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    O que será preciso para ucranianos vencerem, segundo militar aposentado dos EUA

    Mike Repass diz que forças da Otan deveriam criar brigadas para repelir russos e manter controle das fronteiras ucranianas

    Soldado ucraniano em frente a tanque russo destruído em Kharkiv
    Soldado ucraniano em frente a tanque russo destruído em Kharkiv Reuters

    Peter Bergenda CNN

    O ex-comandante do Comando de Operações Especiais dos Estados Unidos na Europa e general aposentado do Exército dos EUA, Mike Repass, diz que a comunidade internacional precisa aumentar muito seu apoio à Ucrânia para a nação em apuros ser capaz de expulsar os russos em algum momento.

    Repass assessorou os militares ucranianos nos últimos seis anos em um contrato com o governo dos EUA.

    No mês passado, ele visitou a Polônia e o oeste da Ucrânia para ter uma ideia melhor da trajetória da guerra na Ucrânia. Falei com ele na sexta e na segunda-feira.

    Ele diz que a cadeia de suprimentos ucraniana para equipamentos militares é ineficiente e que forças militares adicionais são necessárias para expulsar os russos da Ucrânia.

    Para vencer a guerra na Ucrânia, Repass defende que os EUA e seus aliados construam uma força estratégica ucraniana de cinco brigadas de até 40 mil soldados capazes de montar operações ofensivas para expulsar os russos de seu país.

    Esclarecimento: Repass faz parte do conselho consultivo da Global Special Operations Foundation, onde sou o presidente do conselho. Nossa conversa foi editada para maior clareza e duração.

    Bergen: O que você aprendeu em sua viagem?

    Repass: Primeiro, que a Ucrânia ainda precisa de muita ajuda. Segundo, a Otan está se movendo muito devagar. Terceiro, não temos visibilidade do que acontece com o equipamento militar quando chega à Ucrânia.

    O negócio de fornecimento de equipamentos militares é personalizado e não profissionalizado: a alta liderança estabelece as prioridades de distribuição e, pelo que pude observar, essas prioridades não se baseiam no entendimento das taxas de consumo, das operações futuras ou de dados objetivos.

    É baseado no comandante da brigada X ou setor Y chamando e dizendo: “Ei, eu preciso de 27 mísseis Javelin”. Então, é altamente personalizado, e não é assim que se administra a logística de guerra.

    O que deveria estar acontecendo é que deveria haver uma compreensão de quais são as taxas de consumo de coisas importantes como combustível, munição, baterias.

    Bergen: O resultado provável na Ucrânia é um conflito sangrento que irá estender?

    Repass: Os três cenários futuros óbvios são: a Rússia ter uma decisão no campo de batalha a seu favor, os ucranianos terem uma decisão no campo de batalha a seu favor ou existir um impasse. Dois dos três resultados dão à Rússia uma vitória.

    No cenário de impasse, a Rússia simplesmente reivindicaria a vitória com base em fatos e continuaria sua ocupação na Ucrânia em um futuro contínuo.

    Isso daria à Rússia não uma vitória completa sobre a Ucrânia, mas ainda assim, uma vitória com terras sob controle russo.

    Então, o que nós, o Ocidente, estamos fazendo coletivamente para garantir que duas dessas três possibilidades não aconteçam?

    Todo mundo está pensando agora na luta imediata, o que significa que estamos levando suprimentos para os ucranianos. O problema é que o exército ucraniano precisa de capacidades adicionais para poder expulsar a Rússia da Ucrânia.

    Bergen: Por quê?

    Repass: Porque eles não têm poder de combate suficiente para fazer isso, ou seja, equipamentos, poder de fogo e soldados suficientemente treinados no momento.

    A Rússia sempre terá mais forças, não necessariamente forças melhores, mas mais forças. Como Stalin disse uma vez, “a quantidade tem uma qualidade própria”.

    A maioria das pessoas reconhece que esta será uma batalha de atrito e, em algum momento, começará a inclinar a favor da Rússia, a menos que forças ucranianas adicionais sejam geradas.

    Acho que há uma percepção crescente entre os países da Otan e a comunidade internacional de que teremos que fazer algo além de só fornecer recursos para a luta atual da Ucrânia.

    Portanto, existem quatro coisas que os EUA e seus aliados precisam fazer. Primeiro, precisamos enfraquecer a Rússia através do fortalecimento das capacidades ucranianas.

