Produção de energia por termelétricas cresce 77% em 2021, aponta estudo
Levantamento do Iema aponta que a participação da geração com combustíveis fósseis na matriz energética passou de 9%, em 2000, para 14% em 2020
O Brasil aumentou em 77% a geração de energia por meio de usinas termelétricas fósseis entre 2020 e 2021, segundo estudo divulgado nesta quinta-feira (30) pelo Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema).
Os dados foram publicados no Inventário de Emissões Atmosféricas em Usinas Termelétricas, documento que analisa o desempenho das unidades de serviço público que integram o Sistema Interligado Nacional (SIN), responsável por abastecer boa parte do país.
Em 2020, as 72 termelétricas fósseis conectadas ao SIN produziram 54,1 Terawatt-hora (TWh) de eletricidade. No ano seguinte, o número chegou a 96 TWh. De acordo com o Iema, o número de usinas em 2021 cresceu, mas o instituto não possui os dados precisos desse aumento.
A energia gerada nessas unidades subiu 177% entre 2000 e 2020. O número saltou de 30,6 TWh para 84,8 TWh neste período.
Na matriz energética nacional, a participação das fontes fósseis passou de 9% em 2000, para 14% em 2020. Para o pesquisador Felipe Barcellos, do Iema, o crescimento se dá, principalmente, por dois fatores: aumento da demanda por energia, que não foi acompanhada pela oferta, e as repetidas crises hídricas no país.
“O aumento do uso desses combustíveis é mais estrutural do que a crise hídrica do ano passado, por exemplo. Esse aumento tem acontecido de forma consistente por vários anos. Isso porque o território brasileiro já não tem mais espaço suficiente para comportar novas hidrelétricas, que respondem pela maior parte da energia gerada. As únicas áreas disponíveis são, principalmente, na Amazônia, e a instalação desses empreendimentos também traz diversos problemas ambientais”, afirma o pesquisador.
O estudo do Iema aponta que, nas duas últimas décadas, a geração total de energia elétrica no país cresceu 78%, enquanto a geração por meio da fonte hidráulica aumentou apenas 30%. Ainda de acordo com o instituto, desde o início dos anos 2000, há uma crescente diversificação das fontes para atender à evolução da demanda nacional.
Essa diversificação é marcada, principalmente, pela ampliação da participação de fontes renováveis não hídricas, como biomassa e eólica, e pela expansão do uso de combustíveis fósseis.
Aumento da emissão de gases de efeito estufa
O crescimento do uso de combustíveis fósseis vai na contramão dos objetivos do país de reduzir as emissões de gases de efeito estufa. Em 2021, a produção de energia por essas fontes foi responsável pela emissão do equivalente a 58 milhões de toneladas de CO². O número é 78% maior do que em 2020, quando foram 32,7 milhões de toneladas de CO² emitidas.
Segundo o pesquisador Felipe Barcellos, é necessário planejar a substituição desse tipo de usina por alternativas limpas, caso contrário, a mudança pode se tornar inviável.
“Como são grandes empreendimentos não dá para fazer do dia pra noite, mas se não pensarmos nisso de forma estrutural, a mudança não vai ser viável. Então o importante é perceber que estamos na contramão, aumentando ao invés de diminuir a emissão dos gases de efeito estufa, e começar a planejar como fazer essa conversão da matriz energética”, afirma Barcellos.
“Nós do instituto sabemos que essa transição também precisa ser justa, não podemos simplesmente fechar usinas. Temos que pensar nas pessoas que trabalham nesses locais e na importância econômica que essa energia tem hoje. Só que no geral, da ótica ambiental e inclusive econômica, o uso desses combustíveis é menos vantajoso. O Nordeste, por exemplo, que não tem carvão e usa outras fontes de energia, nos passa a impressão de que essas fontes não são completamente necessárias e podem, sim, serem substituídas”, avalia o pesquisador.
Outros impactos ambientais
De acordo com o Iema, além das emissões de gases de efeito estufa, essa categoria de geração resulta em uma série de outros problemas ambientais, como poluição atmosférica local e estresse hídrico, por conta da utilização de água para resfriamento de sistemas.
O pesquisador Felipe Barcellos sugere que esse tipo de impacto ambiental seja levado em conta no momento de licenciar as usinas fósseis.
“Nos critérios de licitação, entram o preço, em reais por megawatt hora, a viabilidade técnica, por exemplo, mas poderiam entrar também as emissões de gases de efeito estufa, de poluentes, e ainda o uso de água para resfriamento interno. Muitas usinas usam água doce de um rio próximo e depois essa água evapora e, não necessariamente, volta para a mesma bacia, o que pode gerar estresse hídrico. Então é preciso pensar de forma sistêmica, no local em que a usina está sendo instalada, e não apenas nas características dos estabelecimentos”, afirma o pesquisador.
Carvão mineral e gás natural
Nos últimos 20 anos, o combustível que apresentou maior crescimento entre as fontes de energia fóssil foi o gás natural, que saiu de um percentual de 8% em 2000, para 71% em 2020. Já o carvão mineral passou de 39% para 19% nesse mesmo período.
O pesquisador Felipe Barcellos aponta que, apesar da queda na participação entre os combustíveis fósseis, o uso do carvão mineral aumentou em termos absolutos. Segundo ele, a geração de energia por meio do carvão subiu de 7 TWh, em 2000, para 11 TWh, em 2020.
Segundo ele, na comparação com o carvão mineral, o gás natural gera menos gases de efeito estufa, mas ainda assim precisa ser substituído por fontes mais limpas.
Cada gás tem um fator de emissão, que é a quantidade de gases que ele gera ao produzir 1 unidade de energia. Então o gás natural emite 56 toneladas de CO² por 1 unidade de energia. Já o carvão emite cerca de 100 toneladas de CO² por 1 unidade de energia. Ou seja, é quase o dobro”, explica.
Dados apresentados pelo pesquisador apontam que o carvão mineral é responsável por 35% das emissões de CO² e entre os combustíveis fósseis. Já o gás natural responde por 59% das emissões.
Desafios e alternativas
Ainda segundo o especialista, um dos fatores que pode dificultar a transição energética é o fato de os contratos de licenciamento das usinas termelétricas preverem muitos anos de atuação, com objetivo de viabilizar os investimentos.
Ele explica que os avanços tecnológicos de outras fontes, como solar e eólica, acontecem em alta velocidade, mas ainda apresentam limitações em relação à capacidade de armazenamento.
“As baterias de energia solar, por exemplo, ainda não têm capacidade de armazenar grande quantidade de energia, então essa fonte fica muito dependente das condições climáticas. Assim, como a eólica, que depende da quantidade de vento”, explica o pesquisador.
Segundo ele, uma solução para a limitação é o chamado hidrogênio verde. Com a energia gerada pelo vento, por exemplo, é possível produzir o hidrogênio e, nos momentos em que não há mais vento, é possível gerar energia novamente, só que a partir do hidrogênio. De acordo com o pesquisador, a tecnologia ainda está em desenvolvimento.