Tarso e Sartori debatem desdobramentos da divulgação do vídeo ministerial
Para ex-ministro da justiça Tarso Genro, decisão de Celso de Mello foi acertada; já para o desembargador Ivan Sartori, ela poderá acirrar o choque entre poderes


A CNN convidou dois juristas para debater os possíveis desdobramentos da publicização do vídeo da reunião ministerial do dia 22 de abril, divulgado nesta sexta-feira (22) pelo ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF).
O ex-ministro da Justiça do governo Lula e ex-governador do Rio Grande do Sul Tarso Genro considera acertada a decisão de Celso de Mello. “Nós temos que compreender que se trata de um processo que envolve duas pessoas extremamente importantes no país, um ex-ministro da Justiça e um presidente da República, que estão sob ameaça de um processo penal”.
Tarso considera que o ministro do Supremo, em sua trajetória, sempre teve uma conduta ética, não podendo ser acusado de esquerdista ou direitista, uma vez que, na opinião de Tarso, Celso de Mello trata as diferentes matizes ideológicas de maneira “correta e idêntica”.
Já o desembargador aposentado e ex-presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo Ivan Sartori critica a decisão de retirada de sigilo, uma vez que poderá, segundo ele, acirrar o choque entre os poderes. “Você divulgar uma reunião ultra secreta, sigilosa, expor o presidente, expor os ministros, da forma como aconteceu, eu vejo que é uma grave situação política que o país está enfrentando”.
Ainda segundo Sartori, houve um caso de ingerência de Celso de Mello: “Ele extrapolou com a devida vênia as atribuições do Supremo Tribunal Federal. A ordem judicial deve ser obedecida até o momento em que um poder não invada o outro. Não haja ingerência sobre o outro”.
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Tarso Genro, ao contrário, acredita que as questões constituintes são sempre questões políticas e também jurídicas. “Não tem uma situação que se não faça uma fusão entre política e direito. Esta fusão entre política e direito está na base do poder constituinte”.
Para o ex-governador, o país vive um contexto atípico. “Vou dar dois exemplos: Nós estamos em um país que o presidente da República vai e homenageia os seus apoiadores que estão fazendo uma movimentação na frente do quartel para fechar o Supremo ou que vão na frente do Supremo dizer que aquela instituição tem que ser fechada. De outra parte, nesta reunião ministerial, o presidente diz que quer armar, o que ele chama de povo, certamente os seus defensores, seus apoiadores políticos, para resistir à um golpe de estado. Um golpe de estado de quem? Um golpe de estado contra quem? Na verdade, o que ele está chamando é uma formação miliciana da sociedade, isso é um delito muito grave”, afirma.
Tarso Genro acredita que o ministro Celso de Mello tenha reconhecido essa instabilidade política no país, e a divulgação do vídeo foi mais uma forma para “vermos com quem estamos tratando”. “No caso concreto, estamos tratando de um ex-ministro da Justiça, que pode ser réu num processo, e de um presidente da República que pode ser réu num processo. Então, essa decisão foi muito acertada, foi muito correta, foi muito adequada ao que um ministro do supremo tribunal federal deve fazer”, concluiu.
Sartori considera a divulgação do vídeo como um ataque à Presidência e levanta outra questão, sobre o confiscamento do celular do presidente Jair Bolsonaro. “Concordo com a nota do ministro General Heleno, acho que a nota é firme. Se a coisa persistir desta forma, nós estamos caminhando para uma crise institucional séria. Eu não vejo no que isso pode aproveitar ao país. Mesmo porque o vídeo não traz absolutamente nada. O presidente fala na segurança e na perseguição de familiares e amigos. Isso é possível, se tratando de uma autoridade máxima, que se infiltrem pessoas nestas instituições para minar o poder central. Quanto a manifestação de alguns cidadãos de direita que manifestaram pelo fechamento do Supremo ou também com qualquer outro fechamento de Congresso, eu absolutamente não concordo com isso, sou contra isso, mas eu acho que é liberdade de expressão.”
Para Sartori, o ex-ministro Sergio Moro teria blindado o seu ministério não deixando o presidente ter acesso. Ele discorda que tenha havido uma suposta tentativa ilegal de interferência do presidente da República na polícia federal. “Todo ministério é da assessoria do presidente, faz parte da equipe do presidente, Então, o Moro queria ali aquelas pessoas que eram da sua confiança, e o presidente queria aquelas outras que eram da sua confiança. Moro resolveu endurecer, fechou o ministério, e o presidente simplesmente não tinha como ter acesso”.
Sobre os motivos que podem ter levado Bolsonaro a querer fazer trocas na direção da Polícia Federal, especialmente se tratando do Rio de Janeiro, Sartori afirma que perseguições e infiltrações nestas instituições, a fim de minar o presidente, são possíveis. “É aí que começa o movimento para dilapidar o poder do presidente. É aí que começa o golpe. Tanto que nós vimos que no Rio de Janeiro, além de ser um estado hostil ao presidente, com todo respeito ao Witzel que eu gosto e é meu amigo, mas ali é um estado hostil ao presidente, é um estado que vem dando problema para o presidente e é o estado em que até houve uma fake news de que ele estaria ligado de alguma forma com o assassinato da Marielle. Então, a gente precisa tomar muito cuidado porque o presidente está sendo atacado de todos os lados”, diz.