenção de voto quando ameaçou uma candidatura ao Senado.

    Mas Datena deu sinais ao próprio partido de que não estaria no pleito, como já tinha feito na campanha natimorta ao Senado, e em uma das reuniões dos vários representantes dos partidos da mega-coligação de Covas, o presidente do MDB, Baleia Rossi, sugeriu: “Sem o Datena, nosso nome é do Ricardo Nunes”.

    Presidente municipal do MDB, o próprio Nunes se espantou com a notícia. Nem mesmo setores do próprio partido tinham convicção de que o melhor caminho seria apoiar o PSDB de Covas, de modo que a ideia de compor a chapa indicando o vice ainda era muito distante.

    Contribuíram para a escolha de Nunes as pesquisas internas feitas ainda na pré-campanha de Covas. Por mais que no período de pré-pandemia os próprios apoiadores do tucano mirassem um nome forte à direita como o de Joyce Hasselmann ou Celso Russomano, os levantamentos apontavam que um nome de muita expressão eleitoral ou muito conhecido pra compor a chapa poderia sugerir a ‘eleição de dois prefeitos’, de modo que passaria a sensação de mais um tucano abandonando a prefeitura para se lançar ao governo, o que havia acontecido com os antecessores José Serra (2006) e João Doria (2018).

    Ricardo Nunes e Bruno Covas na convenção que oficializou a chapa de MDB e PSDB
    Ricardo Nunes e Bruno Covas na convenção que oficializou a união de MDB e PSDB na eleição municipal em São Paulo
    Foto: Reprodução/ ricardonunes.sp/ Facebook

    O nome de Marta Suplicy também chegou a ser considerado para o posto que Nunes assumiria. Mas contra ela pesava o histórico no PT, por mais que ela ainda tivesse força significativa em distritos paulistanos da periferia. Justamente por isso, a equação perfeita foi deixar Marta próxima a Covas, mas fora da chapa. Desleal ao próprio partido, o Solidariedade, a ex-petista e ex-emedebista declarou apoio a Covas e estará na rua, fazendo campanha com o tucano.

    Mesmo sem o DEM e o Progressistas, nem um nome forte como Russomano, Datena, Joyce ou Marta, Ricardo Nunes ainda não encabeçava a bolsa de apostas para a dobradinha com Bruno Covas. Tucanos próximos ao prefeito defenderam fortemente o lançamento de uma chapa pura. Os nomes do ex-líder do PSDB na Câmara dos Deputados, Ricardo Tripoli, agora secretário especial de Covas, e o presidente da Câmara dos Vereadores, Eduardo Tuma, chegaram a ser aventados, mas com menos força do que uma outra personagem, Mara Gabrilli.

    Senadora eleita com mais de 6,5 milhões e meio de votos, Mara reunia atributos que agradavam a equipe da campanha: tinha histórico de vitória na luta pessoal, um expressivo legado eleitoral e era mulher – ponto positivo não só pela simbologia de uma chapa mista, como pela distribuição do dinheiro do fundo partidário, que precisa ter 30% direcionado a mulheres.

    Pra completar, Mara significaria um trunfo na tentativa de agregar o PSD à chapa uma vez que, se eleita vice-prefeita, daria lugar ao suplente Alfredo Cotait Neto, entregando um vaga no Senado nas mãos do partido de Gilberto Kassab.

    Ricardo Nunes, Bruno Covas, João Doria e Rodrigo Garcia
    O vereador Ricardo Nunes (MDB), candidato a vice-prefeito, o prefeito Bruno Covas (PSDB), o governador João Doria (PSDB) e o vice-governador Rodrigo Garcia (DEM)
    Foto: Divulgação/ Assessoria João Doria

    Acontece que os planos não agradaram o ex-embaixador e ex-secretário Andrea Matarazzo, que manteve a pré-candidatura pelo PSD à prefeitura, quatro anos depois de ter aberto mão disso para se tornar vice na chapa não-eleita encabeçada por Marta Suplicy, então do MDB.

    Foi só depois de caírem todas as peças desse dominó político que, mesmo azarão, Ricardo Nunes receberia a notícia de que seria companheiro do atual prefeito de São Paulo na disputa eleitoral. A decisão foi tomada de última hora. Nem mesmo numa reunião realizada na sede da prefeitura na noite da quinta-feira (10), Covas prometeu o posto a Nunes. Ali ainda havia a possibilidade, mas as amarrações finais para sacramentar a composição da chapa, só vieram na sexta (11), véspera da convenção do PSDB.

    De ‘embaixador dos caçambeiros’ a ‘fiscal dos bancos’

    A relação entre Ricardo Nunes e Bruno Covas é relativamente recente. Muito embora já tivessem se encontrado em eventos políticos no passado, eles só começaram a conversar de fato, quando o tucano assumiria a Secretaria das Prefeituras Regionais, já como vice de João Doria. Foi em 2017, no primeiro ano da gestão tucana, quando Nunes seria relator do orçamento da prefeitura.

    No início do segundo semestre daquele ano, o vereador encamparia uma discussão sobre o transporte de resíduos na cidade, fazendo a interlocução do setor com Covas, se tornando uma espécie de ‘embaixador dos caçambeiros’.

