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    Organizações indígenas do Amazonas enviam carta de socorro à ONU

    CNN teve acesso à íntegra do conteúdo; Indígenas pedem ajuda para combater o avanço da Covid-19 em aldeias e criticam autoridades

    Enterro de vítimas da COVID-19 em Manaus (28/04/2020)
    Enterro de vítimas da COVID-19 em Manaus (28/04/2020) Foto: Bruno Kelly/Reuters

    Marcus Vinicius Oliveira, especial para a CNN, em Manaus (AM)

    A COIPAM (Coordenação das Organizações e Povos Indígenas do Amazonas), junto com federações e outras organizações de base, enviou uma carta para a ONU (Organização das Nações Unidas) e para o Ministério Público Federal do Amazonas nesta terça-feira (19) pedindo socorro. Eles reivindicam atenção dos órgãos competentes sobre o avanço do coronavírus nas aldeias indígenas no estado. 

    Na carta, à qual a CNN teve acesso com exclusividade, os indígenas relatam que estão enfrentando a falta de políticas públicas eficientes no combate à Covid-19. Os grupos afirmam que são tratados como ”invisíveis” pelo Estado.

    Zenilton Muro, coordenador da COIPAM, afirmou em entrevista à CNN que os indígenas estão com medo e se sentindo abandonados pelas autoridades. ”O governo do estado do Amazonas não tem nos auxiliado com testes rápidos. Nós não estamos tendo nenhum apoio. Por parte do governo federal é igual. Eles não estão conseguindo chegar até os povos indígenas mais isolados”, relata. 

    As organizações pedem ainda cestas básicas e auxílio financeiro emergencial, já que os indígenas que moram em áreas urbanas, que em sua maioria trabalham como autônomos, precisaram parar de trabalhar por causa das políticas de distanciamento social. ”Muitos indígenas dependem do artesanato para sobreviver. Como não estão conseguindo trabalhar, eles estão passando fome”, explica o coordenador. 

    O Amazonas é o estado brasileiro que possui a maior população indígena do Brasil. São cerca de 235 mil nativos divididos em 66 diferentes povos. 

    Segundo dados da SESAI (Secretaria Especial de Saúde Indígena), que faz parte do Ministério da Saúde, foram confirmadas 23 mortes de indígenas no país até o dia 19 deste mês, 13 somente na região amazônica.

    Já no último levantamento feito pela APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), até o último dia 7 de maio, 55 indígenas morreram por Covid-19 no Brasil. Segundo Muro, a diferença entre estes números pode ser explicada por causa da subnotificação. ”Não estão testando os indígenas. Estes números são muito maiores do que os divulgados e não mostram a gravidade da situação dos nossos povos”, acusa.

    Outro lado

    Por meio de nota, o governo do Amazonas afirmou que os planos de contingência dos municípios e do estado foram realizados em conjunto com os Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs) e Organizações indígenas, sendo realizadas discussões constantes nos níveis municipal, estadual e federal.

    Ainda segundo o governo, ficou acertada a construção de uma ala específica para atendimento a indígenas no Hospital da Nilton Lins em Manaus. Também foi reforçada a necessidade de o Ministério da Saúde atuar junto aos municípios para a liberação do aporte destinado à saúde indígena nas cidades do interior – o Incentivo de Atenção Especializada dos Indígenas (IAEPI).

    A Fundação Nacional do Índio (Funai) informou que vem adotando, no âmbito de suas competências, todas as medidas que se encontram ao seu alcance no enfrentamento à pandemia do novo Coronavírus. A fundação explicou que está distribuindo cestas básicas a comunidades indígenas do país, adquiridas com recursos próprios ou por meio de doações. A fundação ainda afirma que já investiu quase R$ 14 milhões para ações de combate ao novo coronavírus nas aldeias. 

    Também por meio de nota, o Ministério da Saúde informou que implementa, desde janeiro de 2020, mesmo antes da Organização Mundial da Saúde (OMS) decretar a Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional (ESPII), ações de informação, prevenção e combate ao Coronavírus para orientar as comunidades indígenas, gestores e colaboradores em todo o Brasil.

    Segundo o ministério, as equipes multidisciplinares de saúde indígena estão sendo orientadas a priorizar o trabalho de busca ativa domiciliar de casos de Síndrome Gripal (SG) e Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), realizando a triagem dos casos, evitando a circulação de pessoas com sintomas respiratórios. 

