Após 150 dias sem denúncia, Justiça libera acusado por homicídio quilombola
Defesa argumentou “constrangimento ilegal devido à demora na investigação”; caso ocorreu em 2017


A Segunda Turma da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) concedeu habeas corpus a Uillian Portugal Brito, preso preventivamente por suspeita de homicídio qualificado do líder quilombola Flávio Gabriel Pacífico dos Santos, o Binho do Quilombo, em 2017.
A decisão foi tomada após a defesa alegar excesso de prazo na custódia, já que, mesmo após mais de 150 dias de sua prisão, o Ministério Público não ofereceu denúncia contra Brito.
O habeas corpus foi impetrado pelo advogado Reinaldo da Cruz de Santana Júnior, que argumentou constrangimento ilegal devido à demora na investigação e à ausência de indícios suficientes para a formalização da acusação.
O Ministério Público, por sua vez, solicitou o retorno do caso à Delegacia de Polícia para novas diligências, reconhecendo que ainda não há elementos concretos que vinculem o investigado ao crime.
O Tribunal compreendeu que a manutenção da prisão sem prazo definido para a conclusão das investigações fere garantias fundamentais.
“O paciente não pode continuar com sua liberdade cerceada por tempo indeterminado enquanto se busca encontrar algum indício mínimo de autoria”, destacou a relatora da decisão.
“A defesa afirma que a decisão do Tribunal foi extremante acertada porque o Ministério Público não tinha condições técnicas de oferecer a denúncia contra o investigado. O inquérito concluído pela polícia Federal é preocupante porque já prendeu e soltou muitas pessoas inocentes durante o curso da investigação. São cidadãos que sofrem duros interrogatórios, prisões injustas e o escárnio público”, afirma Reinaldo Santana, advogado criminalista.
O Ministério Público da Bahia enviou uma nota sobre o não oferecimento de denúncia. Leia abaixo:
“O Ministério Público da Bahia informa que aguarda o cumprimento de diligências requisitadas às Polícias Federal e Civil, em novembro de 2024, pelo Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas e Investigações Criminais (Gaeco). As diligências foram cumpridas parcialmente, conforme respostas enviadas ao MPBA neste mês, restando pendentes relatório técnico e laudo pericial imprescindíveis à elucidação dos fatos, principalmente sobre a autoria do crime. O conteúdo das diligências é sigiloso.
Trata-se de uma investigação complexa que envolveu a atuação das Polícias Civil e Federal e o MPBA tem atuado para que haja o cumprimento das diligências, que são cruciais para tomada das medidas cabíveis.
O MPBA está empenhado na responsabilização dos autores do crime, com a designação do Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas e Investigações Criminais (Gaeco), uma unidade especializada em apurações complexas como a do caso em questão.
A Instituição tem dialogado com os familiares da vítima, por meio do Centro Operacional dos Direitos Humanos (CAODH), para informá-los sobre o andamento das investigações e compreende as legítimas cobranças deles e da sociedade sobre os desdobramentos penais do caso.
O MPBA reafirma o compromisso, dentro da legalidade e das provas técnicas trazidas, de esgotar todas as possibilidades investigativas para a promoção da Justiça”.
Medidas cautelares
Apesar de concedido o habeas corpus, uma série de medidas cautelares alternativas deverão ser cumpridas pelo acusado, tais como o comparecimento mensal à Vara Criminal, proibição de frequentar bares e restaurantes, recolhimento domiciliar noturno e uso de tornozeleira eletrônica.
Relembre o caso
A Polícia Federal (PF) havia prendido em julho de 2024 o homem suspeito de assassinar o líder “Binho do Quilombo”, em 2017. Ele é filho de Bernadete Pacífico, conhecida como “Mãe Bernadete”, que também foi executada em agosto do ano passado.
O trabalho da PF foi realizado na época por meio da operação batizada de Palmares, com o objetivo de apurar a autoria do assassinato e prender mais uma pessoa.
Binho do Quilombo era representante da Comunidade Quilombola de Pitanga dos Palmares em Simões Filho, na Bahia, juntamente com sua mãe, Maria Bernadete Pacífico Moreira. Ela também foi vítima de homicídio em agosto de 2023.
As investigações sobre o homicídio de Binho se iniciaram na Polícia Federal em setembro de 2017. O crime foi praticado no dia 19 de setembro daquele mesmo ano.
Segundo a PF, os elementos da investigação demonstram que os suspeitos utilizaram um veículo fraudulentamente adquirido em nome de um terceiro, financiado mediante utilização de documentos falsificados.
A PF também descobriu que o número de celular utilizado por um dos investigados à época do crime foi cadastrado em nome desta mesma pessoa da documentação falsa.