Aliados de Lula articulam deixar para 2023 análise de projeto sobre pesticidas
Objetivo do texto atual do projeto de lei, segundo seus defensores, é agilizar a análise de pedidos de registros e a comercialização de agrotóxicos e demais pesticidas no país


Aliados do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) articulam deixar para 2023 a análise de um projeto de lei que muda regras de aprovação e comercialização de pesticidas. A intenção deles é mudar o texto e fazer com que o tema não seja mais votado neste ano no Senado, onde tramita. Querem que o projeto só seja retomado após a posse do novo governo e da nova composição do Congresso Nacional.
Parlamentares aliados de Lula e outros integrantes da equipe de transição, como a deputada federal eleita Marina Silva (Rede-SP), se reuniram nesta terça-feira (29) com o presidente da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado, Acir Gurgacz (PDT-RO), para discutir o assunto.
Participaram representantes das áreas da saúde, da agricultura e do meio ambiente da equipe de transição. O encontro aconteceu no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), em Brasília, onde está instalada a força-tarefa do presidente eleito.
A intenção de Gurgacz era tentar um acordo sobre o texto, que originalmente foi apresentado em 1999 no Congresso e sofre forte resistência da atual oposição. No entanto, ele afirmou à CNN que não houve um consenso para votar o texto na Comissão de Agricultura e, por isso, cancelou a reunião do colegiado marcada para esta quarta (30).
A análise do projeto vem sofrendo sucessivos adiamentos. Mas o presidente da comissão disse que tentará colocar o projeto em votação de novo na semana que vem. Enquanto isso, os aliados de Lula apostam que o projeto não será mais votado nesta legislatura.
Há um entendimento de que o texto conseguiria ser aprovado no colegiado mesmo sem o apoio da oposição. Gurgacz declarou à reportagem, porém, que o projeto trata sobre “uma questão importante para o Brasil, independentemente do governo”, e que não vota projetos sem acordo. “Não adianta passar brigando, discutindo”, disse.
O objetivo do texto atual do projeto de lei no Senado, segundo seus defensores, é agilizar a análise de pedidos de registros e a comercialização de agrotóxicos e demais pesticidas no país. A pauta é uma das prioridades da Frente Parlamentar da Agropecuária no Congresso.
Parte dos parlamentares reclama que o processo completo hoje é demorado, costuma levar anos, e, ao final, faz com que produtos cheguem desatualizados no mercado.
O texto estabelece, por exemplo, prazos para a conclusão dos pleitos de registro e suas alterações, contados da sua submissão. No caso de produto novo formulado ou técnico, seria de 24 meses; de produto formulado, produto genérico e produto para a agricultura orgânica, seria de 12 meses. Já os pleitos de Registro Especial Temporário teriam o prazo de 30 dias para a conclusão das análises.
Essas nomenclaturas são solicitações, fórmulas e tipos de produtos de agrotóxicos utilizados pela indústria e por pesquisadores da área. Para defensores do projeto, o texto pode ajudar no crescimento do agronegócio e impulsionar o setor ao desburocratizá-lo. Também, que pode baratear preços ao agilizar a aprovação de genéricos, em formato semelhante relativo a medicamentos em vigor.
Alegam que o projeto prevê que “as condições a serem observadas para a autorização de uso de pesticidas, de produtos de controle ambiental e afins deverão considerar os limites máximos de resíduos estabelecidos nas monografias de ingrediente ativo publicadas pelo órgão federal responsável pelo setor da saúde”, entre outros critérios técnicos.
Críticos ao projeto argumentam que as novas regras devem facilitar a aprovação de agrotóxicos que trariam riscos ao meio ambiente e maior propensão a causar doenças crônicas, como câncer, mutação, toxicidade reprodutiva, desregulação hormonal e malformação fetal.
Senadores contrários ao texto não querem a determinação de prazos, pois apontam para a possibilidade de registros automáticos se não houver uma deliberação conclusiva após o fim dos limites de tempo propostos, assim como não querem uma maior predominância do Ministério da Agricultura sobre o assunto.
Avaliam que o texto vai diminuir o poder decisório da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
“De acordo com a legislação vigente, três entidades federais devem atuar nesse processo: o Ministério da Agricultura (quanto à eficiência agronômica), a Anvisa (quanto ao impacto para a saúde) e o Ibama (quanto aos impactos ao meio ambiente).
Nos termos do PL 1459/2022, Ibama e Anvisa poderão apenas avaliar ou homologar avaliações, perdendo poder de regulamentação, que ficará restrito ao ministério”, diz documento com pontos críticos elaborado por aliados de Lula, ao qual a CNN obteve acesso.
Outro ponto diz que o projeto deve reduzir a possibilidade de estados e o Distrito Federal estabelecerem restrições à “distribuição, comercialização e uso de produtos devidamente registrados ou autorizados, salvo quando as condições locais determinarem, desde que comprovadas cientificamente”.
A medida ainda pode ser considerada inconstitucional “por adentrar em competência legislativa de estados e municípios”, avaliam opositores.
Mais um trecho polêmico diz respeito à dispensa de registro no órgão responsável para pesticidas, produtos de controle ambiental e afins destinados exclusivamente à exportação. O registro seria substituído por um comunicado de produção para a exportação.
Esses produtos, ainda quando exclusivos para exportação, também estarão isentos da apresentação dos estudos agronômicos, toxicológicos e ambientais, observada a legislação de transporte de produtos químicos, pelo texto em tramitação.
Há parlamentares que defendem que o projeto também seja analisado pela Comissão de Assuntos Sociais do Senado antes de seguir ao plenário da Casa.
A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), uma das principais parlamentares à frente do assunto no grupo de Lula, considerou um avanço a retirada do projeto de pauta para essa semana.
“O projeto precisa ser substituído por uma proposta que seja, naturalmente, inovadora, moderna, mas que não degrade o meio ambiente, não flexibilize, não faça um libera-geral e que não aumente na forma como está proposto uma liberação tão ampla de agrotóxicos no Brasil”, declarou.
Na sua avaliação, é preciso melhorar a gestão do atual processo. “Estamos no momento de um novo governo e se propõe a reconstruir a política ambiental brasileira. Então, precisamos estar focados nisso e dar essa oportunidade.”