Especialistas debatem se ações de apoiadores de Bolsonaro são terroristas
O advogado Davi Tangerino, o professor do Centro de Altos Estudos de Segurança da Polícia Militar, Coronel José Vicente da Silva, e o jurista Lenio Streck falaram sobre o crime cometido por um manifestante que colocou um explosivo no Aeroporto Internacional de Brasília
Em painel promovido pela CNN, o advogado e professor da UERJ Davi Tangerino, o professor do Centro de Altos Estudos de Segurança da Polícia Militar, Coronel José Vicente da Silva, e o ex-procurador de Justiça e jurista Lenio Streck falaram sobre a tentativa de atentado com explosivo no Aeroporto Internacional de Brasília cometida por um apoiador do presidente Jair Bolsonaro (PL).
Para Davi Tangerino, o ato se encaixa no conceito social de terrorismo, mas ele explicou que a lei condiciona o crime de terrorismo à motivação xenofóbica, de discriminação ou preconceito.
“Não é o crime de terrorismo, mas isso não quer dizer que haja crime previsto para este ato”, disse, citando a legislação que prevê crime no uso de violência para tentar dissolver o estado democrático de direito.
O suspeito preso pela Polícia Civil disse em depoimento que a intenção dele e do grupo com quem estava era levar à intervenção militar e à decretação de um estado de sítio para “impedir a instauração do comunismo no Brasil”.
O Coronel José Vicente da Silva disse que é preciso que a polícia consiga se adiantar à ocorrência desses eventos através do trabalho de inteligência. E também ressaltou que, para fins jurídicos e legislativos, a ação não é terrorista, já que a lei não inclui motivações politicas.
Lenio Streck pontuou que o crime é resultado de uma questão que se iniciou “lá atrás”, desde que os manifestantes começaram a fechar estradas e ocupar quartéis após a vitória do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no segundo turno das eleições. “O Ministério Público não cuidou disso, foram deixando. O que vivemos hoje é resultado dos erros cometidos lá atrás.”
Tangerino concordou que houve falhas prévias. “O suspeito foi ouvido pela polícia e dá todas as pistas em seu depoimento, ele diz que teria ouvido de policiais do Distrito Federal que eles não fariam nada contra os manifestantes.”
Para ele, também não podemos desonerar o presidente da República de parte da culpa, já que o criminoso disse no depoimento que se sentia encorajado por Bolsonaro a tomar essas medidas. “O Estado tem se colocado docilmente em relação a esses sujeitos que vem escalando em violência”, disse Tangerino, “a polícia reage de forma muito diferente quando outros grupos estão protestando”.
O Coronel ponderou que é preciso considerar os limites ao trabalho policial. “Esses casos de lobos solitários escapam à inteligência da polícia. É mais fácil detectar situações coletivas que individuais.”
Ele discorda que as ações do presidente Jair Bolsonaro tenham incentivado esses indivíduos, e disse ser necessário pensar em alterações na nossa legislação de terrorismo.
Streck disse que a lei nunca prevê todas as hipóteses de aplicação, e que, mesmo que esse ato não se enquadre como terrorismo, há leis que se aplicam a ele. “Temos que sentar e fazer uma revisão do Código Penal brasileiro. Precisamos tirar lições do que passou”, falou.
Ele também comentou sobre a postura de Bolsonaro, “ele poderia, em várias oportunidades, ter dispersado essas multidões. Sem multidão, os lobos solitários não estariam aí.”
Tangerino disse que não considera a legislação “culpada” pelo crime. “Não é por ausência de leis que essas coisas estão acontecendo no Brasil, e sim por uma política pública de tolerância e incentivo a isso.”
O Coronel José Vicente da Silva ressaltou que as ações deste tipo são extremamente raras, e que a polícia também tem obrigação de preservar a ordem constitucional e o direito de reunião dos manifestantes.
Streck falou que a lei não prevê em nenhum momento que atos antidemocráticos que pedem intervenção militar sejam preservados. “Isso talvez tenha sido o erro inicial de leitura da lei quanto a legitimidades dessas manifestações.”