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    Por unanimidade, STF diz que Rio deve criar plano para conter letalidade policial

    Governo do Rio de Janeiro agora tem 90 dias para apresentar projeto com medidas que irão orientar as operações policiais em comunidades do estado

    Neila GuimarãesVinícius Tadeuda CNN

    em Brasília e São Paulo

    Na retomada dos julgamentos no Supremo Tribunal Federal (STF) neste ano, o plenário da Corte concluiu, nesta quinta-feira (3), a análise da ação que trata de incursões policiais em comunidades do estado do Rio de Janeiro durante a pandemia da Covid-19. Por unanimidade, os ministros decidiram que o governo estadual deve criar um plano para conter a letalidade policial nas operações. 

    Em maio do ano passado, o relator, ministro Edson Fachin, apresentou 11 medidas para combater a letalidade policial no Rio, que vão de instalação de câmeras nas fardas dos policiais até a suspensão de sigilo das atuações policiais no estado. Os ministros, então, discutiram quais desses pontos seriam acatados.  

    Com o placar de 11 a 0, o Supremo decidiu por unanimidade pela adoção de algumas das medidas propostas por Fachin. Os ministros acompanharam em parte o voto do relator, divergindo de alguns dos itens. 

    Com isso, ficou decidido que o Rio de Janeiro deverá criar um plano para conter a letalidade policial e orientar as operações em comunidades do estado. O governo fluminense deve elaborar o projeto e enviá-lo para análise do Supremo em 90 dias.

    Entre os itens que encontraram convergência nos votos dos ministros estão a criação de um Observatório Judicial sobre Polícia Cidadã formado por representantes do STF, das polícias e da sociedade civil; a prioridade absoluta em investigações de incidentes que tenham crianças e adolescentes como vítimas; exigência de mandado ou existência de flagrante delito para buscas domiciliares e a obrigatoriedade de ambulâncias em operações previamente planejadas.

    No entanto, alguns pontos foram motivos de divergências na Corte, como a suspensão do sigilo de todos os protocolos de atuação policial; a instalação de GPS e sistemas de gravação de áudio e vídeo nas viaturas e fardas dos policiais e a competência do Ministério Público em caso de descumprimento de decisão do STF.

    A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635 foi apresentada pelo PSB, Defensoria Pública e entidades da sociedade civil. O tema central da ação diz respeito a esclarecimentos sobre a medida cautelar que restringiu a casos excepcionalíssimos as incursões policiais em favelas cariocas durante a pandemia. 

    O julgamento já havia começado em maio do ano passado, em plenário virtual, no entanto, foi interrompido após um pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes. A apreciação foi retomada no plenário físico em 15 de dezembro, mas foi suspensa pelo presidente da Suprema Corte, Luiz Fux. 

    Na tarde de quarta-feira (2), a maioria já havia sido formada após o voto do ministro Dias Toffoli. Devido ao horário, o julgamento foi suspenso e então retomado nesta quinta, quando todos os ministros terminaram de se pronunciar.

    Como votaram os ministros

    Relator do caso, Fachin foi a favor do recurso apresentado e defendeu a adoção das 11 medidas para a redução da letalidade policial.

    “Quando da instalação de equipamentos de GPS e de sistemas de gravação, complemento o voto, no sentido de determinar que seja dada prioridade à instalação desses equipamentos nas viaturas e fardas dos agentes empregados no policiamento e em operações em favelas e comunidades pobres”, declarou o ministro. 

    Segundo a votar, o ministro Alexandre de Moraes divergiu parcialmente do relator. No entanto, Moraes concordou que os critérios para atuação da polícia devem ser melhor definidos e acatou o parecer em alguns pontos, como o estabelecimento de um plano para a redução da letalidade policial, a necessidade de investigação de incidentes em que as vítimas sejam crianças e adolescentes e regras para buscas domiciliares. 

    Entretanto, divergiu sobre a suspensão do sigilo de todos os protocolos de atuação das forças de segurança do Rio de Janeiro e sobre a análise pelo Ministério Público Federal (MPF) das alegações de descumprimento da decisão proferida pelo STF. 

    Em seu primeiro voto desde que tomou posse como ministro do Supremo, André Mendonça concordou com a adoção de algumas das medidas propostas para operações policiais, mas discordou do parecer de Fachin em alguns dos pontos mais rigorosos como: instalação de câmeras de vídeo nas viaturas policiais, determinação dos critérios para atuação da polícia nas comunidades em momento de pandemia e sigilo da operação policial.

