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    CNN tem acesso ao inquérito das fake news

    Principais depoimentos são de Joice e Frota, deputados desafetos da família Bolsonaro

    Caio Junqueirada CNN

     

    A CNN teve acesso às 373 páginas do anexo 70 do inquérito 4.781, o chamado inquérito das Fake News.

    De todos os apensos do inquérito, o 70 é o principal até agora. Foi com base nele que o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes determinou a operação realizada no dia 27 de maio tendo por alvo militantes e empresários bolsonaristas. Além disso, o apenso 70 é o mais relevante porque, como se verá a seguir, em seu teor há menções ao presidente Jair Bolsonaro e aos seus filhos Eduardo e Carlos. No entanto, nenhum deles foi alvo da operação. 

    Além do apenso 70, destacam-se também outros apensos no inquérito. O 71, referente às investigações contra Roberto Jefferson; o 74, referente ao ex-ministro da educação Abraham Weintraub. Já os apensos 72 e 73 seguem sendo uma grande incógnita e nem o Ministério Público conseguiu saber ainda o que há dentro dele.

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    Na leitura do apenso 70, é possível verificar que o STF baseou sua ação tendo por elementos principais depoimentos de parlamentares que eram alinhados ao governo mas romperam posteriormente. São eles que mais fazem as menções à família Bolsonaro e ao entorno presidencial.  

    As principais menções ao palácio do planalto nos depoimentos são de ex-aliados do governo

    Ex-líder do governo no Congresso, a deputada federal Joice Hasselmann, por exemplo, que prestou depoimento no STF no dia 17 de dezembro de 2019 ao desembargador César Morales, lotado no gabinete de Alexandre de Moraes, faz os seguinte relatos:

    “Sobre a liderança do vereador Carlos Bolsonaro e do deputado Eduardo Bolsonaro trabalham interligados diversos outros grupos localizados em diversos estados da federação.”

    O segundo depoimento é o do deputado Alexandre Frota, outro ex-aliado do presidente que virou crítico do governo. Ele prestou seu depoimento no dia 17 de dezembro de 2019 no STF.  

    “Os alvos dos ataques dessa organização são definidos por algumas pessoas, podendo o depoente citar dentre elas, Olavo de Carvalho, Carlos Bolsonaro e o assessor para assuntos internacionais Filipe Martins.”

    A certa altura, Frota relata uma conversa que teria tido com a família Bolsonaro no aeroporto de Congonhas. “Indagado sobre a menção que na CPMI sobre impulsionamento de mensagens no Facebook, o depoente relata que ouviu pela primeira vez falar num almoço em que teve com o então candidato Jair Bolsonaro em um restaurante de São Paulo, ao lado do aeroporto de Congonhas, em que estavam presentes também o Vereador Carlos Bolsonaro e o Deputado Federal Eduardo Bolsonaro, além de uma quinta pessoa cujo nome não se recorda. Nessa ocasião o vereador Carlos disse ao seu pai que era necessário um impulsionamento no Facebook, ao que o então candidato respondeu que era necessário viabilizar verba para isso, ao que o vereador Carlos respondeu que para esse fim deviam procurar Otávio. Posteriormente o declarante apurou que essa pessoa era Otávio Facuri, advogado e empresário no ramo de investimentos, que também atuou muitas vezes como intérprete do então candidato, uma vez que é fluente em inglês.”

    A contrariedade de Aras com a operação

    Já é sabido que o procurador-geral da República, Augusto Aras, manifestou-se contra a operação das Fake News antes de ela ocorrer, mas ainda não se conhecia o teor dessa manifestação. A certa altura, cita inclusive decisões pretéritas de Alexandre de Moraes sobre o assunto. Seguem trechos:  

    “A leitura dessas manifestações demonstra, a despeito de seu conteúdo incisivo, em alguns casos, serem inconfundíveis com a prática de calúnias, injúrias ou difamações contra os membros do STF. Em realidade, representam a divulgação de opiniões e visões de mundo, protegidas pela liberdade de expressão nos termos do decisum do Ministro Celso de Mello na Pet-MC 8.830/DF. Esse direito fundamental, que recebeu atenção do texto constitucional em diversas de suas disposições, é amplamente considerado essencial à higidez do regime democrático do princípio republicano.” 

