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    Na ONU, Bolsonaro abre mão de falar para o mundo e discursa para apoiadores

    Analistas ouvidos pela CNN apontam como presidente escolheu divulgar versões que costuma repetir no ‘cercadinho’ para a plateia global

    Flávio Freirecolaboração para a CNN

    Ao discursar na abertura da Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) na manhã desta terça-feira (21), o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) não atuou a favor de operações multilaterais e usou os 12 minutos de projeção internacional para reforçar sua defesa de políticas domésticas e do viés conservador que o aproxima de uma parcela do eleitorado, segundo analistas políticos ouvidos pela CNN.

    A avaliação é que o presidente optou por alimentar os conceitos que já vinha defendendo como forma de tentar se manter em sintonia também com sua base no Congresso. Leia a íntegra da fala de Bolsonaro na ONU.

    “Não foi um discurso surpreendente ou que tenha trazido qualquer sinal novo em termos de política externa. Tampouco apresentou qualquer sinal de mudança na maneira de conduzir os itens da agenda doméstica. Ele confirmou apenas suas apostas e sua resiliência para enfrentar seus próprios temas”, diz o doutor em Ciência Política pela USP e sócio da Tendência Consultoria, Rafael Cortez.

    No discurso, o presidente reiterou bandeiras que foram encampadas por seus apoiadores, como o combate ao comunismo, a proteção da família tradicional e liberdade de culto e de expressão. Num dos trechos, o presidente disse: “Temos a família tradicional como fundamento da civilização”.

    “Havia expectativa, em relação a essa gangorra retórica em que Bolsonaro vive, de moderação no discurso. Mas vimos o Bolsonaro de sempre, com o discurso mais voltado para a base, um pouco descolado da realidade concreta”, diz o cientista político José Paulo Martins Jr., professor da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio).

    Bolsonaro voltou a criticar governadores que adotaram, durante a pandemia, medidas restritivas que, segundo ele, prejudicaram a economia, como lockdown e toque de recolher, por exemplo. “Lamentamos todas as mortes no Brasil e no mundo (pela Covid-19). Sempre defendi a necessidade de combater o vírus e o emprego. Medidas de isolamento e de lockdown deixaram um legado de inflação no país”, disse o presidente, retomando o mesmo discurso adotado no chamado “cercadinho” – quando atende apoiadores à porta do Palácio do Planalto – e em suas lives semanais.

    O presidente também continuou fazendo uma defesa do tratamento precoce, que a ciência já declarou ser ineficaz no combate à Covid-19: “Não entendo por que muitos países e a mídia se colocaram contra (o tratamento precoce). A História e a ciência saberão responsabilizar todos”.

    “Depois da carta à Nação, pensamos que o presidente poderia ter um comportamento mais pragmático. Mas não teve. Isso frustra, mas não surpreende”, retoma Cortez. Após um período conturbado na relação com o Supremo Tribunal Federal (STF), em que chegou a declarar que não cumpriria determinações do ministro Alexandre de Moraes, o presidente chegou a divulgar uma carta em que diminuía a fervura entre os dois Poderes.

    No discurso da ONU, Bolsonaro voltou a atacar os meios de comunicação, sob a tese de que é perseguido. E afirmou que seu governo aumentou a credibilidade do Brasil junto à comunidade internacional. Para isso, buscou destacar números que demonstrariam redução no desmatamento da Amazônia e exaltou o desempenho do agronegócio.

    “O Brasil ser ‘celeiro do mundo’ é algo inerente da nossa exportação – e o alto desmatamento é para acomodar isso. Esse argumento de alimentar o mundo pode ser usado para o público externo, mas isso tem um custo ambiental. Mas claro que, com o dólar nas alturas, o agronegócio se beneficia muito”, aponta Martins, da Unirio.

    Numa resposta às críticas feitas por ambientalistas, Bolsonaro procurou lançar mão de números sobre políticas de meio ambiente. Segundo ele, o país está reduzindo o desmatamento na Amazônia. “Nenhum país do mundo possui uma legislação ambiental tão completa como o nosso. O código florestal deve servir de exemplo. O Brasil tem dimensões continentais, com 8,5 milhões de quilômetros quadrados, dos quais 62% são vegetação nativa, a mesma desde o descobrimento. Na Amazônia tivemos uma redução de 32% do desmatamento no mês de agosto, quando comparado a agosto do ano passado”, disse o presidente.

    Este último dado é diferente do que foi divulgado na segunda-feira (20) pelo Sistema de Alerta de Desmatamento do Imazon, que monitora a região amazônica por satélite. Segundo relatório, foram desmatados 1,6 mil quilômetro quadrado de floresta mês passado, cerca de 7% maior que o registrado em 2020. Ainda de acordo com as informações, o acumulado desde janeiro também foi o pior nos últimos dez anos.

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