Texas perdoa ex-sargento dos EUA que matou manifestante do “Black Lives Matter”
Daniel Perry tinha sido condenado a 25 anos de prisão após atirar contra Garrett Foster
Daniel Perry, um ex-sargento do Exército dos Estados Unidos que foi condenado por assassinar um manifestante durantes os protestos do Black Lives Matter em 2020, foi solto nesta quinta-feira (16), depois de ter sido perdoado pelo governador do Texas, Greg Abbott.
A decisão de Abbott ocorre após o Conselho de Perdões e Liberdade Condicional do Texas votar por unanimidade para recomendar um perdão total e a restauração dos direitos de porte de arma de fogo para Perry. O ex-sargento tinha sido condenado em 2023 a 25 anos de prisão.
Pouco depois de ser perdoado, Perry foi solto pelo Departamento de Justiça Criminal do Texas, disse um porta-voz da instituição à CNN.
O governador Greg Abbott pediu ao conselho que conduzisse uma investigação sobre o caso em abril de 2023.
Em um comunicado, o órgão disse que “as investigações incluíram uma revisão meticulosa dos documentos, desde relatórios policiais até registros judiciais, depoimentos de testemunhas e entrevistas com pessoas ligadas ao caso”.
Perry foi acusado de matar Garrett Foster, veterano da Força Aérea de 28 anos, em uma manifestação em Austin, no Texas, dois meses após o assassinato de George Floyd em Minneapolis por policiais.
Pouco depois da condenação em abril de 2023, Abbott afirmou que queria perdoá-lo e emitiu um pedido incomum para o Conselho Estadual de Perdões e Liberdade Condicional para acelerar uma revisão do caso antes que uma sentença fosse proferida.
“Entre os volumosos arquivos revisados pelo Conselho, eles consideraram informações fornecidas pelo Procurador Distrital do Condado de Travis, o relatório investigativo completo sobre Daniel Perry, além de uma revisão de todo o testemunho fornecido no julgamento”, destacou Abbott em um comunicado.
“O Texas tem uma das leis mais fortes de autodefesa, que não pode ser anulada por um júri ou por um promotor progressista. Agradeço ao Conselho por sua investigação completa e aprovo sua recomendação de perdão”, pontuou Abbott.
O governador só poderia perdoar Perry se o Conselho de Perdões e Liberdade Condicional recomendasse, de acordo com a lei do Texas, o que aconteceu.
Doug O’Connell, advogado de Perry, informou que seu cliente está “emocionado” por estar livre e agradeceu a Abbott e ao Conselho de Perdões e Liberdade Condicional do Texas.
“Falei com Daniel esta tarde. Ele está emocionado e feliz por estar livre. Daniel também está otimista com seu futuro”, destacou O’Connell em um comunicado obtido pela CNN.
“Ele queria que esse evento trágico nunca tivesse acontecido e deseja nunca ter que se defender contra as ações ilegais do Sr. Foster. Ao mesmo tempo, Daniel reconhece que a família Foster está de luto. Estamos ansiosos para ver Daniel reunido com sua família e entes queridos”, complementa.
Os promotores disseram que Daniel Perry, o ex-sargento, matou a vítima ao passar por um sinal vermelho e dirigir seu veículo contra uma multidão reunida no protesto.
Garrett Foster, que foi morto, portava um rifle, ação legalizada no Texas, e se aproximou do carro de Perry. Ele fez um sinal para que o ex-policial abaixasse sua janela, momento em que Perry atirou.
“Hoje, um assassino condenado andará pelas ruas do Texas. Os republicanos provaram mais uma vez que não podem manter o público seguro, eles não são o partido ‘contra o crime’, e eles não são o partido da ‘lei e da ordem'”, comentou o presidente do partido Democrata do Texas, Gilberto Hinojosa, em um comunicado.
Ele acrescentou: “Não se enganem: Daniel Perry é um assassino que estava em uma missão para cometer violência contra os texanos, e hoje nosso sistema de Justiça foi sequestrado para ganho político”.
