Com a saída de Ribeiro, Bolsonaro fará sua 5ª indicação para ministro da Educação
Suposto favorecimento a pastores na distribuição de recursos se soma a crises no Ministério da Educação envolvendo gravações de alunos, ataques contra o STF e mentiras em currículo


Com o anúncio da saída de Milton Ribeiro do Ministério da Educação, o presidente Jair Bolsonaro (PL) fará sua quinta indicação para o comando do MEC. Além de Ribeiro, a pasta já foi ocupada no governo Bolsonaro por Ricardo Vélez Rodriguez e Abraham Weintraub. O nome de Carlos Alberto Decotelli chegou a ser anunciado para a pasta em 2020, mas ele não chegou a tomar posse.
Ribeiro deixa o cargo de ministro após um áudio obtido pelo jornal “Folha de S.Paulo” e reportagens do “O Estado de S. Paulo” terem revelado um suposto esquema de favorecimento a pastores na pasta.
Em uma conversa gravada, o agora ex-ministro afirma que recebeu um pedido do presidente Jair Bolsonaro para que a liberação de verbas da pasta fosse direcionada para prefeituras específicas a partir da negociação feita por dois pastores evangélicos que não possuem cargos no governo federal –Gilmar Santos e Arilton Moura.
Na conversa vazada, Ribeiro indica que, com a liberação de recursos, poderia haver uma contrapartida. “O apoio que a gente pede não é segredo, isso pode ser [ininteligível] é apoio sobre construção de igrejas”. Nos áudios, não fica claro a forma como esse apoio se daria.
Além disso, uma reportagem do jornal “O Estado de S. Paulo” mostrou que exemplares de uma edição da Bíblia com fotografias de Milton Ribeiro e dos pastores Gilmar Santos e Arilton Moura foram distribuídos na tarde de 3 de julho do ano passado, em um evento organizado pelo MEC em Salinópolis (PA).
Embora tenha justificado a autorização para uso de sua imagem nas Bíblias distribuídas e negado as acusações de favorecimento a pastores na distribuição de recursos do MEC, Ribeiro pediu exoneração da pasta nesta segunda-feira (28).
No entanto, esta não é a primeira vez que uma crise dentro do ministério faz com que haja trocas no comando da Educação. Além de Ribeiro, os outros nomes indicados por Bolsonaro já passaram por situações polêmicas que resultaram em demissões.
Ricardo Vélez Rodríguez (janeiro de 2019/abril de 2019)
O primeiro nome escolhido por Bolsonaro para ocupar o cargo de ministro da Educação foi o do filósofo e professor colombiano naturalizado brasileiro Ricardo Vélez Rodríguez, que assumiu o MEC no primeiro dia do novo governo.
Admirado declarado do falecido escritor Olavo de Carvalho, grande influenciador do governo Bolsonaro, Vélez Rodríguez acumulou uma série de decisões e declarações polêmicas à frente da pasta.
A demissão do colombiano foi anunciada pelo presidente na primeira semana de abril de 2019, quando o governo atingiu a marca de 100 dias de mandato, após uma série de trocas no alto escalão do MEC promovidas pelo então ministro.
Entre feitos de sua gestão, Vélez Rodríguez pediu aos diretores de escolas de todo o Brasil que gravassem os alunos cantando o hino nacional e citando o slogan da campanha presidencial de Bolsonaro em 2018: “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”.
O ex-ministro também propôs revisões polêmicas em uma série de livros didáticos, principalmente sobre os conteúdos relacionados ao golpe militar de 1964, e declarou que “o brasileiro, viajando, é um canibal”.

Abraham Weintraub (abril de 2019/junho de 2020)
O economista Abraham Weintraub assumiu o MEC logo após a demissão de Ricardo Vélez Rodríguez, em 9 de abril de 2019, e permaneceu no cargo por pouco mais de um ano. Weintraub acumulou uma série de desgastes com outras autoridades, principalmente com ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).
Em reunião ministerial no dia 22 de abril de 2020, que foi gravada e teve seu conteúdo divulgado por decisão do STF, o então ministro da Educação sugeriu a prisão dos integrantes da Corte. “Eu percebo que tem muita gente com agenda própria. Eu, por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia. Começando no STF”, disse na ocasião.
Por conta da declaração, Weintraub foi incluído como parte do inquérito que apura ameaças e fake news contra o STF. O ex-ministro ainda foi alvo de uma outra investigação, dessa vez a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) pelo suposto crime de racismo.
Na ocasião, diante dos primeiros meses da pandemia da Covid-19, ele fez uma publicação trocando a letra “R” por “L”, fazendo referência a uma imitação preconceituosa do sotaque chinês, e afirmou que a China obteria ganhos políticos com um “plano infalível” para dominar o mundo se aproveitando da crise derivada do coronavírus.
Após repercussão negativa, o ministro apagou o texto. A embaixada da China, no entanto, afirmou que as postagens possuíam “cunho fortemente racista”.

Identificado com a chamada ala ideológica do governo Bolsonaro, Weintraub ainda foi protagonista de polêmicas envolvendo falhas na realização do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), contingenciamento de verbas para a educação, críticas incisivas contra a “balbúrdia” em universidades federais e participação em atos da militância bolsonarista.
O ex-ministro deixou o cargo após pedir demissão em junho de 2020, alegando ter recebido um convite para ocupar um cargo de direção no Banco Mundial. Atualmente, Weintraub visa disputar a eleição estadual pelo governo de São Paulo e passou a fazer críticas ao governo Bolsonaro.
Carlos Alberto Decotelli (junho de 2020 – não assumiu o cargo)
Quase duas semanas após a demissão de Weintraub, em 25 de junho de 2020, o presidente Jair Bolsonaro anunciou a indicação de Carlos Alberto Decotelli ao cargo de ministro da Educação. Por meio de publicações nas redes sociais, Bolsonaro anunciou a nomeação e elogiou a carreira acadêmica do novo indicado.
“Decotelli é bacharel em Ciências Econômicas pela UERJ, mestre pela Fundação FGV, doutor pela Universidade de Rosário, Argentina, e pós-doutor pela Universidade de Wuppertal, na Alemanha”, disse o presidente à época.
No entanto, diversas inconsistências sobre o currículo de Decotelli vieram à tona logo após o anúncio.
A universidade alemã em que dizia ter feito um curso de pós-doutorado negou que ele tivesse qualquer certificado pela instituição. A Universidade de Rosário, na Argentina, na qual ele dizia ter doutorado, veio à público dizer que sua tese não foi aprovada. Também foram encontrados indícios de plágio em sua dissertação de mestrado.

As denúncias de irregularidades ganharam força após a Fundação Getulio Vargas (FGV), instituição que o indicado ao MEC afirmava ser professor, ter esclarecido que Decotelli “atuou apenas nos cursos de educação continuada, nos programas de formação de executivos e não como professor de qualquer das escolas da fundação. Da mesma forma, não foi pesquisador da FGV, tampouco teve pesquisa financiada pela instituição”.
Na ocasião, o “ex-futuro ministro” disse ter sido alvo de “destruição de reputação” e defendeu seu currículo. No entanto, não foi o suficiente para fazê-lo assumir o cargo.
O próprio Decotelli pediu demissão do Ministério da Educação no dia em que estava prevista a sua cerimônia de posse, cinco dias após ter sua nomeação anunciada.