    Para Mendonça, a publicidade ampla e irrestrita da operação policial traz prejuízos ao cidadão porque permite que os criminosos tenham acesso às informações da polícia. “É necessário prevenir a vida e risco iminente. O que é iminente? São expressões que deixam dúvida para a atuação policial. O que eu discordo do ministro Fachin é estabelecer essas condicionantes, [da atuação da polícia] de maneira mais restritiva”, argumentou o ministro. 

    Kassio Nunes Marques também acompanhou em partes o relator, e se disse preocupado com o uso desproporcional da força policial. O ministro foi a favor do sigilo das operações, argumentando que a publicidade poderia colocar em risco a vida das autoridades. Sobre a instalação de câmeras corporais e GPS nas viaturas, Nunes Marques se considerou “simpático” às medidas, no entanto, expressou dúvidas sobre a competência dos estados em decidirem sobre o tema.

    “Reconheço o papel da Suprema Corte, mas reforço que esse exame deve ser precedido de reflexão. O tema da segurança pública gera debates. Não me parece que cabe a essa Corte substituir-se do administrador para definir escolhas sobre a segurança no estado do Rio de Janeiro. Porém, diante da situação excepcional no estado do RJ, curvo-me à maioria”, concluiu o ministro.

    A ministra Rosa Weber acompanhou “na sua essência” o voto do relator Edson Fachin. Em seu voto, concordou com a suspensão dos sigilos dos protocolos de atuações policiais.”Diz que estratégias que tratem de inteligência do estado do RJ devem ser mantidas em sigilo. Quanto ao item 6 acompanha o relator quando suspende o sigilo dos protocolos de atuação policial com ressalvas aos concernentes aos atos de inteligência”, disse a ministra.

    O voto do ministro Dias Toffoli fez com que a maioria fosse formada no julgamento. Dessa forma, a maior parte do plenário da Corte concordou com a adoção de medidas que reduzam a letalidade policial em operações no Rio de Janeiro. Após o voto de Toffoli, a votação foi suspensa por conta do horário, mas foi retomada nesta quinta-feira.

    No retorno do julgamento, o relator, Edson Fachin, pediu a palavra para fazer considerações e sugestões sobre o modo de atuação da polícia nas comunidades do Rio de Janeiro. Fachin propôs que a entrada em domicílios seja feita apenas durante o dia; diligências devem ser feitas de forma excepcional; reconheceu a obrigatoriedade de ambulâncias em operações policiais agendadas; instalação de GPS e câmeras nas viaturas e fardas dos policiais.

    O ministro ainda determinou as investigações de descumprimento no sentido de limitar as operações policiais, inclusive no recente episódio em Jacarezinho. Fachin também afirmou que as denúncias anônimas não podem justificar a busca domiciliar sem mandado judicial e que no caso de descumprimento de decisão do STF a competência para investigação é do MPF.

    A sessão continuou com o voto do ministro Luís Roberto Barroso, que acompanhou a divergência sobre a questão das denúncias anônimas e acompanhou o relator em relação à divergência nas denúncias anônimas e na investigação ser conduzida pelo Ministério Público.

    Em seguida, a ministra Cármen Lúcia também acompanhou o parecer de Fachin. A ministra enfatizou que a determinação exposta sobre providências que serão adotadas terão prazo até que o plano mais abrangente seja apresentado. No entanto, não concordou sobre a investigação feita pelo Ministério Público, acompanhando então a divergência aberta por Alexandre de Moraes.

    Aumentando o placar para 9 a 0, o ministro Ricardo Lewandowski apresentou seu voto acompanhando o relator do caso, Edson Fachin.

    Gilmar Mendes acompanhou em partes o parecer de Fachin. Em seu voto, o ministro discordou sobre a publicidade das atuações policiais, afirmando que ao tornar pública a operação policial, assume-se o risco aos procedimentos da polícia além de colocar em evidência as informações de inteligência. Mendes ainda considerou que há de se ter postura cautelosa sobre as buscas fundadas exclusivamente em denúncias anônimas.

    O presidente do Supremo, Luiz Fux, concluiu o julgamento fazendo com que o plenário concordasse, em unanimidade, pela adoção de medidas que reduzam a letalidade policial no Rio. O ministro leu seu voto afirmando ser preciso estabelecer critérios que protejam, antes de tudo, os direitos humanos. Fux disse que é legítimo conter as ações de organizações criminosas em comunidades, mas que as operações devem ser excepcionalíssimas.

    “Os moradores também não podem ter sua vida e liberdade ameaçada por uma política que não tenha por norte a distância dos direitos humanos”, afirmou o presidente da Corte.