Candidato à presidência é preso após alegar fraude eleitoral no Paraguai
Paraguayo Cubas teria liderado manifestação em frente ao Tribunal Superior de Justiça Eleitoral, criticando o resultado das eleições e pedindo recontagem de votos; policiais apreenderam pedaços de pau e até um arco e flecha
O candidato à presidência do Paraguai pelo partido Cruzada Nacional, Paraguayo Cubas, foi preso na noite desta sexta-feira (5) após liderar protestos contra o resultado das eleições presidenciais, com manifestantes alegando fraude. De acordo com o jornal ABC, ele é alvo de cinco acusações: perturbação da paz pública, ameaça de atos puníveis, tentativa de interrupção das eleições presidenciais, tentativa de coerção a órgãos constitucionais e resistência.
O ato ocorreu pela manhã nas ruas da capital Assunção. Cerca de 100 pessoas se reuniram em frente à sede do Tribunal Superior de Justiça Eleitoral paraguaio. Paraguayo Cubas ficou em terceiro lugar nas eleições presidenciais do último domingo (30). A alegação é que houve fraude eleitoral e, por isso, eles exigem uma recontagem de votos.
Cerca de 500 policiais foram destacados ao local para evitar depredações. Os agentes realizaram um bloqueio parcial na Avenida Eusebio Ayala para evitar congestionamentos e facilitar a atuação.
A polícia apreendeu vários porretes e pedaços de pau que estavam com os manifestantes. Até mesmo um arco e flecha foi apreendido pelas forças policiais.
As eleições do último domingo consagraram Santiago Peña, candidato do governista Partido Colorado, que teve 43% dos votos. Sua vitória consolidou o poder da direita no Paraguai, dando força à legenda para renegociar o contrato do fornecimento de energia da Usina de Itaipu com o Brasil.
Peña derrotou Efraín Alegre, do Partido Liberal, que ficou em segundo lugar, com 27% dos votos, à frente de Cubas.
Onda de protestos
O Paraguai se soma a uma série de países que enfrentaram protestos logo após suas eleições presidenciais, com apoiadores de candidatos derrotados alegando fraude eleitoral e pedindo recontagem de votos. No continente americano, soma-se aos Estados Unidos, que, em janeiro de 2021, foram palco de uma violenta invasão ao Capitólio, sede do Poder Legislativo, por parte dos apoiadores do republicano Donald Trump, que concorria à reeleição.
Em 8 de janeiro deste ano foi a vez de o Brasil ser palco de violentos ataques contra os principais prédios dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, por parte dos eleitores do ex-presidente Jair Bolsonaro, que também concorria à reeleição.
Vanuccio Pimentel, doutor em ciência política, falou à CNN sobre a tensão no país. Ele, que já atuou como observador internacional da Organização dos Estados Americanos (OEA) no Paraguai, afirma que contestar o resultado das eleições é algo corriqueiro no País, mas que as movimentações desta sexta-feira fogem ao padrão histórico: “O questionamento às eleições democráticas, no contexto que a gente vive hoje, está conectado internacionalmente com uma estratégia da extrema-direita global, que é de questionar o funcionamento das instituições e tentar corroer as instituições por dentro”.
O internacionalista Rodrigo Reis, fundador do Instituto Global Attitude, segue o mesmo raciocínio: “É algo menos coordenado e sim mais uma tendência, uma ferramenta no arsenal da extrema-direita muitas vezes de tumultuar ou questionar esse processo”.
Pimentel adverte que há riscos de haver conflitos violentos no País nos próximos dias: “Recentemente, o Paraguai passou por muitas conturbações políticas e que tiveram consequências graves, com pessoas mortas, com conflito com a polícia. Então, é necessário observar, porque há essa possibilidade, sim, de que isso escale para um conflito maior”.
Entretanto, o cientista político não acredita que os atos possam descambar para algo no padrão visto em Washington e em Brasília. Ao menos não agora. “Talvez, neste momento, ele não tenha ainda uma força política suficiente para desestabilizar o país e o ambiente político. O apoio político que ele tem ainda não dá densidade para realmente promover um realinhamento completo institucional no País”.
Reis também destaca os precedentes no Paraguai como um fator que deve ser levado em conta. “Isso pode se desdobrar em coisas muito maiores até chegar ao envolvimento de militares, golpe de Estado. Já aconteceu em outros momentos, em outras democracias frágeis”.
África na berlinda
Além do continente americano, a África também registrou casos de incidentes políticos que eclodiram após eleições. Em agosto do ano passado, Raila Odinga, que ficou em segundo lugar na eleição presidencial do Quênia, entrou com recurso na Suprema Corte contra os resultados, que celebraram o então presidente Uhuru Kenyatta como apto a prorrogar seu mandato.
Em março deste ano, os incidentes ocorreram na Nigéria, com o terceiro colocado no pleito, Peter Obi, contestando o resultado, que consagrou Bola Tinubu.
O doutor em ciência política Vanuccio Pimentel faz questão de dissociar essas movimentações do que vem ocorrendo nas Américas: “A gente precisa considerar que, da África subsaariana, o único país que a gente pode considerar politicamente estável é a África do Sul. Todos os demais sempre passaram por conturbações, e todas elas sempre têm o caráter étnico, o caráter tribal, porque, muitas vezes, as divisões políticas atuais não respeitaram os antigos territórios tribais e os antigos territórios étnicos que havia”, explica. “Então, essa questão étnica sempre acaba desembocando também em conflitos políticos, como a gente já viu em Ruanda, como a gente já viu no Sudão do Sul”.
O internacionalista Rodrigo Reis, por outro lado, vê um paralelo entre os dois continentes. “Não necessariamente são os mesmos grupos, mas é uma vertente política, é um espectro político que se utiliza dessa tendência de, mais uma vez, desconstruir ou tentar desconstruir a legitimidade das eleições”.