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    Putin não se importa com sanções do Ocidente e quer “mundo desintegrado”, diz Teitelbaum

    Segundo o professor da Universidade do Colorado, nos Estados Unidos, as razões do presidente da Rússia são religiosas e transcendem motivos usuais de guerras contemporâneas

    Presidente da Rússia, Vladimir Putin
    Presidente da Rússia, Vladimir Putin 24/02/2022Sputnik/Aleksey Nikolskyi/Kremlin via REUTERS

    Alexandre Borgesda CNN

    Pesquisador da ideologia de movimentos nacionalistas, populistas e neofascistas, o professor da Universidade do Colorado Benjamin Teitelbaum, autor de “Guerra pela Eternidade” (Ed. Unicamp, 2020), conversou com a CNN e analisou as razões de o presidente da Rússia, Vladimir Putin, invadir a Ucrânia.

    Teitelbaum destaca que “as sanções e o isolamento imposto aos russos agradam Putin”, porque na visão do acadêmico, “ele quer um mundo desintegrado”, o que o faz não “se importar com as sanções econômicas impostas pelo Ocidente após o início da guerra”.

    Segundo Teitelbaum, que estudou as principais teorias que inspiram Putin a expandir a presença russa em países vizinhos, suas razões são essencialmente religiosas e transcendem os motivos usuais das guerras contemporâneas.

    De acordo com Teitelbaum, elas são influências do filósofo e cientista político Aleksandr Dugin, 60 anos, um conselheiro e diplomata informal do governo Putin e promotor do “eurasianismo”, ideologia que se opõe ao liberalismo, comunismo e fascismo.

    Dugin tem dezenas de livros publicados e é popular na elite russa – especialmente na burocracia estatal e no primeiro escalão das forças armadas.
    Nesta entrevista exclusiva para a CNN, Teitelbaum analisa como as ideias de Dugin influenciam Putin, a política externa russa e tem como objetivo a instauração de uma nova ordem mundial “desintegrada”, multipolar e com modelos civilizacionais alternativos ao globalismo ocidental progressista e a democracia liberal.

    O professor da Universidade do Colorado Benjamin Teitelbaum
    O professor da Universidade do Colorado, nos EUA, Benjamin Teitelbaum / Foto: Patrick Campbell/University of Colorado

    1. Qual a real influência de Alexandr Dugin na política externa russa atual e em Vladimir Putin?

    Alexandr Dugin é certamente um filósofo muito influente na Rússia atual. Ele não ficou isolado nos círculos acadêmicos, tendo uma produção intelectual importante para o aparelho estatal russo, mais especificamente para a elite das forças armadas, há muito tempo. Ele é também uma personalidade midiática, tanto nos seus canais próprios como na mídia estatal russa.

    O mais importante papel de Dugin, entretanto, é ser um diplomata informal da Rússia na Europa, Turquia e, em especial, Irã e Síria.

    Em todos os casos, sua atuação é direcionada a diminuir a influência americana e aumentar o alinhamento destes atores com as posições russas. Ele tem sido muito bem sucedido na Turquia e já foi bastante influente na extrema-direita europeia, mas essa influência diminuiu consideravelmente nos últimos tempos.

    2. Como essa guerra se alinha com as ideias de Dugin? Ele é a favor da guerra?

    Dugin apoia a guerra atual sem dúvida, assim como apoiou a anterior contra a Ucrânia [iniciada em 2014] e o ataque à Geórgia [ocorrido em 2008]. Ele acredita que a Rússia não tem apenas uma justificativa geopolítica e econômica para expandir seu território, mas também espiritual, com destaque para as antigas repúblicas soviéticas.

    Dugin está feliz com o fato de Putin usar argumentos culturais e espirituais para justificar a invasão e as ligações entre russos e ucranianos em vez de razões “seculares”, políticas ou econômicas. Para ele, Putin está cumprindo uma missão espiritual ao ignorar as atuais fronteiras nacionais e impor as suas próprias.

    Tanto como demonstração de força como do início de uma “nova era”, Dugin está realmente feliz com a postura de Putin de mostrar ao mundo que a Rússia controla seu próprio destino.

    Outro ponto que eu gostaria de destacar é que as sanções e o isolamento imposto aos russos também agrada Putin, ele quer um mundo “desintegrado”, sem controles unificados, sem uma ordem global única e sem uma “verdade universal”.

    Putin quer um mundo com vários modelos econômicos concorrentes e visões inteiramente distintas do que é verdadeiro, virtuoso e bom, o que faz com que ele não se importe com as sanções econômicas impostas pelo Ocidente após o início da guerra.

    Presidente da Rússia, Vladimir Putin, em Moscou / Foto: Sputnik/Mikhail Klimentyev/Kremlin via Reuters (22/02/2022)

    3. Há semelhanças entre a visão imperialista da Rússia atual e da Alemanha Nazista?

    A semelhança está na justificativa das invasões. No discurso de Putin, não há qualquer consideração sobre o que a maioria dos ucranianos pensa ou quer, apenas menções às ligações culturais e históricas entre as duas nações, além de algumas críticas laterais ao sistema econômico da Ucrânia.

    Em essência, Putin disse “eu tenho direito de fazer isso, eu posso fazer e vou fazer”. Claro que ele quer também uma distância segura entre a Rússia e os países da Otan.

    4. Como o sr. vê as declarações de Putin sobre uma ação de “desnazificação” da Ucrânia?

    Nada mais que um recurso retórico que está na moda e que a Rússia usa desde a Segunda Guerra. Existem grupos de extrema-direita na Ucrânia como o Batalhão de Azov, mas não há mais neonazistas lá do que existem na própria Rússia.

    O único motivo de se ouvir falar destes grupos ucranianos é que há um vácuo de poder no lado leste do país que deram a eles um pouco mais de relevância.

    Putin está usando estes grupos apenas para ter uma justificativa moral para a invasão, mas não é um assunto que interesse Dugin.

    Como um Tradicionalista, o filósofo vê o nazismo pela mesma lente que enxerga o comunismo e o liberalismo, ideologias políticas “progressistas” e cientificistas que prometem o melhor futuro possível ao enterrar o passado.

    É verdade que Dugin se encantou com o nazismo na juventude, mas com a maturidade passou a considerar esta ideologia apenas uma distração tola criada pelos modernistas que ele quer ver destruída como todas as outras.