Presença da PM em velório de criança morta gera tensão em SP
Tiro que matou Ryan da Silva Andrade Santos, de 4 anos, provavelmente partiu de policial, segundo a própria corporação
O enterro do menino Ryan da Silva Andrade Santos, de 4 anos, foi marcado por momentos de tensão com policiais militares em Santos, no litoral paulista. A criança morreu após ser atingida por um tiro na noite de terça-feira (5) durante um confronto entre PMs e suspeitos no Morro São Bento.
Durante o velório da criança, nesta quinta-feira (7), no Cemitério Municipal da Areia Branca, familiares e até o ouvidor das Polícias do Estado de São Paulo discutiram com agentes que estavam no local.
Segundo relatos das pessoas que acompanharam o sepultamento, policiais tentaram impedir o cortejo feito do Morro São Bento até o cemitério logo no começo da manhã. Depois, os agentes ficaram com viaturas na entrada do local do velório.
Em imagens publicadas nas redes sociais, é possível ver o ouvidor Claudio Aparecido da Silva e um grupo de pessoas discutindo com uma equipe da PM. Nas imagens, ele questiona os agentes sobre a presença da PM no cortejo e no cemitério e chama a ação de “desrespeito ao ato fúnebre”.
Após o ocorrido, em conversa com a imprensa, o ouvidor criticou a postura da PM. “É um absurdo o que estão fazendo. Aqui no estado de São Paulo virou política governamental colocar polícia em velório de gente que morre pela mão da polícia, intimidar as pessoas. É vergonhoso, é o cúmulo do desrespeito aos direitos fundamentais das pessoas. Ninguém tem mais direito de velar e se despedir de seus entes queridos?”
Em nota, a Secretaria de Segurança Pública (SSP) afirmou que analisará as denúncias citadas. “As ações de patrulhamento preventivo e ostensivo na região foram intensificadas desde a última terça-feira (5), com unidades do policiamento de área e de outros batalhões”.
Ação terminou com dois mortos
Segundo a Polícia Militar, três motos da Rocam patrulhavam a região do Morro São Bento na noite de terça-feira (5) quando perceberam uma movimentação estranha de dois homens que estavam em um automóvel. Ainda conforme a corporação, os suspeitos se uniram a um grupo de outros oito homens e começaram a atirar contra os policiais, que entraram em confronto com o grupo.
Uma viatura de reforço da PM chegou ao local e o confronto continuou. “Foram, ao menos, uma centena de disparos” disse o Coronel Émerson Massera, porta-voz da PM.
Ryan da Silva Andrade Santos estava brincando na frente de casa quando o confronto começou. Ele foi atingido por um tiro no abdômen. Além dele, uma mulher de 24 anos também foi atingida de raspão. Ela foi medicada e liberada do hospital. Ainda na ação, um suspeito de 17 anos foi morto e outro – de 15 anos – foi baleado e segue internado.
Logo depois da ocorrência, a Polícia Civil registrou dois boletins de ocorrência. A polícia diz que isso aconteceu pelo fato de que a notificação da morte do menino Ryan só aconteceu após o registro do primeiro boletim.
A PM afirmou que “provavelmente” o tiro que matou a criança partiu da arma de um policial.
Histórico de violência
Em 9 de fevereiro de 2024, Leonel Andrade Santos foi morto com um tiro de fuzil no Morro São Bento durante a Operação Verão, realizada em toda a Baixada Santista. Ele era pai de Ryan.
Em coletiva realizada após a ocorrência, a Polícia Militar afirmou que “lamenta” a morte da criança e que não iria “comentar as circunstâncias da morte de Leonel em um momento de luto por um jovem inocente”.
Porém, logo em seguida, o porta-voz da PM afirmou que o pai do menino era “atuante no crime da região” e que ele atirou contra os policiais na ação em que foi morto. “Ele usava muletas justamente por conta de um tiro que havia levado em um confronto anterior com a PM”, disse o Coronel Massera.
Policiais afastados
Os sete policiais envolvidos na ação de terça-feira foram afastados pela Polícia Militar do Estado de São Paulo. Eles foram encaminhados ao Programa de Acompanhamento e Apoio da Polícia Militar por estarem abalados com a morte da criança.
“Nós não estamos tratando esses policiais como culpados. Eles foram atacados, agredidos, e estão muito atingidos e comovidos com o resultado, que não era o desejado” declarou o porta-voz da corporação.
Após um período de acompanhamento psicológico, o comando da PM vai avaliar se os policiais devem – ou não – retomar o trabalho de campo.