Cremers determina interdição do ensino de medicina em hospital no RS

O Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul (Cremers) determinou a interdição, nesta quarta-feira (30), do ensino de disciplinas especificamente médicas aos alunos do curso de graduação em Medicina da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra) no Hospital Universitário de Canoas, Região Metropolitana de Porto Alegre.
Segundo o Cremers, a decisão não afeta o atendimento médico à população.
A medida do Conselho veio após uma fiscalização que observou a falta de contrato formal entre o HU e a Ulbra. Além disso, segundo o Cremers, os professores não têm contrato assistencial para atuar no hospital.
Segundo o Conselho, a interdição permanecerá até que seja recebida a documentação comprovando a regularização dos contratos. “Se algum médico descumprir a determinação do Cremers, incorrera em ilícito ético”, disse em nota o presidente do Cremers, Eduardo Neubarth Trindade.
Por outro lado, em nota, a Ulbra disse que “o CREMERS não detém competência legal para suspender ou interditar atividades educacionais de qualquer curso de graduação, função essa que pertence exclusivamente ao Ministério da Educação”. Diz também que “a nota e o auto expedido pelo Cremers não possuem qualquer eficácia jurídica para interferir nas atividades pedagógicas da Ulbra Canoas” e que “as atividades acadêmicas, incluindo estágios supervisionados, seguem integralmente mantidas e conforme os regulamentos educacionais e sanitários vigentes.”
A fiscalização do Cremers teria ocorrido após denúncias de estudantes ao Conselho e ao Ministério Público (MP). Os alunos teriam mencionado uma estrutura precária, superlotação nos estágios e falta de aulas básicas. A Ulbra tirou nota 2 de 5 no último Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE). Foi a pior nota entre as 19 instituições gaúchas de ensino de medicina avaliadas.
Confira na íntegra a nota da Universidade Luterana do Brasil:
A Universidade Luterana do Brasil – Ulbra Canoas/RS, por meio de sua consultoria jurídica e de sua mantenedora AELBRA, vem a público repudiar o conteúdo e a forma do chamado Auto de Interdição do Ensino Médico 01/2025/RS, expedido pelo Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul (CREMERS), e esclarecer quanto à sua absoluta ilegitimidade jurídica e administrativa.
1. O CREMERS não detém competência legal para suspender ou interditar atividades educacionais de qualquer curso de graduação, função essa que pertence exclusivamente ao Ministério da Educação, conforme a Constituição Federal (art. 209 e 211) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei no 9.394/1996). Qualquer ingerência do CREMERS nessa seara constitui violação à autonomia universitária, garantida constitucionalmente.
2. O alegado “procedimento administrativo” mencionado pelo CREMERS é unilateral, ausente de contraditório e ampla defesa. A Universidade não foi previamente notificada, nem teve a oportunidade de manifestação, sendo surpreendida por uma medida divulgada diretamente à imprensa, sem respaldo técnico, jurídico ou ético.
3. A nota e o auto expedido pelo CREMERS não possuem qualquer eficácia jurídica para interferir nas atividades pedagógicas da Ulbra Canoas, nem para coagir docentes, alunos ou pacientes. O uso da autoridade pública para fins intimidatórios, sem base legal ou respaldo judicial, configura, em tese, ilícitos administrativos e penais, que serão devidamente apurados nas esferas competentes.
4. O Curso de Medicina da Ulbra Canoas segue autorizado e reconhecido pelo MEC, com infraestrutura adequada, corpo docente qualificado e campo de práticas regularmente estabelecido. As atividades acadêmicas, incluindo estágios supervisionados, seguem integralmente mantidas e conforme os regulamentos educacionais e sanitários vigentes.
5. Há mais de 20 anos, a Ulbra mantém convênio regular com a Prefeitura de Canoas e com o Hospital Universitário para as práticas de ensino, o que garante a continuidade das atividades acadêmicas de forma segura e legal.
6. Conclamamos toda a comunidade acadêmica a manter a serenidade e a continuidade das atividades programadas, desconsiderando a nota divulgada pelo CREMERS. Qualquer tentativa de intimidação será enfrentada com firmeza, pela via legal e institucional, em defesa dos direitos dos nossos estudantes, professores e da sociedade.
A Universidade reafirma seu compromisso com a ética, com a excelência do ensino médico e com a saúde pública, e continuará promovendo a formação de profissionais qualificados, comprometidos com o bem-estar da população brasileira.
O Sindicato Médico do Rio Grande do Sul emitiu uma nota sobre a interdição. Confira na íntegra:
O Simers recebe com atenção e seriedade a decisão do Cremers de interditar o ensino médico da Faculdade de Medicina da Ulbra no Hospital Universitário de Canoas. O Sindicato vem defendendo, por incontáveis vezes, a formação de qualidade para novos médicos, e vem se posicionando de forma contrária à abertura indiscriminada de novas vagas e escolas. Portanto, neste momento, anunciamos algumas medidas a serem tomadas pelo Sindicato:
1) ação judicial imediata para que a Ulbra comprove que tem condições de fornecer aulas práticas de medicina, conforme determina a legislação.
2) ação trabalhista coletiva para os médicos serem desobrigados a cumprir atividades de ensino no Hospital Universitário enquanto a Ulbra não comprovar condições.
3) reenvio de ofício ao Ministério da Educação solicitando fiscalização imediata na Faculdade de Medicina da Ulbra.
4) comunicação ao Ministério Público Estadual pedindo providências sobre a situação.
5) envio de notificação ao Procon RS para averiguação sobre os direitos dos universitários.
6) solicitação de acesso aos campos de prática da Ulbra pelos diretores do Simers para que possam averiguar a situação no local.
7) instalação de uma Comissão Especial contra a abertura de novas escolas de medicina para acompanhar de perto as mobilizações neste sentido.
8) apoio jurídico para os estudantes do curso por meio do Núcleo Acadêmico do Simers (NAS).
O assunto é extremamente delicado e exige um posicionamento rápido de todos os entes envolvidos. E que seja apurado quem são os verdadeiros responsáveis pela situação ter chegado a este ponto. O Simers defende e sempre defenderá a atuação médica ética e de qualidade e a formação digna dos estudantes de Medicina.