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    Quem é a delegada da PF que investiga crimes há 44 anos no Brasil

    Evangelina Cariné é a investigadora mais antiga em atividade no país e concedeu entrevista exclusiva à CNN

    Elijonas Maiada CNN , Brasília

    Apaixonada pela profissão e com uma bolsa cheia de diplomas, certificados, medalhas, fotos e histórias da carreira de delegada de Polícia Federal. Foi assim que Evangelina Cariné concedeu uma entrevista exclusiva à CNN, na sede da PF, em Brasília.

    A investigadora ficou sabendo pela reportagem que é a delegada mais antiga em atividade na PF atualmente. E, sorrindo, brincou: “Tomei um susto quando descobri. Fui deixada pelas minhas amigas que aposentaram”.

    A delegada entrou na PF em 1979, aos 18 anos, e passados 44 anos nem pensa em “pendurar o distintivo”. Pelo menos não tão cedo.

    “Eu gosto tanto do que eu faço que nem vi o tempo passar”, declarou.

    Em entrevista à CNN, a delegada paraense lembra casos de racismo que sofreu no começo da carreira, a experiência como adida da PF no Suriname e o apego pela Corregedoria, setor que apura procedimentos administrativos internos de servidores. Confira:

    Quem é a delegada Evangelina Cariné?
    Nasci em Belém do Pará, tomei posse em 19 de dezembro de 1979 como escrivã de Polícia Federal, em São Borja (RS), fronteira com Santo Tomé, na Argentina.

    É natural novos delegados começarem nas fronteiras, né?
    Sim, acho isso muito inteligente. Pois as novas turmas vão substituir os que ali estão e esses que já pagaram seu pedágio têm a oportunidade de vir crescendo, subindo, até chegar nas capitais.

    Por onde a senhora já passou pelo Brasil?
    Do Rio Grande do Sul eu tentei voltar para Belém, de onde sou. Mas não havia disponibilidade de vaga, então me ofereceram outras opções e aceitei em Natal (RN). Lá, me adaptei, cidade de praia e tal, e lá fiz curso de Direito, aguardando o concurso para delegada. Enquanto isso, fiz concurso pro TRT, TJRN, MPF, passei, mas não quis sair da PF. Quando surgiu o concurso de delegada, fiz e passei.

    Ficou quanto tempo em Natal?
    Saí em 2006. Fiquei muito tempo lá. Foi o local onde mais tempo fiquei. Lá, passei pela Delinst (Direitos Humanos E Defesa Institucional), Delearm (Repressão ao Tráfico Ilícito de Armas), Delepat (Repressão a Crimes Contra o Patrimônio), inclusive sendo a primeira chefe da Delepat no RN.

    Que histórias emblemáticas destacaria na sua carreira?
    Tenho várias histórias, mas ainda estou na ativa (risos) e não posso contar a maioria. Mas eu tive algumas situações, digamos, ‘chatas’ porque, você vê [aponta para a pele], eu sou uma delegada negra. No Rio Grande do Norte tive algumas situações ruins, mas que eu consegui driblá-las.

    Esses casos de racismo aconteceram mais de uma vez?
    No Rio Grande do Norte mais de uma vez.

    Como foram os casos?
    Uma vez um cidadão, um grande empresário de lá, tratou mal uma servidora do Ministério do Trabalho que fazia uma fiscalização de não-pagamento de 13º salário, aí os seguranças dele jogaram a moça na calçada.

    Ela ligou para a PF, foi uma equipe socorrer e o empresário respondeu ao inquérito.

    Mas depois de muitas tentativas, ele foi na delegacia da PF, abriu a porta para entrar no meu gabinete e voltou com o advogado dele, e lá no corredor ele esbravejava: “não entro! A delegada é aquela do terno bege? É uma negra!”

    Ele não disse na minha frente, aí esperei ele entrar após ser convencido pelo advogado, e eu disse: se o senhor repetir o que disse lá fora eu lhe dou voz de prisão. Está me desacatando, estou no desempenho das minhas atividades.

    Mas acabou. Superei isso muito bem.

    Não só esse, no interior do estado também outros casos. Comentários como “Nossa, mas essa que é a delegada?”

    Eu respondi: “Sim, sou eu, como vai o senhor?”.

    Mas não vou ficar chorando pitangas por isso. Tenho pena de quem ainda pensa dessa forma. Não vai ser agora que esse preconceito vai ser eliminado. Ainda temos alguns anos pela frente.

    Já prendeu alguém por racismo?
    Não.

    Isso só mostra que não é fácil a vida de delegada, né? Não é como nas novelas.
    É muito diferente. A PF não trata de crime contra a vida (é com a Civil), exceto quando se trata de servidor público federal no desempenho ou em razão de suas atribuições.

    Uma vez me comentaram uma novela que a moça era delegada federal. As atribuições eram bem diferentes da realidade.

    Mas muitas jovens me procuram e eu dou o maior estímulo, porque é um trabalho sério. A PF é uma polícia de Estado, não de governo, e ela te dá uma estabilidade e você fica muito bem porque você sabe que está fazendo a coisa certa em benefício da população. Você se sente bem.

    E esse amor pela Corregedoria?
    No RN, eu substituía a corregedoria, fiz curso de especialização na área na escola de magistratura do RN, e a partir daí comecei a presidir comissão de processos disciplinares.

    Ia e voltava [para Brasília], até que me convidaram para ficar no DF, mas não deu certo da primeira vez.

    Em 2006 deu certo e vim para a Corregedoria-Geral da PF para assumir o Serviço de Apoio Disciplinar, onde tem todos os processos e sindicâncias do país.

    Depois de três anos fui chefiar uma divisão, a DOIM, de logística.

    Depois, fui ser corregedora regional da Superintendência da PF no DF, em 2012.

    Eu amo Corregedoria, tenho muito carinho sempre que tenho a possibilidade. É empolgante, você tem que estudar bastante, o tempo todo, ler legislações novas. Você não pode se acomodar. É incrível como é interessante o trabalho.

    Como foi seu período de adida no Suriname?
    Eu assumi a Adidância junto à Embaixada do Brasil no Suriname. Foi uma experiência única.

    O adido é considerado um diplomata, não é que você vai lá trabalhar como policial. Não. O Suriname é um país estratégico.

    Ele faz fronteira com o Brasil, no platô Norte. Ali, vemos crimes transnacionais, tráficos de drogas, de armas, de pessoas. Então, faz-se tratativa, negociações, conversa. Recentemente, a PF fez, inclusive, um acordo entre os dois países. A PF fornece cursos.

    Como se sente depois de 44 anos na PF?
    Me sinto muito bem. E digo mais: eu gosto tanto do que faço que nem vi o tempo passar. Tomei um susto quando descobri que era a delegada mais antiga em atividade (risos).

    Eu tenho prazer no que faço e em aprender. Aqui sempre aprendo. Eu tenho orgulho em pertencer aos quadros da Polícia Federal todo esse tempo.

    Atualmente, a delegada trabalha na Coordenação-Geral de Repressão a Crimes Contra os Direitos Humanos (CGDH), na sede da PF, em Brasília.

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