“Plano de reabertura do Rio segue parâmetros inadequados”, aponta Croda
Pesquisador entende que bases usadas pelo município têm referências diferentes da realidade brasileira
Ex-chefe do Departamento de Imunização e Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde durante a gestão do ministro Luiz Henrique Mandetta, o infectologista e pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Júlio Croda, criticou o plano de flexibilização em três etapas, apresentado pela prefeitura do Rio de Janeiro. Para ele, as medidas são fruto de um erro de avaliação, que buscou referências inadequadas para a cidade.
O programa prevê que, se todas as metas de vacinação do município forem atingidas e os índices se mantiverem estáveis, a partir de 15 de novembro o uso de máscaras de proteção oficial só será obrigatório em unidades de saúde e no transporte público. Até lá, o município também pretende liberar, nas mesmas condições, 100% da capacidade de público nos estádios, para pessoas com esquema vacinal completo.
“O benchmarking levou em conta países desenvolvidos, o que não é a situação do nosso, e que vacinaram majoritariamente com Pfizer e AstraZeneca. Essa não é a realidade do Rio, que vacinou mais com Coronavac e AstraZeneca, um perfil mais parecido com o do Chile. Mais com dose um que dose dois. Fora que essas referências não previam a circulação da variante Delta. Nesses países, tudo está sendo revisto. E a Delta está batendo quase 50% de circulação no Rio de Janeiro”, avalia.
Na quarta-feira, a Subsecretaria de Vigilância e Atenção Primária à Saúde, do estado, estimou em 45% presença da variante Delta nos casos de Covid-19 em andamento na capital, por base em proporção de amostras analisadas. A projeção foi confirmada pelo município. No estado, a projeção é de 26%. O Ministério da Saúde confirma 101 casos sequenciados da linhagem originária da Índia na cidade.
Embora entenda que o plano de flexibilização do município possa melhorar, Croda entende que a lógica municipal de flexibilização não faz sentido.
“É uma cidade muito grande, cercada de outras bastante populosas, nas quais tudo converge para a capital, e isso se repete no sistema de saúde. As cidades vizinhas têm realidades muito diferentes. O ideal é que houvesse uma coordenação central mas, como sabemos que isso não haverá, no mínimo, deveria ser estadual”, conclui Croda.
Durante a semana, o secretário municipal de Saúde Daniel Soranz admitiu não ter consultado o Comitê Científico do município sobre o plano de reabertura. O órgão é consultivo, formado por especialistas e por profissionais das estruturas governamentais de saúde, técnicos e pesquisadores.
Procurada para responder aos pontos citados por Júlio Croda, a Secretaria Municipal de Saúde informou que os temas serão citados nesta sexta-feira (6), durante a apresentação semanal do Boletim Epidemiológico.
Detalhamento do plano de flexibilização
No plano divulgado pelo município, todas as medidas restritivas seguem em vigor até o dia dois de setembro. Na data, se forem alcançadas as metas de vacinar 77% da população com a primeira dose e 45% com a segunda, serão liberados eventos em ambientes abertos, com uso obrigatório de máscaras e álcool em gel. Também será permitida a presença de 50% da capacidade de público nos estádios, para pessoas com esquema vacinal completo. O mesmo valeria para boates, casas de show e festas em locais fechados.
A programação prevê ainda que, em 17 de outubro, com 79% da população com a primeira dose aplicada e 65% tendo recebido a segunda, os estádios sejam abertos para 100% da capacidade de público, assim como as casas noturnas.
Na última fase, estimada para 15 de novembro, com 80% da população com a primeira dose e 75% tendo recebido a segunda, o uso de máscara deixaria de ser obrigatório, salvo em unidades de saúde e no transporte público. Também seria suspensas as medidas de distanciamento social.
Desde o anúncio, no entanto, o secretário municipal de Saúde Daniel Soranz e o prefeito Eduardo Paes (PSD) têm destacado que as datas são projeções, que dependem de condições favoráveis para que sejam seguidas, e que o município não terá dificuldades em mudar de planos, caso a situação se agrave.
De acordo com o Painel Rio Covid-19, mantido pelo município, o Rio já aplicou a primeira dose em 62,5% da população, e a segunda em 28%. Os dois totais incluem também as pessoas que receberam imunizante de dose única.