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    Maurício Pestana: Heróis, bandidos e Justiça no Brasil contemporâneo

    Nos dias de hoje, como identificar o respeito disseminado na sociedade brasileira, relacionado do que é justo, em um país onde a linha tênue que separa o bandido e a Justiça se faz cada vez menor?

    Maurício Pestanada CNN

    A história do nosso país no aspecto da ética, dos valores e da Justiça sempre foi moldada pela classe dominante vigente. O poder sempre foi exercido por meio da fé, da política, das armas e outras formas de domínio ditando os valores da Justiça.

    Aqui, essa ordem muitas vezes é alterada, de acordo com o tempo, ou os poderes da classe dominante vigente.

    Exemplo: no período escravocrata, a Santa Sé, leia-se na época, a Igreja Católica, tinha um poder considerável sobre o Estado, muitas vezes ela fazia o papel do Estado. Não por acaso, cada escravizado que vinha para o Brasil passava pelo ritual de batismo e o escravocrata pagava 5% do valor do escravizado para a Santa Sé.

    Já nas diversas ditaduras que perduraram ao longo do século 20, o poder das armas ditava as ordens e a “Justiça”, período esse em que se disseminaram teorias questionáveis do ponto de vista do que era justo, como “bandido bom é bandido morto”, mesmo que sem um julgamento.

    Ou seja, a Justiça exercida por quem detém a força e as armas, em geral a polícia política do regime e assim por diante, e os bandidos naquela época por via de regra, eram os desafetos do regime.

    Mas, nos dias de hoje, como identificar o respeito disseminado na sociedade brasileira, relacionado do que é justo, em um país onde a linha tênue que separa o bandido e a Justiça se faz cada vez menor?

    Em fatos divulgados cotidianamente pela imprensa, é colocada muitas vezes a Justiça em cheque com vendas de sentenças, leis que não prendem ninguém como, por exemplo, a que estabelece o racismo como crime inafiançável em um país que recebe denúncias dessas práticas cotidianamente. Mas não tem um só criminoso na cadeia, ou seja, é a banalização da ação da Justiça.

    E para ridicularizar ainda mais essa “Justiça”, hoje em dia, os “tribunais do crime” parecem ser mais rápidos e respeitados nas comunidades onde eles atuam, seja pela força do crime organizado ou pelo único sentimento da presença de algo que organiza uma certa “ordem” em um território onde o poder do Estado só é exercido muitas vezes para matar, em sua maioria inocentes, sem o menor respeito à vida humana, como temos visto recentemente em municípios como Guarujá e Salvador, e principalmente nos grandes centros urbanos brasileiros.

    A personificação deste estado de coisas está evidenciada em um vídeo que viralizou esta semana, onde uma mulher branca que pouco se importa se está sendo filmada em prática de racismo, à luz do dia, questiona a lei que torna o racismo um crime inafiançável em nosso país e, mais do que isso, ameaça as pessoas que estão filmando dizendo ser mulher de um miliciano, ou seja, um membro do crime organizado do Rio de Janeiro e, por isso, deve ser respeitada.

    O final do episódio é patético: ela é conduzida à delegacia e sai pela porta da frente investida de um poder que já se confunde com o paralelo ou oficializado, em um Estado vergonhosamente omisso.

    Uma análise mais aprofundada deste caso no Rio de Janeiro mostra que, no Brasil contemporâneo, a noção de herói, bandido e justiça está cada vez mais difusa, o herói invocado pela criminosa (uma vez que racismo é crime) é seu marido, um miliciano, ou seja, um bandido que deve ser temido. E a delegacia, que deveria ser a mão do Estado e porta de entrada para a Justiça, apresenta-se como coadjuvante, omissa, como tem sido ao longo do tempo, seja no território dos excluídos ou na defesa dos mesmos.

    Veja também: Mulher negra filma ataque racista em posto de Salvador: “Odeio preto”

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