    Já o Ministério da Cidadania disse que a crítica sobre a falta de programas sociais e do auxílio emergencial para indígenas não tem sustentação nos fatos. Ainda segundo o Ministério, na atual gestão, o Bolsa Família teve recordes de famílias atendidas. No mês de abril deste ano, o programa chegou a 14,27 milhões de famílias em todo o país. Deste total, 13,56 milhões de famílias foram habilitadas a receber o auxílio emergencial, que varia entre R$ 600 e R$ 1.200. O auxílio emergencial, de acordo com o Ministério da Cidadania, chegou a mais de 121 mil famílias indígenas dentro do Programa Bolsa Família em todo o país.   

    ABAIXO A CARTA NA ÍNTEGRA ENVIADA PARA A ONU:

    Ao
    EXMO. SR. ANTÔNIO GUTERRES
    SECRETÁRIO GERAL DA ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS- ONU
    NOVA YORK – EUA

    S.O.S. POVOS INDÍGENAS DO AMAZONAS PEDEM SOCORRO

    A Coordenação das Organizações e Povos Indígenas do Amazonas – COIPAM – e suas organizações de base, representantes de 66 povos, 235 mil indígenas, 179 Terras Indígenas reconhecidas, correspondente a 30% do território do estado do Amazonas, estado este com a maior população indígena do Brasil. A COIPAM juntamente com as organizações de base, buscam a promoção da melhoria da qualidade de vida, o fortalecimento da autonomia dos povos e organizações indígenas, lutando para que se cumpra a implementação e efetivação dos DIREITOS assegurados na constituição Federal de 1988, nos tratados Internacionais (Convenção 169 da OIT) e nas demais legislações concernentes aos Povos Indígenas.

    Diante da gravidade e avanço do contágio do Covid-19 no estado do Amazonas, a qual põe em risco a vida dos diversos povos indígenas, tanto pelo contágio que avança sobre as aldeias, quanto pelo risco que se alastra sobre os grupos isolados de indígenas que vivem em situação de isolamento, como também, em decorrência do alto índice de contaminação pela pandemia, que vem ocorrendo em áreas urbanas locais de moradias de muitos indígenas que buscam formas de sobrevivência, através das vendas de produtos e/ou na prestação de serviços  diversos. Vimos repudiar que os povos indígenas do Amazonas estão vivendo um sentimento de medo e abandonado por parte do Governo.

    Considerando os desastres dos indigenas infectados e que perderam vidas para essa pandemia do Coronavírus, no Baixo Amazonas os casos confirmados são 20, com 01 óbito; no Médio Purus os casos já confirmados 04; em Manaus e Entorno os casos confirmados são 29; no Alto Rio Negro os casos confirmados são 03 e com 02 óbitos; no Alto Solimões são 129 contaminados e com 10 óbitos.

    No Vale do Javari não temos casos confirmados. No Médio Solimões e Afluentes casos confirmados são 02. O total de casos confirmados chegam a 187 com 13 óbitos. Dados oficiais da Secretaria Especial de Saúde Indígena- SESAI, diferem da realidade e já são 69 indígenas falecidos e os povos indígenas do Amazonas atingidos diretamente pela Covid-19 são: Apurinã, Baniwa, Baré, Dessana, Hixkaryana, Kokama, Mura, Munduruku, Sateré-Maué, Tariano, Tikuna, Tukano e Yanomami. De acordo com as informações repassadas das lideranças, organizações e profissionais indígenas buscam mostrar uma realidade omitida pela SESAI, que registra atualmente, um número muito menor, pois não consideram os indígenas que vivem nas zona urbana de cidades do interior do Estado do Amazonas. As lideranças Kokama já registram 40 mortes entre o seu povo, com sentimento de revolta e tristeza pela perda dos parentes, somado ao descaso e a omissão do Governo do Amazonas.

    Os povos indígenas, com suas organizações e movimentos, buscam medidas imediatas para evitar a contaminação nas aldeias. As instituições governamentais responsáveis por garantir a efetivaçãoes das políticas públicas, das leis e dos direitos dos povos indígenas se encontram inertes diante dos alarmantes índices de mortes cotidianas, causados pelo Coronavirus, somado às ameaças e de invasões com desmatamentos acelerados, que aumentaram assustadoramente nos territórios indígenas durante esse período de pandemia.

    Na contramão das iniciativas dos povos indígenas em defender suas vidas e seus territórios, a Fundação Nacional do Índio- FUNAI, recentemente publicou uma Instrução Normativa n° 09 de 16 de abril de 2020, a qual o Presidente do órgão infringe a lei e princípios do órgão indigenista, objetivando atender outros interesses, que afrontam os direitos dos povos indígenas. Estamos enfrentando vários adversários ao mesmo tempo: o Covid-19, a falta de respeito e de políticas públicas, literalmente ameaçando nossa vidas, cultura e a nossa Mãe Terra.

