Entenda os próximos passos em relação à investigação da PGR sobre Bolsonaro
Procedimento deve durar 90 dias, período em que órgãos como CGU e TCU, além da CPI da Pandemia, poderão compartilhar provas; testemunhas também ser ouvidas
A Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) para abrir um inquérito para investigar se o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) cometeu o crime de prevaricação caso tenha sido informado e não tenha tomado providências sobre supostas irregularidades em relação à negociação pela vacina Covaxin.
A ministra Rosa Weber, do STF, autorizou, ainda na sexta-feira (2), a abertura do inquérito para apurar a conduta do presidente no caso da negociação para a aquisição do imunizante.
A partir de agora, a Polícia Federal (PF) deve ter 90 dias para realizar diligências, que são as medidas buscas e apreensões, análise de documentos e coleta de depoimento de possíveis investigados e testemunhas.
A petição assinada pelo vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques de Medeiros, determina os próximos passos que devem ser tomados pelas autoridades.
O primeiro deles é a solicitação a órgãos fiscalizadores, como Controladoria-Geral da União (CGU), o Tribunal de Contas da União (TCU), e a Procuradoria da República no Distrito Federal o compartilhamento de provas sobre a denúncia de supostas irregularidades feitas pelos irmãos Miranda durante depoimento na CPI da Pandemia.
Esse pedido de compartilhamento de provas, aliás, é extensivo também à comissão de investigação no Senado, que deve ouvir na próxima semana funcionários do Ministério da Saúde citados por Luis Miranda e Luis Roberto Miranda na oitiva aos senadores.
Medeiros também determinou que sejam produzidas provas, inclusive por meio de testemunhas, sobre a prática do “ato de ofício após o prazo estipulado ou o tempo normal para sua execução”, “a competência dos supostos autores do fato”, “inexistência de discricionariedade quanto à prática ou omissão do ato pelo agente” e “caracterização de dolo, direto ou eventual, acrescido do intuito de satisfazer interesse ou sentimento pessoal”.
Por fim, o vice-procurador-geral também determinou que sejam “ouvidos os supostos autores do fato”, o que implicaria em tomar explicações do presidente Bolsonaro, do então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, e do seu número 2 no ministério, Elcio Franco – que, segundo o senador Fernando Bezerra (MDB-PE), membro da CPI da Pandemia, teria sido o responsável por descartar irregularidades no processo.
Depoimento por escrito ou presencial?
Caso a PGR decida ouvir Bolsonaro sobre o caso da Covaxin, será preciso determinar, antes, como isso deve acontecer: de forma presencial ou por escrito.
Isso porque o próprio STF ainda não concluiu o julgamento de outro processo – em que Bolsonaro é investigado por suposta interferência indevida nas atividades da PF – que determinará a modalidade de depoimento do presidente.
De acordo com a agenda do segundo semestre do STF, divulgada na quinta-feira (1º), a previsão é que esse processo seja julgado pela Corte no dia 29 de setembro.
Eventual processo depende de aval da Câmara
Vale ressaltar que essa etapa de inquéritos não incorre em nenhum tipo de sanção ou penalidade aos envolvidos, incluindo o presidente Bolsonaro, e nem garante que ele ou qualquer dos investigados será alvo de uma denúncia da PGR.
“Se a PGR analisar todos os fatos, analisar a queixa-crime, provavelmente vai proceder a uma investigação, como se faz com qualquer crime, com o auxílio fundamental da Polícia Federal. Se, na sequência, tiver indícios suficientes de autoria e materialidade do crime, a PGR vai apresentar uma denúncia junto ao STF”, afirma Vera Chemim, advogada e mestre em Direito Público.
Além disso, numa próxima etapa, se decidir processar o presidente por prática de crime comum, a PGR deve apresentar uma denúncia ao STF, a quem cabe o julgamento desses casos. O STF, no entanto, precisa de autorização prévia da Câmara dos Deputados para dar andamento ao processo.
Dessa forma, seria papel do atual presidente da Câmara, o deputado Arthur Lira (PP-AL) levar o caso ao Plenário – também é feita uma avaliação pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), mas ela é apenas uma instrução.
No Plenário da Câmara, a votação é feita por chamada nominal e são necessários os votos de 2/3 dos deputados (342) para que seja aprovada a autorização de abertura de processo contra o presidente da República. Sem isso, o caso é arquivado, e o processo na Justiça fica suspenso até o término do mandato presidencial.
Câmara barrou envio de duas denúncias contra Temer ao STF
Em 2017, a Câmara dos Deputados barrou o envio ao STF de duas denúncias contra o então presidente Michel Temer (MDB) apresentadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
A primeira delas, em 2 de agosto, foi rejeitada por 263 votos a 227 – com 2 abstenções –, e tratava de denúncia por crime de corrupção passiva.
Essa foi a primeira fez que a Câmara votou uma solicitação para instauração de processo contra um presidente da República.
Já em 25 de outubro uma segunda denúncia também foi rejeitada pelos deputados. Foram 251 votos contra e 233 favoráveis ao envio da denúncia ao STF – além de 2 abstenções e da ausência de 25 parlamentares.
A denúncia – apresentada pelo então procurador-geral da República, Rodrigo Janot – acusava Temer e os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral) de organização criminosa com o intuito de arrecadar propinas, estimadas em R$ 587 milhões.
Esse controle político existe, segundo a Câmara dos Deputados, “para impedir que o ocupante do cargo seja perseguido com denúncias e processos”. No momento da análise do mérito das acusações, o Supremo irá analisar essa denúncia, os indícios de autoria e materialidade do crime e decidir se recebe ou não a denúncia.
“Se receber a denúncia, aí sim, ele será processado e julgado pelo STF pelo fato de ser uma infração penal comum. Mas antes disso, o presidente ficará suspenso de suas funções, conforme prevê o parágrafo primeiro do artigo 86, mesmo que não seja considerado crime de responsabilidade, ele vai ficar suspenso das funções por 180 dias, até que o STF julgue, condene ou não”, diz a advogada.
O que é prevaricação?
O crime de prevaricação, do qual o presidente é acusado pelo senador, está previsto no artigo 319 do código penal, que significa “retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício ou praticá-lo contra a disposição expressa de lei para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”. A pena para o crime é detenção de três meses a um ano e multa.
Código Penal - Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Prevaricação Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal: Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa
(Com informações de Anna Gabriela Costa, da CNN, em São Paulo, e da Agência Câmara de Notícias)