Lessa e Élcio devem cumprir no máximo 30 anos de prisão, explicam especialistas
O duplo assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes foi em 2018, e os réus foram presos em 2019, antes de a Lei de Execução Penal ser alterada
A sentença para os ex-policiais militares Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz, réus confessos nos assassinatos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, deve sair nesta quinta-feira (31).
Após mais de 12 horas de depoimentos e testemunhas, a expectativa se volta à condenação e ao tempo de prisão determinado aos réus.
O Ministério Público do Rio quer pena máxima, de 84 anos. A defesa do executor Ronnie Lessa argumenta que o tempo deve ser menor por ele ter firmado colaboração premiada e a Polícia Federal ter chegado até os supostos mandantes com as informações repassadas. O MP discorda.
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O promotor de Justiça Eduardo Morais declarou na noite desta quarta-feira (30) que eventual acordo de delação tramita sob sigilo e não implica na redução da pena que será imputada aos réus.
“Os termos da colaboração estão sob sigilo. A importância desse julgamento é que não existe colaboração ou acordo sem condenação. Estamos aqui para garantir a condenação dos réus. O acordo não prevê redução alguma de pena. Eles vão cumprir a pena máxima prevista pela legislação”, destacou.
Assista ao vivo ao julgamento de Ronnie Lessa e Elcio de Queiroz
Especialistas em Direito Penal ouvidos pela CNN explicam, no entanto, que mesmo com possível pena máxima, os dois ex-PMs deverão ficar no máximo 30 anos presos e devem ter cinco anos abatidos do total, visto que estão presos desde 2019. Entenda a seguir.
Máximo de 30 anos
“É o tempo máximo que uma pessoa pode permanecer presa, nos termos do art. 75 do Código Penal, considerado em sua redação anterior à modificação propiciada pelo Pacote Anticrime, Lei nº 13.964, de 2019, visto que o crime foi praticado em 2018”, declara Ivan Morais Ribeiro, mestre em Direito e consultor legislativo do Senado.
A limitação de 30 anos é de antes da Lei Anticrime. Passou a ser de 40 anos depois dessa alteração.
Então por qual motivo se permite a aplicação de uma pena acima da real possibilidade de cumpri-la?
“Em outros termos, qual é o sentido de se condenar a 50 anos de prisão se ele apenas irá ficar preso 30 anos? É porque todos os cálculos de benefícios, progressões e detrações utilizarão a pena aplicada como base de cálculo e não a quantidade máxima de anos que poderá ser preso (Súmula nº 715 do STF)”, detalha Morais Ribeiro.
O advogado criminalista Bruno Henrique de Moura explica o mesmo sentido.
“Mudanças na LEP [Lei de Execução Penal] têm natureza material, pois interferem em direitos e garantias individuais. A Constituição Federal veda a ‘novatio legis in pejus’. Então, quem tinha cometido o fato persecutido antes da entrada em vigor do Pacote Anticrime – em janeiro de 2020 – só tem contra si aplicadas normas ou de direito processual ou que sejam materialmente benéficas”, reforça.
O especialista Matheus Mayer Milanez explica o motivo de o máximo ser 30 anos.
“Nos autos da Extradição 1652, o STF entendeu que o aumento da pena máxima de prisão de 30 para 40 anos não tem aplicação retroativa, ou seja, só pode ser aplicada para crimes cometidos depois da entrada em vigor da Lei Anticrime, que foi o dia 24 de janeiro de 2020”.
“No caso do júri Marielle, o MPRJ aponta que vai pedir 84 anos de prisão para os acusados. Porém, eles não podem ficar os 84 anos na cadeia, mas, eles podem ficar no máximo 30 anos no regime fechado”, continua Milanez.
Isso quer dizer que eles vão ficar presos 30 anos? O advogado diz que não.
“A LEP regula a progressão de regime. Houve uma mudança pela lei anticrime, mas como os delitos cometidos são anteriores a ela, vale a lei que vigorava à época dos fatos”.
E complementa: “considerando que já estão presos há cinco anos, ainda faltaria cumprir um total de pena no regime fechado, sem considerar possíveis remissões por leitura, estudo ou trabalho, o que, caso façam todas, pode diminuir esse tempo em algo por volta de 10% do tempo de pena”, destaca Milanez.
Já Gabriela Setton Lopes de Souza, especialista em Direito Penal, explica também a redução de pena com base no tempo de prisão dos réus. Os dois foram presos em 2019, um ano após o crime, o que pode ser abatido ao final.
“A legislação permite que o tempo que a pessoa permaneceu presa cautelarmente seja descontado da pena total fixada ao final do processo, cabendo ao Juiz realizar esse desconto. Por exemplo, em caso de condenação, os mais de 5 anos de prisão cautelar dos acusados poderão ser abatidos da pena máxima de 84 anos requerida pelo Ministério Público, restando ainda 79 anos de pena”, pontua.