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    CNJ aprova regra que proíbe MP e tribunais de destinarem dinheiro de delações e leniência sem ouvirem União

    Definição de novas regras busca preencher lacunas na legislação e acontece após inspeção encontrar indícios de “gestão caótica” de recursos pela Lava Jato em Curitiba

    Regulamentação do tema acontece após o CNJ começar a analisar a atuação e a conduta de integrantes do Ministério Público Federal (MPF) e do Judiciário na negociação e celebração de acordos com pessoas físicas e jurídicas investigadas no âmbito da Lava Jato
    Regulamentação do tema acontece após o CNJ começar a analisar a atuação e a conduta de integrantes do Ministério Público Federal (MPF) e do Judiciário na negociação e celebração de acordos com pessoas físicas e jurídicas investigadas no âmbito da Lava Jato Reprodução/Gil Ferreira/CNJ

    Teo CuryLucas Mendesda CNN

    Brasília

    O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou, nesta sexta-feira (26), novas regras para a gestão e a destinação de valores e bens oriundos de condenações, colaborações premiadas, acordos de leniência e de cooperação internacional.

    A resolução proíbe, por exemplo, a destinação do dinheiro para promoção pessoal de procuradores, promotores, magistrados e defensores públicos e veda que o Ministério Público (MP) e os tribunais determinem a distribuição do dinheiro sem ouvir a União.

    “O manejo e a destinação dos bens e recursos, que são públicos, serão norteados pelos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência, e demais princípios que regem a Administração Pública”, prevê o texto.

    Reflexo da Lava Jato

    A regulamentação do tema acontece após o CNJ começar a analisar a atuação e a conduta de integrantes do Ministério Público Federal (MPF) e do Judiciário na negociação e celebração de acordos com pessoas físicas e jurídicas investigadas no âmbito da Lava Jato.

    A inspeção no tribunal responsável por julgar os processos da operação em Curitiba foi conduzida pela Corregedoria Nacional de Justiça (CNJ). O relatório preliminar apontou indícios de uma “gestão caótica” no controle e no gerenciamento de valores.

    A proposta é de autoria do ministro Luís Felipe Salomão, corregedor nacional de Justiça. O texto foi aprovado por todos os 15 conselheiros do órgão — incluindo o presidente, ministro Luís Roberto Barroso. Além de propor novas regras para a destinação dos recursos, o documento unifica normas de 2012 e de 2020 do próprio conselho.

    O texto foi proposto sob o argumento de que há lacunas na lei que não deixam claro quais entes serão destinatários do dinheiro recuperado por meio dos acordos e de que a União foi deixada de fora das conversas e negociações sobre a destinação dos recursos.

    A tentativa de criação de uma fundação que seria controlada por procuradores da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba para gerir recursos da Petrobras é o caso mais famoso. A intenção foi barrada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).

    A Corregedoria Nacional de Justiça concluiu que o senador Sergio Moro (União-PR), o ex-deputado Deltan Dallagnol e a juíza afastada Gabriela Hardt atuaram para desviar cerca de R$ 2,5 bilhões do Estado brasileiro com o objetivo de criar “uma fundação voltada ao atendimento a interesses privados”. Os três negam as suspeitas.

    Fontes do conselho ouvidas pela CNN avaliam que a aprovação unânime da proposta é um reconhecimento de que há omissões na legislação, de que este é um problema a ser enfrentado para evitar que irregularidades do passado se repitam e para respaldar e dar segurança aos juízes de todo o país.

    Lava Jato serviu de inspiração

    O ministro Salomão justifica a necessidade de aprovação de novas regras afirmando que a correta utilização do dinheiro é uma preocupação antiga do CNJ, que ainda não havia se debruçado sobre este assunto.

    “Para além disso, ganharam grande relevância no cenário judicial brasileiro indagações acerca da destinação de bens e valores oriundos de acordos de colaboração premiada, de leniência e de cooperação internacional”, sustenta.

    Salomão ressalta que o CNJ deve disciplinar o assunto sobretudo porque “algumas práticas judiciais foram consideradas ilegais e inconstitucionais por decisões” proferidas em ações de relatoria de Alexandre de Moraes.

    O ministro faz referência às ações que questionaram no STF o acordo firmado entre a extinta força-tarefa da Lava Jato e a Petrobras que resultaria na criação de uma fundação privada que seria gerida por procuradores.

    Delação premiada

    O CNJ estabelece que o dinheiro que for produto do crime será destinado ao Fundo Penitenciário Nacional ou Estadual. Quando o dinheiro for proveniente de atividade de uma organização criminosa será destinado à União.

    A resolução determina que o dinheiro será destinado à União ou aos Estados quando o crime cometido for o de lavagem de dinheiro. Valores apreendidos em decorrência dos crimes previstos na lei das drogas serão revertidos ao Fundo Nacional Antidrogas.

    Já o dinheiro, bens móveis e imóveis apreendidos em decorrência de crimes cometidos por milicianos será destinado ao Fundo Nacional de Segurança Pública. O MP tem de ser ouvido em todos esses casos.

    Acordos de leniência

    O CNJ define que caberá ao tribunal responsável pelo caso destinar os recursos para o ente público lesado como ressarcimento quando a natureza da responsabilização for indenizatória.

    Quando se tratar de natureza sancionatória, caberá ao tribunal destinar os recursos à União. Em todos os casos, deverá haver instrução probatória, assegurado o contraditório e a ampla defesa.

    Promoção pessoal e atuação política

    O CNJ proíbe a destinação de recursos para custear órgãos do Judiciário, do MP e da Defensoria Pública e a promoção pessoal de procuradores, magistrados, defensores públicos, servidores ou integrantes das entidades beneficiadas.

    O dinheiro não poderá ser destinado para fins político-partidários, entidades que não estejam regularmente constituídas há mais de um ano ou que condicionem ou vinculem o serviço prestado à conversão religiosa ou ao exercício de atividades de cunho religioso.

    Não poderão ser destinados recursos a entidades públicas ou privadas em que procuradores, promotores, magistrados, defensores públicos ou servidores tenham qualquer ingerência na constituição ou administração ou na utilização do dinheiro.

    A resolução ainda proíbe o envio do dinheiro a entidades públicas ou privadas cujas atividades possa decorrer promoção pessoal de membros ou servidores do Poder Judiciário ou do MP, ou de seus cônjuges, companheiros ou parentes.

    Publicidade e transparência

    O credenciamento das entidades públicas ou privadas e projetos a serem custeados pelos valores obtidos nesses acordos e condenações deve ser será realizado por meio de editais públicos e com ampla divulgação.

    Os tribunais poderão criar comitês para fazer o credenciamento geral e periódico dessas entidades para facilitar a escolha e a destinação equitativa dos valores, considerados critérios de pluralidade e impacto social.

    Os tribunais devem divulgar periodicamente os valores arrecadados e as entidades e projetos favorecidos. As entidades beneficiadas também terão de prestar contas do uso do dinheiro e ficam implicadas nas sanções administrativas, civis ou penais decorrentes do uso inadequado dos valores recebidos.