    A relação se estreitou quando Covas foi rebaixado por Doria à Secretário da Casa Civil, passando a fazer a interlocução entre prefeitura e Câmara dos Vereadores e, posteriormente, com Covas já prefeito e Nunes presidente do MDB. Ainda assim, a amarração política para o partido participar da gestão municipal foi colocada ‘de molho’ por Covas durante meses, período em que, mesmo assim, Nunes se manteve fiel ao governo nas votações legislativas.

    A relação de Nunes com a gestão tucana, no entanto, não é de total sinergia. O vereador procurou a Secretaria da Educação em pelo menos três oportunidades para promover a interlocução com entidades que fazem a gestão de creches no município. Nenhum pedido desses empresários para assinatura de convênios ou aumento no valor pago pelo aluguel foi aceito pela equipe da pasta.

    Nunes é ex-conselheiro e voluntário de uma das entidades que estão na mira do Ministério Público Estadual e da Polícia Civil numa investigação sobre irregularidades nos repasses da prefeitura na área. A administração diz que vem aprimorando processos pra resolver o problema desde 2017 e Nunes nega que tenha qualquer participação com irregularidades.

    Controlador de pragas milionário

    Nas eleições de 2016, o emedebista declarou um patrimônio de R$4.505.337,23. A lista de bens do vereador e empresário inclui terrenos, imóveis, fazendas, um trator, várias aplicações e dinheiro vivo. O valor aplicado por ele mesmo em sua própria campanha beirou o teto dos 10% das posses com um investimento de R$ 450 mil.

    Pra se tornar milionário, Ricardo Nunes começou enquanto ainda era jovem e cursava direito na FMU. Ele criou um jornal que seria batizado como Hora de Ação, atendendo bairros da Zona Sul, especialmente a Capela do Socorro e o Grajaú, território que se tornaria o berço eleitoral do futuro político. Endividado e inadimplente, teve que largar a faculdade e começou na carreira pública trabalhando na secretaria de Obras do estado.

    Nunes (E), Covas e Doria na convenção do PSDB
    Nunes (E), Covas e Doria na convenção do PSDB que confirmou a chapa à prefeitura de São Paulo
    Foto: Reprodução/ tucano.org.br

    Com o tempo, Nunes encontrou o nicho de mercado que o garantiria a criação de um pequeno império, o controle de pragas. Foi especialmente na desinfecção de navios nos portos brasileiros, impedindo a destruição de grandes remessas de grãos, que o empresário cresceu.

    Em 1997 criou a Nikkey, que se tornaria uma das maiores nesse tipo de atividade no Brasil, com cerca de 400 funcionários e unidades em portos e aeroportos nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia e Espírito Santo.

    Português com boa condição financeira, Luis Nunes, pai de Ricardo, perdeu tudo quando o agora político ainda tinha 14 anos. Ele havia deixado o posto de gerente em uma das principais companhias de transporte urbano de São Paulo pra decidir investir na cidade de Cananeia, no extremo sul do litoral paulista. Os negócios não deram certo e, entre outras coisas, Ricardo teve que trocar a escola particular, Jesus Maria José, pela estadual Dom Duarte Leopoldo e Silva.

    ‘Self-made man’

    No mesmo dia em que tirou o título de eleitor, Ricardo Nunes se filiou ao então PMDB. Aos 23 anos foi candidato a vereador pelo partido, o que lhe renderia 3.200 votos, número até expressivo pela conjuntura da época.

    A primeira vitória, no entanto, viria em 2012, com 30.747 votos. Quatro anos depois, Nunes quase dobrou a votação, batendo 54.692 votos. Ainda assim não é o fator eleitoral que mais agrega à chapa, segundo articuladores da campanha de Bruno Covas.

    Para eles, a reaproximação PSDB-MDB em São Paulo tem uma “dimensão política simbólica”. No entanto, pela pouca expressividade de Nunes no âmbito nacional do MDB, a avaliação deles é de que isso não implicaria em nenhum arranjo para as eleições de 2022. Ao contrário, seria um movimento puramente local, com um significado importante para a política paulista, apenas.

    Na prática, Nunes será apresentado pela campanha de Bruno Covas como um “comerciante raiz”, que “veio de baixo” e representa um “self-made man”, mesma estratégia biográfica usada por João Doria na campanha à prefeitura em 2016.

    Os atributos pessoais de Nunes serão explorados, como o fato de ser pai de família, ter começado jovem na política, a influência local no empresariado do baixo clero na zona Sul e um potencial diálogo com o setor do comércio, castigado pela pandemia do coronavírus.

    Mais do que isso, pesa a favor de Nunes o empenho pessoal dele na presidência da CPI dos Sonegadores Fiscais, que ajudou a recuperar mais de R$ 1,2 bilhão de devedores de impostos como ISS da prefeitura, especialmente bancos.

    Uma das possibilidades é fazer um paralelo com o futuro adversário da chapa, Celso Russomano, do Republicanos, que se apresenta como “defensor do consumidor”. Neste cenário, Nunes seria visto mais do que como um vereador leal à Covas, mas como um “sócio da saúde financeira” da cidade ou “fiscal dos bancos”, agregando na defesa do contribuinte.