    Em segundo lugar, precisamos deter ainda mais a Rússia, aumentando as nossas capacidades e as da Otan. Terceiro, degradar as forças e capacidades armadas da Rússia.

    Finalmente, precisamos garantir a derrota da Rússia na Ucrânia, e isso é feito através da construção de uma força de reserva estratégica e operacional para a Ucrânia que possa realizar operações ofensivas para expulsar os russos da Ucrânia e proteger suas fronteiras.

    Bergen: Como é isso na prática?

    Repass: Você precisa ter os EUA, os franceses, os poloneses, o Reino Unido e os alemães, cada um construindo o equivalente a uma brigada de poder de combate ucraniano.

    Essas nações têm uma significativa capacidade militar e podem gerar forças equipando unidades ucranianas e treinando-as em suas próprias nações.

    Então, seriam cinco brigadas, em cinco setores operacionais. E você precisaria provavelmente de seis a oito meses para implementar isso.

    Essas cinco brigadas teriam equipamentos ocidentais lutando de maneira ocidental, uma abordagem integrada de batalha ar-terra onde você tem todos os meios disponíveis para você, incluindo tanques interoperáveis da Otan, apoio aéreo e defesa aérea.

    Bergen: Cinco brigadas não é um número muito grande, certo?

    Repass: Não, não é. Acho que é viável a curto prazo. Em uma brigada há até 8 mil soldados ou mais, ou seja, até cerca de 40 mil pessoas em cinco brigadas. Acredito que os ucranianos são capazes de encontrar esse tanto de soldados, dada a atual emergência nacional.

    Historicamente, quando um exército ocidental enfrentou um exército que é suprido pelos russos, o exército apoiado pelos russos foi totalmente aniquilado por um número inferior de forças, como foi o caso, por exemplo, durante a primeira Guerra do Golfo, quando os militares dos EUA destruíram grande parte do exército de Saddam Hussein, no Kuwait.

    Sabemos que os armamentos ocidentais têm uma vantagem qualitativa significante sobre os equipamentos russos, de modo que os números e as proporções de força são distorcidos quando são equipamentos militares ocidentais contra equipamentos fabricados na Rússia.

    Bergen: Por que os russos se apegam a um modelo que realmente não funciona bem?

    Repass: Eles são obstinados em seus caminhos. Especificamente, o que eles tentaram fazer no início da guerra na Ucrânia foi um golpe de Estado, tentando derrubar Kiev com um ataque rápido. Isso não funcionou. As tropas russas foram entregues a própria sorte.

    Então, eles trouxeram todo o seu poder de fogo para o leste e para o sul, empregando artilharia maciça no objetivo ou ao longo de suas avenidas de abordagem.

    Depois de destruir quase tudo que encontravam à frente, eles avançam suas tropas metodicamente. Portanto, não é uma guerra de manobras. É guerra de atrito pelo fogo. É um exército baseado em fogo, ao contrário do que temos no Ocidente, que é um exército baseado em manobras.

    Bergen: O que você acha do novo comandante russo na Ucrânia, o general Aleksandr Dvornikov?

    Repass: Ele é uma pessoa totalmente a favor da guerra de atrito baseada em fogo. Ele não é um cara de guerra de manobras.

    Ele vai continuar fazendo tudo o que fez a vida toda, que é explodir e destruir tudo em seu caminho, e então enviar as tropas.

    Essas tropas evacuarão à força os cidadãos ucranianos para garantir que não haja potencial para um movimento de resistência no pedaço de terra que é uma ponte para a Rússia através de Donbass para a Crimeia.

    Bergen: Como você caracterizaria o estado da guerra no leste e no sul agora? Os russos pensam que estão ganhando

    Repass: A situação atual é que a Rússia está fazendo avanços metódicos tanto no norte quanto no sul. Está tentando fixar as forças que defendem no leste e cercar os defensores ucranianos, para depois derrotá-los no sul.

    Os russos também querem cercar Mykolaiv, reduzir a defesa e destruir quem está lá para defender, e depois ter um caminho livre até Odessa. Eles não podem chegar a Odessa até que cerquem ou destruam as forças ao redor de Mikolaiv.

    Bergen: E por que Odessa é o prêmio?

    Repass: Porque isso completa a separação da Ucrânia do Mar Negro, e também é a porta de entrada para a Transnístria e a Moldova.

    Bergen: O que você achou dos comentários do general russo sobre ir para a Moldova? Você os aceita pelo valor nominal?

    Repass: Eu considero isso uma séria ameaça e acho que eles estão de olho na Moldova. Se eles puderem invadir, eles irão.

