Em rara entrevista, rei da Tailândia diz que ama manifestantes ‘do mesmo jeito’
O rei tailandês fez seus primeiros comentários públicos sobre as manifestações pró-democracia, que dominam o país há mais de quatro meses
Com o aumento dos protestos antigovernamentais em massa em toda a Tailândia e mais pedidos pela reforma da monarquia, o rei Maha Vajiralongkorn chamou seu país de “a terra do compromisso”, sugerindo que pode haver uma saída para o impasse político de meses de duração.
O rei tailandês fez seus primeiros comentários públicos sobre as manifestações pró-democracia, que dominam o país há mais de quatro meses, em uma rara entrevista conjunta entre a CNN e o Channel 4 News durante uma cerimônia real no Grande Palácio de Bangkok no domingo (1º).
Questionado sobre o que diria aos manifestantes que estão nas ruas pedindo reformas, o rei Vajiralongkorn respondeu “sem comentários”, antes de acrescentar: “Nós os amamos do mesmo jeito. Nós os amamos do mesmo jeito. Nós os amamos do mesmo jeito”.
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Quando perguntado se havia espaço para um acordo com os manifestantes que estão exigindo uma restrição de seus poderes, Vajiralongkorn disse que “a Tailândia é a terra do acordo”.
Foi a primeira vez que o monarca, de 68 anos, falou à mídia estrangeira desde 1979, época em que ainda era príncipe herdeiro.
Em uma rara ação do palácio, membros da imprensa internacional foram convidados a se sentar no meio da multidão de apoiadores monarquistas que esperavam para ver o rei.
Normalmente, apenas as equipes de notícias reais têm permissão para cobrir este tipo de função real anual, especialmente no Grande Palácio – um sinal de que o rei pode estar ansioso para melhorar sua imagem internacionalmente, já que o movimento de protesto em massa representa um desafio direto ao seu governo.
No domingo, o rei participou de uma cerimônia religiosa para marcar a mudança de estação no Grande Palácio. O rei mudou o traje da estátua do Buda de Esmeralda (a estátua mais importante do Buda na Tailândia) marcando a transição oficial da estação chuvosa para o inverno.
Vestidos de amarelo, milhares de apoiadores pró-monarquia se reuniram no palácio e foram recebidos pelo Rei Vajiralongkorn, Rainha Suthida e a filha do Rei, Princesa Sirivannavari.
A princesa disse à CNN que a Tailândia é um país pacífico, dizendo “nós amamos o povo tailandês, não importa o que aconteça”.
Protestos liderados por estudantes acontecem quase diariamente em toda a Tailândia desde julho, atraindo dezenas de milhares de pessoas que pedem uma nova constituição, a dissolução do parlamento e a renúncia do primeiro-ministro Prayut Chan-o-cha, o ex-general do exército que tomou o poder em um golpe de 2014.
Uma das principais demandas das manifestações foi a reforma da poderosa monarquia da Tailândia para garantir que o rei obedecesse à constituição.
É o maior desafio para o governo em décadas, com os jovens quebrando publicamente tabus arraigados de falar abertamente sobre a família real em público. A Tailândia tem algumas das leis de lesa-majestade mais rígidas do mundo: criticar o rei, a rainha ou o herdeiro aparente pode levar a uma pena máxima de 15 anos de prisão.
Com o país enfrentando uma crise econômica exacerbada por medidas para controlar a pandemia do coronavírus, os manifestantes começaram a examinar a imensa riqueza e poder do rei Vajiralongkorn.
O rei consolidou seu poder expandindo sua própria unidade militar, a Guarda do Rei.
Ele também aumentou enormemente sua riqueza pessoal e transferiu bilhões de dólares em ativos reais mantidos pela coroa tailandesa diretamente para seu controle.
Os manifestantes dizem que a Tailândia não pode alcançar a verdadeira democracia até que o sistema que governa de cima para baixo, formado pela monarquia, militares e elites políticas ricas, seja reformado.
Os comentários do rei ocorrem em um momento em que a crise política na Tailândia corre o risco de se transformar em um problema diplomático com a Alemanha, país no qual o rei tailandês passa grande parte de seu tempo.
Na segunda-feira (26) passada, milhares de manifestantes tailandeses marcharam até a embaixada alemã em Bangcoc, pedindo ao governo alemão que investigue se o rei conduziu negócios com o estado durante seu tempo no país.
Em uma carta enviada à Embaixada da Alemanha na Tailândia, os manifestantes também solicitaram que o governo alemão investigasse os registros fiscais do rei.
O governo alemão disse que seria inaceitável para Vajiralongkorn conduzir a política de seu país a partir da Alemanha, e o ministro das Relações Exteriores do país, Heiko Maas, disse que continua investigando suas atividades enquanto estiver em solo alemão.
“Estamos monitorando isso a longo prazo”, disse Maas em entrevista coletiva na segunda-feira. “Isso terá consequências imediatas se houver coisas que consideramos ilegais”.
Em uma sessão extraordinária do parlamento também na segunda-feira, o primeiro-ministro Prayut rejeitou pedidos de partidos de oposição para renunciar, mas indicou que o governo apoiava emendar a constituição.
A sessão não produziu nenhum resultado para aliviar a crise política; em vez disso, foi proposta a formação de um comitê de reconciliação nacional.
O rei retornou à Tailândia no início de outubro para uma série de deveres reais e funções oficiais.
Dezenas de manifestantes foram presos sob um decreto de emergência imposto logo após a chegada do rei à Tailândia.
As medidas de emergência, que proibiram reuniões públicas de mais de quatro pessoas na capital, aconteceram depois de mais de uma semana de protestos antigovernamentais diários em Bangkok e outras cidades.
As acusações variam de delitos menores a crimes mais graves, como insubordinação, que pode render sete anos de prisão, e violação da Lei de Crimes Informáticos. Dois ativistas foram presos sob a acusação de tentativa de violência contra a rainha, depois que sua carreata foi obstruída por multidões antigovernamentais. Eles enfrentam uma possível sentença de prisão perpétua.
Depois, o primeiro-ministro Prayut, com a aprovação do rei, suspendeu as medidas. Mas as manifestações continuam.
Jonathan Miller e Kocha Olarn relataram de Bangkok, Tailândia, Helen Regan escreveu em Hong Kong. Com relatórios adicionais da Reuters.
(Texto traduzido, clique aqui para ler o original em inglês).