    Considerado que, o governo Estadual tem tornado os povos indígenas invisíveis, diante o impacto, que a COVID-19 vem impondo, em que se faz necessário a implementação de medidas econômicas e sanitárias urgentes, dada a exposição das diversas etnias que habitam o estado do Amazonas, a precários sistemas de saúde existentes e a ausência de medidas apropriadas que assegurem minimamente qualidade de vida aos povos indígenas.

    Considerando a falha da SESAI, que deveria agir de acordo com a lei que institutiu o Subsistema de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas, criado em 1999, por meio da Lei nº 9.836/99, conhecida como Lei Aroucan, que assegura uma saúde específica e diferenciada aos povos indígenas, mas que na prática, no dia a dia, estamos vivenciando a inoperância, negligência e a falta de cobertura do atendimento na maioria dos lugares onde vivem povos indígenas, obrigando-os a buscar os centros urbanos, submetendo-os à contaminações diversas.

    Considerando que a COVID-19 pode agravar a situação atual dos povos indígenas, uma vez que as doenças predominantes ligadas à pobreza, como: anemia, desnutrição, doenças infectocontagiosas como malária, tuberculose, zikavirus, gripe e dengue, não vem tendo atendimento em tempo hábil, resultados de problemas estruturais e de injustiças social.

    Considerando que nesse viés somam-se ainda fatores como: as distâncias consideráveis para acessar um posto de saúde que muitas vezes não possuam os requisitos mínimos para tratamento de pandemia, o assassinato de defensores indígenas de direitos humanos de forma continua, a invasão dos territórios por terceiros, a presença de atividades ilegais como, extração ilegal de madeireira, garimpos, mineração e tráfico de drogas, entre outras tantas.

    Considerando que, para enfrentar as desigualdades que persistem no Estado, o número reduzido de programas e projetos sociais que trabalhem em coordenação direta com as organizações indigenas, culminam por não garantir o gozo dos direitos humanos dos povos indígenas, os quais devem ter uma abordagem individual sem deixar de lado o direito de ser plural e o direito coletivo incorporado em sua forma de organização.

    Diante deste difícil cenário, vimos recorrer junto à Organização das Nações Unidas-ONU, para buscar em caráter de urgência apoio aos Povos Indígenas, com o objetivo de garantir a ampliação da proteção dos povos indígenas diante do aumento da contaminação pelo coronavírus, já que nossa medicina tradicional não tem sido suficiente para conter as mortes, de forma que possamos:

    1.Garantir a TESTAGEM RÁPIDA a todos parentes que apresentarem sintomas de contaminação e medidas restritivas de circulação de pessoas não indígenas nas aldeias e em territórios de povos isolados.

    2.Garantir infraestrutura para fortalecer e ampliar as estruturas de prestação de serviços de saúde na terras indígenas, bem como viabilizar os meios de transportes necessários para a entrega de gêneros alimentícios, respeitando as peculiaridades locais e protocolos de segurança e cuidado no manuseio dos alimentos.

    3.Garantir “CESTA BÁSICA”, ou seja, a distribuição de alimentos para comunidades sem condições de adquirir renda neste tempo de isolamento social, fazendo chegar até as aldeias, prestando especial atenção nas localidades de difícil acesso e que chegue para todos os povos indígenas considerando a realidade de cada Povo Indígena.

    4.Garantir AUXÍLIO FINANCEIRO EMERGENCIAL SOLIDÁRIO, com um valor adequado voltado aos povos indígenas, especialmente à aqueles que vivem em locais distantes, nas aldeias e nos centros urbanos, no prazo que durar a necessidade de isolamente social em decorrência da pandemia do coronavirus.

    5.Assegurar AUXÍLIO FINANCEIRO EMERGENCIAL SOLIDÁRIO para os Presidentes ou Coordenadores das Organizações e ou Federações indígenas nas regiões das grandes calhas do Rio Juruá, Purus, Amazonas, Madeira, Solimões, Vale do Javari, Manaus e entorno e Rio Negro, de acordo com cronograma de atividades visando sensibilização da prevenção e entrega de cestas básicas em cada região ou território indígena, de forma que seus trabalhos continuem a garantir direitos e defesa da Vida e dos Territórios, espaços essenciais para o Planeta.

    6.Garantir estrutura para implantação e manutenção de hospitais para atendimentos aos indígenas nas seguintes regiões: Baixo Amazonas, Rio Purus, Manaus, Alto Rio Negro, Alto Rio Solimões, Vale do Javari, Médio Solimões, Rio Juruá e Rio Madeira, totalizando 09 hospitais para cobrir ao atendimento de todos os povos indígenas do Amazonas. Os recursos devem estruturar os hospitais nas referidas regiões com recursos humanos, equipamentos adequados e necessários para atendimento a saúde dos povos indígenas com qualidade.