    Para ser específico, eles falam sobre ir para a Transnístria. Se eles puderem construir uma ponte terrestre do sul para a Transnístria, eles o farão. Isso colocará a Rússia às portas da Moldova e a Moldova não poderá se defender efetivamente contra uma invasão russa.

    Bergen: A guerra na Ucrânia está ampliando?

    Repass: É fato que Belarus tem sido um paraíso para a Rússia desde o início da guerra, em 24 de fevereiro. Os europeus com quem conversei firmemente acreditam que Belarus é um estado-cliente, é controlado e essencialmente governado por Moscou.

    Belarus não contribuiu com unidades militares para a luta, mas abrigou, baseou e apoiou as forças russas. Eles permitiram que fossem lançadas operações de seu território – mísseis terrestres, aéreos e de precisão foram lançados de lá.

    As autoridades de Putin também disseram que o Báltico não tem base histórica e são estados ilegítimos – a mesma coisa que disseram sobre a Ucrânia antes da guerra.

    Os três estados bálticos e a Polônia acreditam firmemente que, depois da Ucrânia, são os próximos alvos na lista da Rússia. Eles vêem a Rússia como uma ameaça existencial. E não há evidências de que Putin esteja disposto a parar na Ucrânia.

    Bergen: E quanto a toda essa retórica nuclear? Você acha que é apenas uma questão de postura?

    Repass: Sim, acho que é principalmente postura. Seria uma coisa se Putin dissesse isso. Já o ministro das Relações Exteriores, Lavrov, dizer isso, é outra coisa. Acho que só uma questão de postura se vier de Lavrov.

    Na doutrina nuclear deles, eles usarão as chamadas armas nucleares táticas se sentirem que há uma ameaça significativa à pátria russa. Esse é o tipo de circunstâncias que a Rússia comunicou ao Ocidente em que usaria suas armas nucleares.

    Bergen: Então, é um limite alto.

    Repass: Certo.

    Bergen: Como resultado do naufrágio do Moskva, em meados de abril, o navio cruzador de mísseis russo que servia como capitânia da Frota do Mar Negro, você acha que os chineses estão observando isso e refletindo sobre se atacar Taiwan seria uma atitude inteligente?

    Repass: Sim, eu acho. Não apenas o naufrágio do Moskva, mas também a capacidade de uma oposição sólida e bem treinada de deter uma invasão.

    A Rússia está sendo muito degradada por uma força numericamente inferior, e eles não têm uma ponte de água para atravessar. Eles estão cruzando a Ucrânia por terra, enquanto os chineses teriam que atravessar 160 quilômetros de água para chegar a Taiwan. Então, eles devem estar pensando que isso vai ser muito mais difícil do que o esperado.

    Bergen: Se você fosse Putin hoje, como estaria se sentindo?

    Repass: Provavelmente melhor do que no dia seguinte ao afundamento do Moskva. Eu acho que ele provavelmente está se sentindo confuso e conflitante, mas percebe que ele tem que pressionar para obter uma vitória aqui.

    E ele é mantido em cativeiro por uma fera de sua própria criação, pois raramente usa a internet. Você nunca o viu em um computador e, pelo menos até o final de 2020, ele supostamente não tinha um iPhone.

    Ele não tem conexão com o mundo exterior e todas as suas informações são fornecidas a ele por seu círculo interno ou pelo que ele lê na mídia da Rússia, que é, obviamente, controlada pelo Estado e apenas emite mensagens controladas pelo Estado. Então, ele está em uma bolha do tipo norte-coreana e não está recebendo informações precisas.

    Bergen: Começar uma guerra, muitas vezes é a parte mais fácil. As guerras têm sua própria lógica. Infelizmente, essa guerra pode durar um ano ou até dois anos.

    Repass: Temo que você esteja certo. Esta será uma guerra esmagadora e agonizante se durar mais de um ano, e acho que vai durar pelo menos dois anos. Mas não podemos deixá-la entrar em um impasse. Se entrar em um impasse, Putin reivindicará o sucesso seguido de uma ocupação brutal do território ucraniano que ele controla.

     

    Nota do Editor: Peter Bergen é analista de Segurança Nacional da CNN, vice-presidente da New America e professor na Universidade do Estado do Arizona. Seu próximo livro é “The Cost of Chaos: The Trump Administration and the World” (“O Custo do Caos: A Administração de Trump e o Mundo”, em tradução livre)

    Este conteúdo foi criado originalmente em inglês.

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