Falta de dados reflete invisibilidade da população em situação de rua no Brasil
“Eu até me emociono quando me fazem essa pergunta, porque dói muito ver a pessoa em situação de rua. Pra mim, dói muito.” Poucas pessoas que não experimentaram o que é dormir sem um teto sobre a cabeça poderiam dar uma resposta como essa. O músico Wellington Antônio Vanderlei sabe bem o que é isso e, entre suas idas e vindas na rua desde a adolescência, é certeiro quando responde qual o sentimento relegado à população que vive sem ter onde morar. “Ah, o sentimento é que você é invisível mesmo, né?”
Invisível aos olhos da sociedade, e muitas vezes também do poder público. As discussões a respeito do adiamento do Censo populacional que seria realizado neste ano lançaram luz sobre a importância de pesquisas para a formulação de políticas públicas. Políticas essas que reduzem os níveis de desigualdade, combatem a fome, o desemprego, o abandono escolar e tantos outros gargalos sociais. O problema é que quem vive na rua não entra nas estatísticas do Censo.
A única vez em que foi realizado um levantamento nacional exclusivamente sobre a população em situação de rua foi em 2008, quando foram registradas informações extremamente relevantes e até inesperadas, como o fato de que 70% dessa população tinha algum tipo de trabalho. Outros dados, nem tão inesperados assim: 67% dessas pessoas eram negras, retrato do racismo e desigualdade no nosso país.
Mas esse retrato nunca mais voltou a se repetir. O que o país tem de mais recente sobre a população em situação de rua é uma estimativa produzida por Marcos Natalino, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que projetou 222 mil pessoas vivendo nas ruas do Brasil até março do ano passado. O cenário, é claro, agravou-se durante a pandemia.
“Agora, na pandemia, eles são visíveis à medida que, quando fecha a cidade, menos pessoas circulam pelas ruas. Os únicos que circulam nas ruas são eles. Então, é um jogo. Ora eles são visíveis, ora eles são invisíveis. Quando incomodam, são visíveis. Quando não incomodam, a ordem estabelecida, são invisíveis”, opina o padre Júlio Lancellotti, que há anos é uma referência no apoio a quem vive nas ruas.
Neste episódio do Entre Vozes, o último da temporada, Luciana Barreto conta como a pandemia agravou as dificuldades que já eram imensas para quem não tem uma casa. Além de Júlio Lancellotti e de Wellington Vanderlei, o criador da ONG SP Invisível André Soler também comenta a realidade da população em situação de rua e o vazio de dados e políticas públicas para combater o problema.
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