    7.Que a ONU ajude o Governo Federal brasileiro, para que a SESAI seja fortalecida, atuante e em diálogo permanente com as organizações e lideranças indígenas, para juntos contribuirmos na oferta de uma saúde específica, diferenciada e de qualidade para os Povos Indígenas.

    Considerando as instâncias internacionais em defesa dos direitos humanos, apelamos o PEDIDO DE SOCORRO DOS POVOS INDÍGENAS DO AMAZONAS, que estão com suas vidas veneráveis e ameaçadas pela inoperância do Estado do Amazonas, que assistem calados o aumento de mortes de indígenas diariamente, com extrema propagação e contaminação pelo Coronavirus, sem que nenhuma assistência eficaz seja realizada para enfrentar essa triste realidade.

    Por isso, pedimos que a ONU viabilize ou nos ajude a mobilizar recursos financeiros, para que por meio de nossas organizações de base, os itens necessários e urgentes, cheguem até as aldeias e comunidades que estão desamparadas pelas instâncias governamentais. Nosso processo de organização social está preparado para fazer esta mediação junto aos nossos  povos e em benefício destes.

    Declaramos, que permaneceremos vigilantes e resistentes em nossas aldeias e nos nossos Movimentos Indígenas para defender nossos direitos e nossos interesses coletivos, para mantermos dignidade, a saúde e a vida dos nossos Povos Indígenas os verdadeiros guardiões da Floresta Amazônica, nossa Mãe Terra. Subscrevem conjuntamente à COPIAM, os  representantes de povos e organizações de base.

    Atenciosamente,
    ZENILTON MURA
    COORDENADOR GERAL – COIPAM

     

    ORLANDO BARÉ
    Vice-Coordenador da COIPAM

    Francisco Antonio Guedes
    Presidente da Federação das Organizações dos Caciques e Comunidades Indígenas da Tribo Ticuna – FOCCITT

    Jecinaldo Barbosa Cabral
    Secretário Geral do Conselho Geral da Tribo Sateré Mawé- CGTSM

    Paulo Marubo
    Coordenador Geral da União dos Povos Indígenas do Vale Javari – UNIVAJA 

    Valdimiro Farias da Silva
    Coord. Geral da Federação das Organizações Indígenas do Purus- FOCIMP

    Glades Kokama Rodrigues Ramires
    Presidente da Federação Indígena do Povo Kokama-kukamiria do Brasil, Peru e Colômbia – TWRY

    Eronilde Fermin Omagua
    Cacique geral Organização dos Kambeba do Alto Solimões – OKAS

    Cláudio Mura
    Secretário do Conselho Indígena Mura – CIM e ex Coordenador da COIAB.

    Maurício Kambeba
    Vereador Municipal de Alvarães

     

    Armando Marubo
    Vereador Municipal de Atalaia do Norte.

    Manoel Marubo
    Vereador Municipal de Atalaia do Norte e membro da UNIVAJA

    Make Matis
    Vereador Municipal de Atalaia do Norte 

    Aldamir Sateré
    Presidente da Federação das Organizações e Lideranças tradicionais dos Povos Indígenas do Baixo Amazonas – AKANG.

    Guilherme Txehkeku Hiskaryana
    Vice Presidente do Conselho Geral da Tribo Hiskaryana – CGPH

    Maximiliano Correa Menezes
    Ex-Coordenador Geral da COIAB

    Raimundo Parintintin
    Coord. Executivo dos Povos Indígenas Parintintin do Amazonas – OPIPAM.

    Cristiano da Silva Rodrigues Munduruku
    Presidente da Associação dos Povos Indígenas do Baixo Marmelo – APIBAM

    Genival de Oliveira dos Santos Mayuruna
    Cacique aldeia Marajai, Médio Rio Solimões.

    Ewerton Marubo
    Presidente da Associação Marubo de São Sebastião- AMAS, Base da UNIVAJA.

     

    Sebastião Ramos Nogueira Tikuna
    Presidente do Conselho Geral do Povo Maguta Alto Rio Solimões – CGPM/ARS

    Antônio Enésio Tenharim
    Coordenador Geral da Organização dos Povos Indígena do Alto Madeira – OPIAM

    Anderson Barroso Ortega
    Presidente da Associação dos Witoto do Alto Solimões-AWAS

    Vanderlencia Ortega dos Santos
    Representante Politica do Povo Vitoto