Governo aposta no caos para justificar ‘projeto autoritário’, diz Marina Silva
Em entrevista à CNN, a ex-ministra afirmou que o presidente Jair Bolsonaro e seu governo são "o pior transtorno na condução da pandemia" de Covid-19


A ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva (Rede) disse à CNN nesta quarta-feira (10) que o pior transtorno na condução do combate à pandemia de Covid-19 no país é o governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que segundo ela “aposta no caos para ver o Brasil em convulsão social e justificar um projeto autoritário de poder”.
“Acho que o presidente da República e seu governo são o pior transtorno na condução da pandemia. Nós estamos há mais de 20 dias sem um ministro da Saúde”, afirmou Marina Silva, dizendo também que o governo “tentou falsear dados” sobre a Covid-19 e provoca crises com o Congresso, o Supremo e dentro do próprio governo.
Segundo a ex-ministra, “Bolsonaro é o principal polo da crise”, e debater a cassação da chapa Bolsonaro-Mourão pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) “é um ato de legítima defesa”.
Para Marina, o governo é quem cria os fatos que leva aos inquéritos no TSE, no STF (Supremo Tribunal Federal) e aos pedidos de impeachment na Câmara dos Deputados.
“Quem está menos preocupado com a crise é o presidente, ele é quem está estimulando que as pessoas vão para a rua, desestruturando ações de governadores e prefeitos, criticando a mídia por divulgar os dados como acontecem, ao interferir na Polícia Federal”, listou. “Ele que fez uma reunião abominável, um lugar que era para discutir a crise da pandemia, conspirando contra a democracia”.
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‘Pedalada sanitária’
Marina também classificou a tentativa do Ministério da Saúde de reformular os dados da pandemia como “pedalada sanitária”.
“O mais alto cargo da República tem que ser um exemplo. Os países que não levaram [a pandemia] a sério tiveram que fazer mea culpa, só Bolsonaro continua estimulando o contágio. O presidente induz as pessoas ao erro, o Ministério da Saúde queria fazer uma pedalada sanitária com a vida das pessoas”, afirmou.
Segundo a ex-ministra, seu partido apresentou o pedido para cassar a chapa do presidente da República porque “não se pode admitir disputa eleitoral com base em atitudes criminosas”.
“Quem ganha mentindo, vai governar mentindo”, disse Marina, que foi candidata à Presidência nas eleições de 2010, 2014 e 2018.
O TSE deveria julgar esse pedido e outro semelhante apresentado pelo PSOL nesta terça (9), mas a audiência foi suspensa após o ministro Alexandre de Moraes pedir mais tempo para analisar o caso.
Marina também falou sobre o pedido da Rede para retirar uma representação que a legenda havia feito pedindo a suspensão do inquérito das fake news.
“O partido fez a avaliação à luz de novos fatos. Minha opinião é que deveria ser mantida, uma vez em avaliação é de atribuição da própria Corte”, disse.
Frente democrática
A ex-candidata à Presidência também falou da criação de um movimento suprapartidário pela democracia e sobre uma eventual participação de seu antigo partido, o PT, nesse processo.
“O Partido dos Trabalhadores ficou refém da própria narrativa. Como diziam que era golpe a cassação de Dilma, quiseram manter o discurso que não seriam favoráveis ao impeachment. Eles mudaram e entraram com um pedido, mas parte da liderança petista é exclusivista”, afirmou, citando que há exceções. “O momento é de defender a democracia com aqueles que podem reconhecer os erros do passado e são capazes em pensar no Brasil, e não em um projeto de poder”.
Ela se disse feliz em ver a união de figuras como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), o ex-governador Ciro Gomes (PDT) e outras figuras e partidos se unindo pelo projeto. Marina também mostrou abertura para o outro lado de espectro político.
“Tem pessoas da direita que não defendem o autoritarismo, não querem ver a economia em frangalhos, a Amazônia destruída”, afirmou.
Racismo
Como a primeira mulher negra a se candidatar ao mais alto posto da República, Marina também falou sobre as manifestações nos Estados Unidos e outros países do mundo contra o racismo e a violência policial.
“A frase que a vida das pessoas pretas importam é corretíssima, assim como a dos índios, dos gays, dos pobres, independente de quem sejam, é a dignidade humana e o respeito à vida”, disse.
Ela disse que pessoas racializadas são sufocadas, assim como George Floyd, quando não são tratadas igualmente em uma entrevista de emprego, quando não têm espaço para estudar, acesso a livros e à merenda. Para Marina, as manifestações são encorajamento coletivo para que pessoas de todas as etnias lutem contra o preconceito.
“Devemos combater a discriminação de todas as mandeiras, os processos culturais, os explícitos, os velados e os estruturalmente engendrados para que fiquemos trancados do lado de fora”, afirmou.
(Edição: Bernardo Barbosa)