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    Relatando ameaças, amigos de Moïse Kabagambe deixam o Brasil

    Para Anistia Internacional, grau de risco dos congoloses era "alto"; ao menos 15 pessoas afirmam sofrer perseguições, mas, por medo, não procuraram a polícia

    Leandro Resendeda CNN

    Na última quinta-feira (21), Chadrac Kembilu, primo e amigo de Moïse Kabagambe — congolês de 24 anos que foi espancado até a morte em um quiosque na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, no dia 24 de janeiro –, precisou fugir do país por estar sofrendo ameaças.

    Além de Chadrac, que se tornou um rosto conhecido por expor sua indignação em vídeos que se tornaram virais, outros amigos de Moïse, que chegaram a depor à Polícia Civil nas investigações do caso também relataram medo e deixaram o Brasil. Entre os destinos, países na América do Norte e na Europa.

    Em contato com os congoleses que deixaram ou ainda estão no Brasil, a reportagem conseguiu contabilizar pelo menos 15 casos que relatam perseguições e ameaças em suas redes sociais. Por medo, não procuraram a polícia.

    Essa é a segunda vez na vida que Chadrac precisou mudar de país com medo da guerra. A que conheceu na sua terra natal, a República Democrática do Congo, tinha o barulho de metralhadoras disparar por conflitos que vem desde antes de seu nascimento. Veio para o Rio de Janeiro buscando uma vida melhor, mas após reagir e expor a brutalidade da morte do amigo, relata estar vivendo sob um terror constante.

    Em conversa com a CNN na última semana, Chadrac denunciou que as ameaças acontecem através de mensagens e ligações, perseguições que lhe tiraram do país junto de outros compatriotas.

    Para a Anistia Internacional, de acordo com documento obtido pela CNN, o grau de risco dos congoloses era “alto” e uma série de restrições de mobilidade e uso de redes sociais foi recomendado. Mesmo assim, não houve forma deles se sentirem seguros.

    A CNN entrou em contato com a assessoria de imprensa da Polícia Civil e aguarda resposta.

    Chadrac se tornou um dos rostos mais conhecidos após a morte de Moïse. No dia 05 de fevereiro, ele participou de um ato convocado por várias entidades do movimento negro que pediu justiça pelo congolês em frente ao quiosque onde ele foi morto.

    Chadrac morava em um condomínio de prédios controlado por criminosos na Zona Norte do Rio, parte do programa “Minha Casa, Minha Vida”. Depois de dar entrevistas e cobrar justiça pela morte do primo e amigo, foi expulso do local e passou a ser ameaçado de morte nas redes sociais, pelo telefone e em constantes perseguições.

    Com o apoio da Anistia e de amigos, Chadrac percorreu bairros do Rio até procurar o Instituto de Pesquisas das Culturas Negras (IPCN), que realizou uma campanha de financiamento coletivo para ajudá-lo a sair do país no dia 21 deste mês.

    Pascoal Nascimento, procurador do IPCN e advogado de Chadrac, diz que a saída dos amigos de Moïse é emblemático.

    “Tudo isso serve para mostrar que o Brasil está longe de ser o país acolhedor que achamos. Pode até acolher imigrantes de outros continentes, mas isso não acontece com os que vem da África”, afirmou.

    Como uma compensação à família de Moïse, após o crime que repercutiu no mundo todo, a Prefeitura do Rio decidiu conceder o quiosque, em ato formalizado em cerimônia com o prefeito Eduardo Paes (PSD) no dia 7 de fevereiro. Na mesma semana, a CNN mostrou que ameaças de pessoas que seriam ligadas aos donos do quiosque motivaram a desistência dos parentes do congolês.

    Faixa com a foto de Moïse Kabagambe foi presa ao quiosque onde o rapaz foi assassinado / Isabelle Saleme/CNN

    Um dos amigos mais próximos de Moïse que chegou a trabalhar com ele na praia da Barra da Tijuca relatou ter sido perseguido por carros perto de sua casa, na época da oferta, além de muitas ameaças em seu Facebook e Instagram. “Não coloquem as pernas no quiosque, vocês vão ver o que vai acontecer”, dizia uma delas.

    “Foram muitas coisas assustadoras, ameaças perto de casa, éramos parados nas rua. Precisei sair do Brasil ainda no mês de março”, relatou. A reportagem preservou o nome do amigo de Moïse a seu pedido.

    Parentes e amigos de Moïse conseguiram, com a ajuda de instituições que atuam na promoção de direitos humanos e organizações do movimento negro, deixar o país para destinos variados. “Saí com outras três pessoas de Madureira, um mês depois do caso ficar conhecido. Precisava sair rápido, era a minha vida”, disse um deles.

    Recomeço previsto para o mês que vem

    Está prevista para maio a inauguração do quiosque Moïse, no Parque Madureira, na Zona Norte do Rio. O espaço foi cedido pela prefeitura do Rio em uma área distante de onde ocorrera a morte do congolês e mais próximo de onde vive sua família, que hoje vive do auxílio prestado por organizações sociais.

    O local terá 150 metros quadrados, capacidade para 80 pessoas e foi idealizado pela Orla Rio em parceria com a Secretaria Municipal de Fazenda do Rio. A ideia é que o espaço se torne um polo da cultura congolesa no Rio.

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