Em nota, a ex-noiva de Foster, Whitney Mitchell, afirmou que está “de coração partido por essa ilegalidade”, acrescentando que Abbott mostrou que “apenas certas vidas importam”.
“Ele nos deixou inseguros. Daniel Perry mandou uma mensagem para seus amigos sobre planos de assassinar um manifestante com quem ele discordava”, disse ela.
“Depois de um longo julgamento, com uma abundância de provas, 12 texanos imparciais determinaram que ele realizou esse plano, e assassinou o amor da minha vida”, pontuou.
“Com esse perdão, o governador profanou a vida de um texano assassinado, impugnou o veredicto justo do júri e declarou que os cidadãos podem ser mortos com impunidade, desde que tenham opiniões políticas diferentes das que estão no poder”, ressaltou Mitchell.
Durante o julgamento de Perry, em maio do ano passado, a acusação pediu que ele fosse condenado a pelo menos 25 anos de prisão.
Eles destacaram uma série de postagens racistas e inflamatórias nas redes sociais que Perry escreveu antes do caso e a própria análise da defesa sobre seus transtornos mentais.
“Este homem é uma arma carregada pronta para disparar em qualquer pessoa, seja preto ou branco”, disse um promotor.
Já a equipe de defesa de Perry argumentou por uma sentença de 10 anos, citando que ele não tinha histórico criminal e convivia com problemas psicológicos, incluindo complexo transtorno de estresse pós-traumático. Além disso, era elogiado por vários de seus colegas militares.
Eles argumentaram que suas ações eram justificadas como autodefesa. Perry disse à polícia que acreditava que Foster iria apontar a arma para ele, de acordo com a afiliada da CNN, KEYE.
A mãe de Foster, Sheila Foster, ficou “em choque” depois de saber do perdão dado por Abbott, de acordo com Quentin Brogdon, ex-advogado da família que falou com ela nesta quinta-feira (16).
“Dizer que ela está devastada é um eufemismo”, comentou Brogdon à CNN em uma entrevista por telefone.
A família tinha entrado com um processo civil contra Perry, mas abandonou o caso depois que ele foi condenado no ano passado, informoy Brogdon, acrescentando que a família irá considerar todas as vias legais possíveis, mas as perspectivas são “sombrias.”
“É difícil acreditar que esse perdão não tenha algum tipo de motivação política”, afirmou Brogdon, citando o envolvimento de Abbott no caso depois que comentaristas conservadores criticaram a condenação de Perry no ano passado.
Perry foi diagnosticado durante julgamento
Greg Hupp, psicólogo que examinou Perry duas vezes em 2023, o diagnosticou com transtorno complexo de estresse pós-traumático e transtorno do espectro do autismo.
Combinado com sua experiência militar, Perry tinha uma mentalidade de “nós contra eles”, na qual acreditava que: “Eu me protejo. Estou pronto para qualquer ataque iminente e qualquer coisa lá fora pode ser uma ameaça potencial”, destacou Hupp.
No interrogatório, a acusação observou que os registros militares não indicam nenhuma dessas questões psicológicas.
Postagens sobre matar manifestantes
Documentos relacionados ao caso, que foram revelados por um juiz do Condado de Travis após a condenação de Perry, mostram que ele tinha um histórico anual de fazer postagens racistas nas redes sociais.
Em um post no Facebook de maio de 2020, apenas algumas semanas antes do crime, Perry disse a um amigo que “poderia ter que matar algumas pessoas” que estavam manifestando em frente a sua casa.
Os documentos também contêm um texto de maio de 2020 enviado por Perry que dizia: “Eu poderia ir a Dallas para atirar em manifestantes.” Algumas mensagens incluíam memes de “poder branco”.
Perry escreveu em uma postagem de 2019 que era “muito ruim não podermos ser pagos por caçar muçulmanos na Europa.”
Em 1 de junho de 2020, em postagens nas redes sociais, Perry comparou o movimento Black Lives Matter a “um zoológico cheio de macacos que estão surtando”, mostram os documentos.
Clint Broden, advogado de Perry, criticou a liberação dos documentos em um comunicado à CNN, dizendo que foi uma decisão política dos promotores.