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    Xi Jinping tenta colher vitória diplomática na batalha por influência global após cúpulas

    Homem forte da China saiu direto da política de isolamento "Covid zero" de seu país com uma enxurrada de reuniões presenciais em Bali e Bangcoc na semana passada

    Nectar Ganda CNN , em Bali, Indonésia

    Xi Jinping pode ter rejeitado a descrição do presidente dos EUA Joe Biden do século 21 como uma batalha entre democracias e autocracias. No entanto, como demonstraram as cúpulas do G20 e da APEC (Cooperação Econômica Ásia-Pacífico), o líder chinês continua tentando minimizar a influência norte-americana no exterior.

    Ainda no rescaldo do último Congresso do Partido Comunista que, no mês passado, consolidou e estendeu o controle de Xi, o homem forte da China saiu direto da política de isolamento “Covid zero” de seu país com uma enxurrada de reuniões presenciais em Bali e Bangcoc na semana passada.

    Em contraste com a sua imagem, propagada por ele mesmo, de um rígido líder ideológico, Xi tentou aparecer como um estadista de mente aberta, dizendo a Biden na reunião na segunda-feira passada (14) que os líderes “deveriam pensar e saber como se dar bem com outros países e com o mundo em geral”.

    O amplo alcance diplomático pareceu voltado especificamente para aliados dos EUA e líderes regionais no meio da crescente rivalidade entre Washington e Pequim. Desde que assumiu o cargo, Biden reforçou as relações com aliados e parceiros para combater a crescente influência da China.

    “A Ásia-Pacífico não é o quintal de ninguém e não deve se tornar uma área para uma grande competição de poder”, afirmou Xi na sexta-feira (18) na abertura da cúpula da APEC, na ausência de Biden, que já havia voado de volta para os EUA.

    A sequência intensa de encontros diplomáticos presenciais representa uma vitória para Xi, cujo isolamento internacional autoimposto se revelou extremamente caro, causando abalo nas relações da China com o Ocidente e com muitos dos seus vizinhos durante a pandemia. As tensões têm aumentado ao redor das origens do coronavírus, do comércio, das reivindicações territoriais, das acusações de abusos de direitos humanos por parte do governo e de sua estreita parceria com a Rússia, mesmo com a guerra devastadora na Ucrânia.

    “A julgar pelo grande volume de chefes de estado internacionais que querem ter um encontro a sós com Xi Jinping, acho que é seguro dizer que a viagem foi bem-sucedida para ele”, declara Wen-Ti Sung, cientista político do Programa de Estudos de Taiwan da Universidade Nacional da Austrália.

    Com sorrisos largos e apertos de mão, o líder chinês fez intercâmbios com seus homólogos dos EUA, Austrália, França, Coreia do Sul, Japão, Singapura, Indonésia, Filipinas e Papua-Nova Guiné, entre outros – incluindo líderes cujos governos criticaram abertamente o governo chinês.

    Em vários discursos, Xi, que no início deste ano tinha se juntado ao presidente russo, Vladimir Putin, proclamando planos para criar uma “nova ordem mundial”, tentou se apresentar como líder para a unidade internacional. Em mal disfarçadas cutucadas aos EUA, ele criticou “a divisão ideológica”, “a política de bloqueios”, “a mentalidade de guerra fria” e as tentativas de “politizar e armar as relações econômicas e comerciais”.

    Durante as duas cúpulas, Xi compareceu a um total de 20 reuniões bilaterais em uma agenda tão cheia que às vezes se estendia até a noite. O presidente também fez questão de realizar a maioria das reuniões em seu hotel.

    A imagem dessa escolha fala por si mesma.

    “Todos os líderes se alinharam pacientemente para encontrar o ‘imperador’ da China”, observa Jean-Pierre Cabestan, professor de ciência política da Universidade Batista de Hong Kong.

    Mas, apesar do aparente clima de amizade com todos, Xi também mostrou que não estava para brincadeiras. Em um momento raro e sincero flagrado por uma câmera, Xi atacou o primeiro-ministro canadense Justin Trudeau, acusando-o de revelar detalhes de uma breve conversa entre eles. Enquanto eles se separavam, Xi é ouvido já fora da câmera descrevendo Trudeau como “muito ingênuo”.

    “Isso lembrou ao mundo inteiro que há limites para essa diplomacia sorridente: assim que alguém cruza os interesses da China, pode entrar em apuros”, completa o professor.

    O objetivo de Xi

    Para Xi, a agitação diplomática com os líderes ocidentais é um primeiro passo crucial para normalizar as relações, que estão extremamente tensas pela sua política externa assertiva e pela “diplomacia do lobo guerreiro” dos chineses.

