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    Térmicas movidas a lixo podem ajudar Brasil a reduzir emissões de metano

    Estudo mostra que uma usina a cada região metropolitana com um milhão de habitantes pode fazer fonte gerar 3% da energia brasileira

    Termoverde Caieiras, termelétrica movida a biogás de aterro sanitário na cidade de Caieiras, na Grande São Paulo
    Termoverde Caieiras, termelétrica movida a biogás de aterro sanitário na cidade de Caieiras, na Grande São Paulo Armando Jr.

    Stéfano Sallesda CNN

    Rio de Janeiro

    Conhecidas como termelétricas movidas a lixo, as Unidades de Recuperação Energética (URE) podem ajudar o Brasil a cumprir a meta de reduzir em 30% as emissões de metano, compromisso assumido pelo país na COP 26, que ocorre em Glasgow, na Escócia.

    Elas trabalham com material não reciclável e o setor enfrenta um momento de entusiasmo, depois de, em setembro, uma unidade deste tipo ter saído vencedora de um leilão de eletricidade promovido pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

    A unidade ficará em Barueri, Região Metropolitana de São Paulo, e será a primeira do gênero na América Latina. A previsão é de que comece a operar em 2026.

    A medida abre caminho para a transformação de um passivo ambiental em um ativo: o tratamento de resíduos não recicláveis que se acumulam nos aterros sanitários, que passariam a gerar produção de eletricidade.

    Os resíduos sólidos são responsáveis por entre 3% e 5% das emissões totais de gases de efeito estufa.

    As hidrelétricas produzem energia de forma sustentável / Caio Coronel/Itaipu Binacional

    A Usina de Recuperação Energética (URE) de Barueri terá 20 megawatts de capacidade instalada, o suficiente para abastecer 200 mil habitantes, a partir da incineração de 825 toneladas de resíduos sólidos por dia.

    Assim como em Barueri, outros dois projetos brasileiros de geração de energia nessa modalidade estão em estágio mais avançado e apresentam licença ambiental para instalação. Dependem agora de apresentação e aprovação em leilões, para obtenção de financiamento.

    Elas ficam em Mauá, na Região Metropolitana de São Paulo, e no Caju, Região Central da cidade do Rio de Janeiro.

    A unidade paulista pretende ser a maior do país, com capacidade instalada quatro vezes maior que a de Barueri. Já a carioca, fruto de uma parceria público-privada da Prefeitura do Rio de Janeiro e a Ciclus Ambiental, concessionária municipal de resíduos sólidos, pretende gerar 31 MW a partir de 1,3 milhão de toneladas diárias de resíduos.

    Um estudo da Associação Brasileira de Recuperação Energética de Resíduos (Abren) aponta que seria possível instalar pelo menos uma URE em cada uma das 28 regiões metropolitanas com mais de um milhão de habitantes.

    Juntas, elas seriam capazes de produzir o equivalente a 3% da energia brasileira. Esse número é encarado pela entidade com uma fração do potencial da fonte, mas a tornaria mais presente que a solar (2,6%) e a nuclear (1,2%) na matriz energética brasileira.

    Presidente da Abren, o advogado Yuri Schmitke destaca os benefícios ambientais gerados por essa modalidade de geração de eletricidade.

    Nós resolvemos dois problemas, transformando o lixo, que é um passivo ambiental, em eletricidade, uma demanda social. As UREs não utilizam o material reciclável. Ele é separado antes de ir para a incineração, que é feita com uma tecnologia muito avançada e cara, pela qual a emissão de qualquer poluente é quase zero.

    Yuri Schmitke, presidente da Abren

    O último relatório do Painel Internacional de Mudanças Climáticas das Nações Unidas (IPCC) apontou pela primeira vez para a necessidade de controlar outro gás para conter os efeitos da crise climática. De acordo com a publicação, o metano tem poder de aquecimento até 80 vezes maior que o do carbono.

    A decomposição do lixo é uma das principais produtoras de metano, que contamina solos lençóis freáticos.

    Aterro Sanitário Seropédica, no Rio de Janeiro / CTR Seropédica

    “As térmicas movidas a resíduos sólidos resolvem o problema da emissão do metano, que é muito mais danoso. Nosso estudo sobre utilização do lixo para geração de energia leva em conta também que ele pode ser destinado a outras necessidades, como o combustível derivado de resíduos, destinado à indústria cimenteira”, conclui Schmitke.

    Ex-ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc destaca que o fim dos lixões e o uso de aterros sanitários resolve apenas uma parcela do passivo ambiental, e utiliza exemplos do Rio de Janeiro para ilustrar o cenário.

    Trocar os lixões por aterros sanitários é passar do século XIX para o século XX. Entrar no século XXI é usar o lixo para a geração de energia.

    Carlos Minc, ex-ministro do Meio Ambiente

    “As UREs podem contribuir bastante para reduzir as emissões de metano. No Rio, eliminamos todos os lixões, não restou um que seja. Mas o metano continua lá, porque esses lugares abrigaram lixo de milhões por décadas. Esses lugares mereciam ao menos uma usina de biogás, para tirar o metano do solo e evitar contaminações”, avalia.

    Desafio de custos

    A energia gerada por meio de resíduos sólidos é mais cara que a fornecida por forças da natureza, como hidráulica, eólica ou solar. Parte deste custo se deve ao manejo do lixo e a necessidade de tratá-lo.

    O leilão de setembro foi o primeiro que incluiu a possibilidade de compra de energia gerada por essa fonte. A compra saiu a R$ 549 megawatts hora (MWh), um valor bem próximo ao praticado pela GNA-1, movida a gás natural, inaugurada no mesmo mês, em São João da Barra, no Norte Fluminense.

    Como concessionária de lixo no Rio de Janeiro até 2035, a Ciclus Ambiental é operadora do Aterro Sanitário de Seropédica, na Região Metropolitana. A unidade realiza captação de metano e seus indicadores revertem para a capital do estado, por ser o destino de seus resíduos. Esse tratamento contribuiu para que a cidade reduzisse suas emissões de gases de efeito estufa em um momento no qual esse índice aumentou em todo o país.

    O estudo da Abren aponta que o volume de lixo do Aterro Sanitário de Seropédica seria suficiente para alimentar mais cinco usinas além desta anunciada pela Ciclus no Caju, por meio de uma parceria público-privada com a Prefeitura do Rio.

    Presidente da empresa, Adriana Felipetto concorda, destaca que a companhia tem planos de concorrer em leilões deste tipo em 2022 e que planeja mais plantes parecidos.

    Usina de Energia Eólica
    A energia eólica também é uma alternativa sustentável, mas, assim como as termelétricas movidas a lixo, representam um alto custo / Miguel Ângelo/CNI

    “Pensamos nisto, mas precisamos primeiro viabilizar a primeira. As UREs tratam o lixo e geram energia, fazem dois serviços em um. Assim, o custo de geração é mais alto, até porque o resíduo sólido é heterogêneo e demanda um sistema de tratamento de gases muito complexo. Essa tecnologia não existe no Brasil e a vitória da primeira usina deste tipo em um leilão deve desenvolver toda uma cadeia de fornecedores que tende a reduzir os custos. Para expandir essa ação, precisamos de leilões em que essas usinas concorram apenas entre si. Se concorrermos com outras fontes, não seremos competitivas”, explica.

    Além dos três projetos já licenciados, o Brasil tem ainda outras três UREs planejadas; Baixada Santista (45MW), Consimares (17MW) e Diadema (15 MW), todas no estado de São Paulo.