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    Espelho da Justiça no Brasil, STF mostra dificuldade de negras para terem espaço no Judiciário, dizem especialistas

    Grupos reivindicam a indicação de uma mulher negra para ocupar a vaga que será deixada pela ministra do STF Rosa Weber

    Bárbara Brambilada CNN São Paulo

    Às vésperas da indicação de um novo nome para o Supremo Tribunal Federal (STF) e a Procuradoria-Geral da República (PGR), especialistas ouvidas pela CNN ressaltam a importância de mulheres negras em cargos de tomada de decisão e pontuam que ainda há entraves que levam à baixa representatividade existente no Judiciário.

    “Estamos falando da representatividade em todas as instâncias, inclusive num lugar específico da legislação brasileira, de um tribunal superior que dê conta de ajudar o Brasil a seguir em frente da melhor forma possível, garantindo a diversidade, a pluralidade e a presença de mulheres negras nesses espaços. A gente precisa mostrar para as nossas crianças que em lugares públicos de decisão política nós podemos contar com mulheres negras”, diz Iêda Leal, secretária de Gestão do Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial (SINAPIR).

    Para a secretária, as mulheres negras se prepararam por décadas e estão prontas para ocupar esses espaços. A juíza do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJ-MG) Lívia Borba, uma das organizadoras do Movimento Nacional pela Paridade no Judiciário, acrescenta que o STF, num espelhamento do que ocorre em Cortes de todo o país, ainda carece de representatividade feminina.

    A situação é ainda pior no caso das mulheres negras.

    “No Relatório Justiça em Números 2023, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ficou apontado que os tribunais de justiça de Rondônia e do Amapá não têm nenhuma desembargadora. Pernambuco tem uma, e do total de desembargadores de São Paulo, só 10% são mulheres”, explica Borba.

    “Vemos uma baixa representatividade em todo o país, e a Suprema Corte refletindo isso. No caso das mulheres pretas a situação fica mais crítica, o percentual de magistratura composto por elas nos tribunais é de 5%. As cotas que hoje são aplicadas apenas à população negra ainda não foram capazes de alterar a composição das cortes, dos tribunais de forma geral”, prossegue a magistrada.

    Os grupos que reivindicam a indicação de uma mulher negra para ocupar a vaga que será deixada pela ministra do STF Rosa Weber são muitos. Um deles, o Mulheres Negras Decidem, conta com quase 25 mil seguidores numa rede social.

    Apesar da movimentação, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse, na segunda-feira (25), que o critério para o cargo não será gênero ou cor, mas “atender aos interesses do Brasil”. Os nomes mais ventilados são os do ministro da Justiça, Flávio Dino, do advogado-geral da União, Jorge Messias, e do presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas.

    Para a organizadora do Movimento pela Paridade, a possibilidade da Corte deixar de ter duas magistradas para ter uma ou a continuidade da falta de um (a) juiz negro (a) representaria um retrocesso.

    “A gente confia que haja um compromisso com a democracia e com a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, pois estamos falando da representatividade, a representação da maioria da população que compõe o país. Temos mais mulheres e mais pessoas negras. É fundamental que a igualdade prevista pela constituição seja material, real”, pontua Borba.

    Já a secretária da Igualdade Racial pondera que, apesar da importância da indicação de uma mulher negra ao cargo, há outros fatores a serem avaliados e considerados pelo presidente.

    “Eu acho que o presidente é um homem muito sábio e as respostas também devem caber dentro da sabedoria de um homem que precisa coordenador todo o país. […] O que nós estamos dizendo para o Brasil, inclusive para o presidente, é que é necessário a gente ter essa pauta, essa reivindicação passando pela mesa e avaliação dele”, finaliza Leal.

    VÍDEO – Pressão é normal, mas decisão é de Lula, diz ministro à CNN sobre escolha para STF

    Justiça e paridade de gênero

    Em sessão nesta terça-feira (26), o CNJ volta a analisar a Resolução que prevê o aumento da participação feminina nos tribunais federais, estaduais e do trabalho. O documento busca agir a partir da abertura de editais alternados com a formação de listas mistas e exclusivas de mulheres para promoções por antiguidade e por merecimento de desembargadores e juízes auxiliares dos tribunais de justiça estaduais e federais.

    Para a juíza Lívia Borba, as medidas são importantes ao ajudar a diminuir diferenças entre homens e mulheres que têm favorecido juízes do gênero masculino.

    “Os homens juízes têm mais disponibilidade de tempo do que as mulheres. Além de tempo, eles têm maior mobilidade. Se eles são promovidos hoje, tem municípios a 1 mil km, eles acabam aceitando e muitas mulheres os acompanham, no caso da mulher, ela tem que verificar isso antes, ver com o marido, a escola dos filhos, muitas vezes ela não aceita essa promoção”, explica.

    “O poder judiciário abraçou o profissionalismo, que é uma ideologia que busca ver o contexto de uma forma neutra. Tudo aquilo que extrapola o juiz branco, ou seja, a mulher, o juiz negro, a juíza negra, é visto sob um olhar da neutralidade que vai para questões meritocráticas, há um apagamento das diferenças. Por isso acredito que está havendo uma grande agitação na questão da antiguidade. São Paulo é um tribunal que segue a antiguidade, o juiz de São Paulo ele sabe quando vai chegar no tribunal, porque os critérios de antiguidade e de merecimento se guiam pelo mais antigo. Só que esse mesmo tribunal só tem 10% de mulheres”, acrescenta.

    É nesse sentido que a magistrada explica que, além de atuar para a aprovação do documento que dará mais oportunidades de promoções a mulheres nos tribunais, o Movimento Paridade no Judiciário coleta assinaturas de apoio para endossar uma carta direcionada ao presidente Lula sobre a próxima vaga do STF. O documento pede a indicação de uma mulher.

    “O documento não especifica cor porque veja, na situação que estamos de baixa representatividade, nós pedimos a indicação de uma magistrada do gênero feminino, independente de ser branca ou negra, mas eu ressalto que a interseccionalidade, considerar gênero e raça, é fundamental e estamos olhando para isso. A gente quer uma mulher que represente tudo o que a gente precisa. É por isso que queremos dialogar, chamar o maior número de magistradas possível”, finaliza.

    A aposentadoria da ministra Rosa Weber ocorre na próxima quinta-feira (28).

    Veja também: STF e Congresso divergem em pautas polêmicas: entenda