    Apesar da sua posição em geral agressiva, a China está cada vez mais preocupada com a dissociação econômica com o Ocidente. O mau estado da economia chinesa – graças aos lockdowns incessantes na política de Covid zero e à recente proibição dos EUA da exportação de chips semicondutores avançados para a China – tornou urgente uma reversão dos rumos.

    Entre os líderes que Xi encontrou em Bali, estava, notavalmente, o primeiro-ministro Mark Rutte, da Holanda, lar da gigante de semicondutores ASML – que está sob crescente pressão dos EUA para parar de vender seu produto.

    Durante a reunião dos dois, Xi pediu a Rutte para evitar a “dissociação” e a “politização das questões econômicas e comerciais”, e convidou-o a visitar Pequim no ano que vem.

    “Embora Biden possa estar tentando construir um suposto alinhamento baseado em valores contra a China, Xi está tentando encontrar maneiras de enfraquecer a coesão desse alinhamento, buscando a diplomacia de alto nível com cada um desses países, um a um”, diz o cientista político Sung.

    As numerosas reuniões de Xi com aliados dos EUA são ainda mais notáveis dadas as recentes tensões com a China sobre o comércio, a geopolítica e a repressão dos direitos humanos em Xinjiang e Hong Kong. Em outros cenários multilaterais, como a cúpula do G7, as nações ocidentais emitiram declarações com textos mais fortes, expressando preocupações sobre violações de direitos humanos da China e a paz e estabilidade em todo o Estreito de Taiwan.

    “Em meio a tudo isso, Xi provou que a China ainda tem atração e estatura suficientes para atrair todos esses países para encontrar maneiras de trabalhar com a China. Então, nesse sentido, a diplomacia foi bem-sucedida para Xi”, diz Sung.

    Mensagem doméstica

    A postura internacional também é destinada ao público interno chinês.

    A mensagem-chave que Xi queria enviar para seu povo já estava definida no início da viagem, quando ele se encontrou com Biden pessoalmente pela primeira vez como líderes nacionais.

    “O fato de Xi estar conversando com Biden em um ambiente individual, com confiança e sorrisos para todo lado, gera essa imagem de que a era do G2 chegou”, opina Sung.

    Desde que chegou ao poder, Xi elogiou o “sonho chinês” do rejuvenescimento nacional: a sua visão de restaurar a China à sua glória passada e reivindicar o seu lugar legítimo como líder mundial. Nos últimos anos, ele também promoveu a noção de que o Oriente está em ascensão e o Ocidente está em declínio.

    Para o povo chinês, a imagem de uma superpotência do “G2” (China e Estados Unidos) serviu como uma representação visual vívida de ambas as narrativas. “A China agora pode falar com os EUA como um verdadeiro igual”, disse Sung.

    Mas os chineses que acompanharam a brilhante cobertura da mídia estatal da viagem de Xi também notaram uma imagem surpreendente: seu líder participando de reuniões a portas fechadas e se misturando com homólogos de outros países sem usar máscara.

    É uma atitude muito distante da cautela pregada de Xi para a Covid em sua primeira viagem ao exterior desde o início da pandemia, dois meses atrás. Quando visitou a Ásia Central em setembro, Xi usou máscara para desembarcar do avião e faltou num jantar do grupo sem uso de máscara, onde os líderes comiam e conversavam em torno da mesa.

    Dessa vez, Xi parecia muito mais confortável com a cara limpa. Ele também participou do jantar do G20, onde trocou apertos de mãos e conversou com líderes, incluindo o primeiro-ministro indiano Narendra Modi.

    De volta para casa na China, no entanto, os lockdowns imediatos e os testes em massa continuam a atormentar os cidadãos, apesar do recente anúncio do governo de flexibilização limitada da sua política de Covid zero. Na metrópole de Guangzhou, no sul do país, os moradores se revoltaram contra um lockdown, derrubando barreiras e marchando pelas ruas. Na cidade de Zhengzhou, região central do país, a morte de uma bebê de 4 meses em quarentena num hotel provocou protestos em todo o país. Foi a segunda morte de uma criança vivendo sob as restrições da Covid neste mês.

    Tendo tido um gostinho do que é viver com a Covid em Bali e Bangcoc, Xi voltou sábado para uma China acuada pela alta de casos e as restrições mais rígidas em muitas cidades.

    Além do primeiro-ministro holandês, Xi também convidou o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, o presidente francês, Emmanuel Macron, e a recém-eleita primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, a visitar Pequim no início do próximo ano.

    Resta saber se eles visitarão uma China livre das restrições da Covid e das potenciais quarentena para viajantes.

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