Brasil “dribla” pressão da China por Nova Rota da Seda e usa vitória de Trump para extrair concessões em visita de Xi
Não haverá adesão formal à Iniciativa Cinturão e Rota, dizem fontes da diplomacia; eleição nos EUA servirá para negociar termos mais favoráveis em parcerias
O governo brasileiro pretende usar a vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais americanas como um instrumento de barganha para negociar parcerias mais vantajosas com o líder chinês, Xi Jinping, que fará visita oficial ao Brasil neste mês de novembro, à margem da cúpula do G20.
No Itamaraty e no Palácio do Planalto, está decidido: não haverá adesão formal do país à Iniciativa Cinturão e Rota (BRI na sigla em inglês), ou Nova Rota da Seda, como também costuma ser chamado o megaprojeto de investimentos em infraestrutura liderado por Pequim.
Uma extensa lista de novas parcerias, no entanto, está sendo negociada por altos funcionários dos dois países. Elas se dividem em três eixos principais:
- Finanças: uma das possibilidades é a intensificação do uso de moedas locais para o comércio bilateral;
- Infraestrutura: outra tentativa é finalmente ativar o fundo de US$ 20 bilhões, anunciado em 2015 e jamais colocado em prática, com recursos para projetos industriais e na área de infraestrutura. Com ou sem o fundo, a ideia é atrair mais recursos chineses para grandes obras no país;
- Tecnologia: inclui um cardápio extenso, que vai desde o desenvolvimento conjunto de satélites (como o projeto do CBERS) à maior presença da Embraer na China. Iniciativas conjuntas em inteligência artificial também serão objeto de acordos.
Há ainda a discussão de mais acesso a produtos brasileiros do agronegócio, como carnes e frutas, o que já se tornou uma tratativa frequente entre autoridades dos dois países.
Para diplomatas brasileiros que acompanham de perto os preparativos da visita de Xi, a vitória de Trump se transformará em um importante fator de barganha para extrair mais concessões e resultados mais favoráveis ao Brasil.
Trump, que adota uma retórica agressiva anti-China, pressiona os países a escolher entre os Estados Unidos e a potência asiática como parceiro preferencial. O Brasil, ressalta o Itamaraty, se recusará a fazer escolhas e continuará apostando em “não depositar todos os ovos em uma cesta só”.
No entanto, em um ambiente de fratura geopolítica cada vez maior, a ideia é arrancar mais concessões de um lado e de outro. Como é praxe na diplomacia, nada disso será colocado abertamente, mas o que vai permear a reta final de negociações para a visita de Xi será a presidência de Trump e a abordagem do presidente eleito de “puxar” os países para seu lado.
Reservadamente, um diplomata lembrou à CNN que será a primeira visita de Xi ao continente americano — o “quintal” dos Estados Unidos — após a vitória de Trump, o que fortalece a tentativa do Brasil de barganhar parcerias em termos mais favoráveis.
Nova Rota da Seda
Quanto ao BRI, que já reúne mais de 100 países, o governo brasileiro está convencido a “driblar” pressões da China e não fazer qualquer anúncio de adesão.
Até porque, segundo o Itamaraty, não existe um arcabouço jurídico para a entrada na Nova Rota da Seda, como a assinatura de um tratado internacional.
O que está no radar são anúncios de “aprofundamento” da parceria Brasil-China, com tentativas de trazer mais recursos chineses para projetos de infraestrutura, mas sem nenhuma adesão ao BRI.
Como resume um diplomata ouvido pela CNN, talvez os anúncios sejam genéricos o suficiente para permitir à China dizer que o Brasil entrou na Iniciativa Cinturão e a Rota, e ao Brasil sustentar que não aderiu.
Segundo ele, o fato é que tudo vai continuar como antes: qualquer empresa chinesa que queira investir em um projeto de infraestrutura no Brasil precisará seguir os mesmos trâmites de sempre. Ou seja: conseguir licenças ambientais, participar de concorrência pública, respeitar toda a legislação trabalhista, submeter-se ao escrutínio de órgãos de controle como Ministério Público e Tribunal de Contas da União (TCU).
O que acontece com as ações judiciais contra Trump, agora eleito?