    “A livre circulação de ideias e debate público são fundamentais para a garantia de uma sociedade aberta, na qual distintas visões de mundo são respeitadas de forma igualitária. A relevância da liberdade de expressão nas democracias modernas, ainda mais destacada no âmbito da relação dos particulares com o poder público. A liberdade de expressão e outras que são dela derivadas, como: a liberdade de imprensa e a liberdade de cátedra, consubstanciam poderosos freios à eventuais ímpetos autoritários e são fundamentais para o controle do estado pela sociedade. A jurisprudência desta corte Suprema afirma no respeito à liberdade de expressão, como se verifica no histórico julgamento ADPF 130, em que diversos dispositivos da Lei de Imprensa foram reputados não-recepcionados pela Constituição Federal, precisamente por serem incompatíveis com esse preceito constitucional.”

    “No julgamento da ADI 4.451, sob relatoria do Ministro Alexandre de Moraes, esse STF teceu significativas considerações dessa liberdade pública qual abrange. Além das visões de mundo tidas como verdadeiras ou correta segundo consenso em dada temporalidade. Também, ‘aquelas que são duvidosas exageradas, condenáveis, satíricas, humorísticas, bem como as não compartilhadas pelas maiorias’. Como anotou o eminente ministro relator naquele julgado em passagem, reafirmada pelo Ministro Roberto Barroso, ‘quem se dispõe a vir para o espaço público, tem que aceitar uma certa resignação à crítica construtiva; à crítica destrutiva; à crítica bem informada; à crítica desinformada; à crítica de quem tem interesses afetados e até às críticas procedentes que a gente deve reconhecer e procurar se aprimorar.”

    “Destacou-se ainda naquele julgado, a forte relação entre a liberdade de expressão e a participação política, como se observa no seguinte trecho colhido do voto condutor do acórdão, proferido pelo Ministro relator Alexandre de Moraes”. 

    E cita expressamente um voto de Alexandre na ADI: “Tanto a liberdade de expressão quanto a participação política em uma democracia representativa, somente se fortalecem em um  ambiente de total visibilidade, possibilidade de exposição crítica das diversas opiniões sobre os governantes que nem sempre serão estadista iluminados.”

    E conclui: “Na medida em que as manifestações feitas em redes sociais atribuídas aos investigados inserem-se na categoria de crítica legítima, com quanto
    dura, ao ver deste órgão ministerial são desproporcionais as medidas de bloqueio das contas vinculadas aos investigados nas redes sociais”.

    Laudo inconclusivo sobre utilização de robôs

    Um laudo assinado por três peritos aponta inconclusa quanto à operação de robôs nos procedimentos das Fake News. Seguem trechos dos laudos:

    “Conforme apresentado anteriormente, os perfis influenciadores iniciam os ataques selecionando um tema, por exemplo, o impeachment de membros do STF. Nesta etapa inicial, estes perfis não necessariamente utilizam uma hashtag para disseminar o ataque escolhido, valendo-se muitas vezes de seus seguidores (followers) para “criar” uma hashtag e impulsionar esse ataque. Desta forma os perfis influenciadores não apareceriam como criadores da hashtag que simboliza o ataque.”

    “Os seguidores dos perfis influenciadores podem ser compostos por pessoas reais, robôs, ou até mesmo por perfis secundários do próprio influenciador digital. Entretanto, utilizando as ferramentas de pesquisa e recursos do Twitter, não é possível identificar, com precisão e segurança, se estes seguidores são realmente robôs ou contas secundárias do influenciador.”

    “Ferramentas disponíveis na Internet, como o Botometer, procuram analisar o comportamento dos perfis do Twitter como forma de estimar se são robôs ou não. Em geral, os resultados são imprecisos, especialmente no idioma português, e servem como mera orientação.”

    Outro lado

    A CNN entrou em contato com todos os nomes citados na reportagem sobre o inquérito das Fake News. O Palácio do Planalto respondeu que não irá comentar o assunto. O deputado Federal Eduardo Bolsonaro não retornou as nossas ligações e o vereador Carlos Bolsonaro e o empresário Otávio Facuri não foram encontrados para responder as acusações feitas pelos depoentes no inquérito.

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