Quem é Rogerio de Andrade, bicheiro preso por homicídio no RJ
Sobrinho de Castor de Andrade, Rogério assumiu os negócios da família após disputa violenta
Uma das figuras mais conhecidas da contravenção, Rogério de Andrade foi preso no Rio de Janeiro, na manhã desta terça-feira (29).
O bicheiro é acusado pelo homicídio qualificado de outro contraventor, Fernando Iggnácio, ocorrido em novembro de 2020. Ele foi assassinado a tiros em um heliponto na zona oeste do Rio de Janeiro.
O mandado de prisão contra Rogério foi cumprido pelo Grupo de Atuação Especializada de Combate ao Crime Organizado do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (GAECO/MPRJ). Ele foi detido em sua casa, na Barra da Tijuca.
O MPRJ havia denunciado o bicheiro pelo crime em março de 2021. O contraventor já havia sido alvo de outra operação do órgão contra um grupo de extermínio envolvido com o jogo do bicho no último dia 9 de outubro.
Entre os alvos estavam ex-policiais e policiais militares ligados ao bicheiro e a Flávio da Silva Santos, presidente da escola de samba Mocidade Independente de Padre Miguel.
Sobrinho de Castor de Andrade, considerado o primeiro bicheiro a ficar famoso no Rio, Rogério de Andrade assumiu os negócios da família após a morte do tio, em 1997. A sucessão só foi definida após uma disputa violenta pelo poder.
Rogério, que era braço direito de Castor, deveria dividir a herança e a administração dos negócios ilegais com o filho do bicheiro, Paulo Roberto de Andrade, e com o ex-cunhado, Fernando Iggnácio.
Paulinho de Andrade, como era conhecido o filho de Castor, foi morto a tiros em 1998, enquanto saía de uma empresa dele na Barra da Tijuca.
Desde os homicídios dos parentes, Rogério de Andrade passou a ser o único herdeiro do império de Castor, que inclui diversas empresas, escola de samba e exploração do jogo do bicho, com máquinas caça-níqueis, bingos e cassinos em toda a zona oeste do Rio de Janeiro.
Desde a década de 1970, foi criada uma espécie de divisão de territórios para apaziguar os conflitos entre os bicheiros da chamada “velha cúpula”, como Castor de Andrade. Deu certo por um tempo. No entanto, as novas gerações passaram a entrar em conflitos novamente pelos pontos e principalmente pelo controle das máquinas caça-níqueis.
Há alguns anos, Rogério vive uma guerra declarada contra Bernardo Bello, outro bicheiro que herdou o controle de uma região após disputas familiares. Além disso, essa nova cúpula do bicho tem outros nomes, como Adilson Coutinho Oliveira Filho, o Adilsinho, herdeiro de uma família de bicheiros da Baixada Fluminense, e Vinicius Drumond, filho de Luizinho Drumond, morto em 2020, que controlava pontos de jogo na zona da Leopoldina.
Na disputa violenta por pontos de jogo, Rogério de Andrade foi um dos alvos. Em um atentado, em 2010, explosivos foram colocados dentro do carro em que o bicheiro estava. O filho do contraventor, Diogo de Andrade, que dirigia o veículo, não sobreviveu. Rogério teve ferimentos no rosto.
Samba e contravenção
Assim como outros importantes líderes do jogo do bicho no Rio de Janeiro, Castor de Andrade tinha uma ligação intensa com o Carnaval do Rio. Ele foi um dos criadores da Liga Independente das Escolas de Samba, a Liesa, e investiu muito dinheiro na Mocidade Independente de Padre Miguel, escola de Bangu da qual foi presidente de honra.
Rogério seguiu os passos do tio também no mundo do samba. Atualmente, o contraventor é patrono da agremiação e sua mulher, Fabíola de Andrade, é a rainha de bateria da escola.
No Carnaval deste ano, Rogério não esteve presente na Sapucaí porque não conseguiu autorização judicial. Na época, ele cumpria prisão domiciliar, com uso de tornozeleira eletrônica, e não podia sair de casa entre 20h e 6h.
Pelas redes sociais, torcedores da Mocidade especularam se Rogério teria ido à Sapucaí vestido de Castor — o mascote da agremiação é o animal, justamente em homenagem à Castor de Andrade.
Meses após o desfile, Rogério publicou em sua conta do Instagram uma foto do mascote com Fábiola, durante o desfile, e a legenda “Será?”.
Rogério foi preso em agosto de 2022 no âmbito da Operação Calígula, deflagrada pela Polícia Federal para combater uma organização criminosa que opera jogos de azar no Rio. Segundo as investigações, a organização é comandada por Rogério e por seu filho, Gustavo Andrade.
Em abril deste ano, uma decisão do ministro Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF), derrubou as medidas cautelares que estavam vigentes contra Rogério, como o uso da tornozeleira eletrônica e obrigações em horários noturnos.
Grupo de extermínio e rede de policiais seguranças
Durante a operação da Polícia Federal em que Rogério de Andrade foi preso, foi apreendida em uma casa do bicheiro, num condomínio de Petrópolis, uma lista de pagamento de propinas a policiais. A apreensão levou a outra operação, deflagrada pelo Ministério Público do Rio, contra diversos policiais que prestavam serviços ao bicheiro.
De acordo com uma denúncia apresentada pelo Ministério Público do Rio à Justiça em março deste ano, o bicheiro chegava a gastar mais de R$ 207 mil por mês com 36 seguranças particulares. Os salários variavam entre R$ 5,6 mil e R$ 7,6 mil, valores compatíveis com a remuneração de soldado e oficial da Polícia Militar do Rio de Janeiro.
Na ocasião, 17 policiais foram presos acusados de trabalharem na segurança particular do bicheiro. O MP denunciou, ao todo, 31 pessoas da organização criminosa, mas conseguiu na Justiça a expedição de mandados de prisão para 18 policiais militares da ativa, um reformado e um policial penal.
A denúncia enviada à Justiça aponta que, mesmo durante o período em que o bicheiro estava foragido, os policiais eram pagos e realizavam missões, rondas e abordagens para garantir a livre circulação do contraventor.
Além disso, os seguranças atuavam em territórios em disputa pelo domínio do bicho, monitoravam veículos que circulavam perto da casa de Andrade e organizavam operações forjadas de combate aos jogos de azar, na tentativa de disfarçar a ligação com o bicheiro.
Na operação deflagrada nesta quarta (9), a polícia cumpre quatro mandados de prisão contra os ex-policiais militares Thiago Soares Andrade Silva, Anderson de Oliveira Reis Viana, Rodrigo de Oliveira Andrade de Souza e o PM Bruno Marques da Silva, que são acusadas pelo homicídio qualificado de Fábio Romualdo Mendes.
A denúncia aponta que o crime teria sido motivado por disputa por áreas dominadas por Rogério de Andrade.
O grupo de policiais que trabalha para Rogério de Andrade é suspeito de cometer diversos assassinatos em nome do bicheiro, operando como um grupo de extermínio, em nome da disputa pelo domínio da exploração de jogos de azar em diversos bairros do Rio.