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    Novas regras de Portugal para imigrantes geram dúvidas; entenda

    Governo português anunciou plano que dificulta entrada no país; medida exigirá contrato de trabalho e fim das manifestações de interesse

    Wilson Ledoda CNN

    Após a apresentação do plano do governo português para as imigrações, as opiniões dos especialistas dividem se o novo pacote respeita ou não a Constituição e os tratados europeus.

    As novas regras para a imigração têm gerado dúvidas, sobretudo para aqueles que estão habituados aos limites das leis e da própria Constituição.

    Há um aspecto fundamental que alimenta a divisão de opiniões entre os especialistas: a exigência de um contrato de trabalho para a entrada dos imigrantes em Portugal, com o fim das manifestações de interesse.

    O mecanismo chamado “manifestação de interesse”, amplamente usado durante anos, permitiu que imigrantes de fora da União Europeia, sem um contrato de trabalho, se mudassem para Portugal e solicitassem residência após pagarem previdência social por um ano.

    Entenda abaixo os motivos que as regras poderiam ser consideradas inconstitucionais pelos especialistas.

     

     

    Motivo 1: a esfera de atuação do Governo

    A lei da imigração contém várias normas que correspondem a direitos, liberdades e garantias. Para alterar estes direitos, liberdades e garantias, era necessária a intervenção da Assembleia da República. Sozinho, o Governo não teria poder.

    “Seria uma questão de inconstitucionalidade orgânica, por ser reserva de competência da Assembleia da República”, explica o constitucionalista João Miranda à CNN Portugal.

    Ana Rita Gil, jurista, especializada na área das migrações e direitos humanos, admite que há colegas fazendo esta interpretação, mas ela discorda. A jurista considera ser uma “simples opção do Governo criar este mecanismo”, que não choca, na sua opinião, com direitos, liberdades e garantias.

    Motivo 2: as expectativas criadas com as regras anteriores

    Entre quem entende bem os caminhos das leis sobre imigração, há uma preocupação comum sobre as novas regras.

    Para os novos imigrantes vai ser aplicado o quadro novo, para os processos já iniciados, a garantia é de que tudo se mantenha como até agora.

    Mas há uma terceira via no meio. E é essa que gera receios de inconstitucionalidade.

    Para a jurista Ana Rita Gil, há pessoas que vieram para o país sabendo que haveria uma regularização ao fim de um ano e que ainda não fizeram o pedido. “Estavam à espera e agora já não o podem fazer”, o que acabaria por configurar uma diferença de tratamento”, disse.

    Estes imigrantes, a jurista explica, teriam ido à Portugal na expectativa de uma regularização, já que a lei prometia esse cenário ao fim de um ano.

    “Onde tenho dúvidas é sobre a legitimidade dessas expectativas”, uma vez que entraram de forma ilegal, conta.

    Já Joana Alves de Oliveira opina que o regime transitório para os pedidos já apresentados junto da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) – cerca de 400 mil, a quem se aplicam as regras em vigor – deixa de fora “situações mais precárias, não equacionadas pelo plano de ação”.

    “A meu ver, não é conforme com o direito nacional nem com o direito europeu. Porque apenas se prevê a equação de regime transitório para quem tenha contrato de trabalho realizado e descontos para a Segurança Social”, explica.

    Oliveira questiona ainda se não haverá tratamentos diferentes a partir de agora nos postos consulares, uma vez que não ficou claro “se, para as pessoas que já tinham feito o agendamento, é suficiente a manifestação de interesse ou já é exigido um contrato de trabalho ou contrato-promessa de trabalho”.

    Motivo três: os tratados europeus

    Há um terceiro aspecto que pode pesar na hora de avaliar a possível inconstitucionalidade do plano de ação do governo português para as migrações: a integração europeia de Portugal.

    “É duvidoso que fazer depender [a liberdade de circulação] do estabelecimento formal de uma relação contratual se enquadre no âmbito dos tratados que instituíram a União Europeia”, adianta o constitucionalista Pedro Bacelar de Vasconcelos, afirmando não ter ainda uma posição definida sobre o assunto.

    Joana Alves de Oliveira ainda disse à CNN Portugal, que lembra agora que “a política migratória é europeia, não nacional, dando-se um espaço muito curto para a concretização da política nacional”.

    Outro caminho possível

    Uma vez que o Presidente da República já promulgou o plano, não levantando quaisquer reparos sobre a sua constitucionalidade, há um outro caminho político para as novas regras acabarem no crivo dos juízes do Tribunal Constitucional.

    Neste caso, os deputados teriam que apresentar um pedido de fiscalização sucessiva. Para isso seria necessário reunir 1/10 dos parlamentares, o que significa 23 deputados.

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