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    Morre Madeleine Albright, a primeira mulher a ser secretária de Estado dos EUA

    Família afirma que câncer foi a causa da morte; Albright foi a principal figura da política externa norte-americana após a Guerra Fria e deixa um legado de coragem e pioneirismo

    Caroline Kellyda CNN

    Madeleine Albright, a primeira mulher secretária de Estado dos Estados Unidos e principal responsável por orientar a política externa ocidental após a Guerra Fria, morreu nesta quarta-feira (23). Ela tinha 84 anos.

    “Estamos com o coração partido em anunciar que a Dra. Madeleine K. Albright, a 64ª secretária de Estado dos EUA e a primeira mulher a ocupar esse cargo, faleceu hoje cedo. A causa foi o câncer”, disse a família no Twitter. 

    A morte foi confirmada em um e-mail para a equipe do Albright Stonebridge Group, uma empresa de estratégia global fundada por Albright. A ex-secretária foi uma figura central no governo do ex-presidente Bill Clinton.

    Ela defendeu a expansão da Otan, pressionou para que a aliança interviesse nos Bálcãs para impedir o genocídio e a limpeza étnica, procurou reduzir a disseminação de armas nucleares e defendeu os direitos humanos e a democracia em todo o mundo.

    Em um artigo de opinião do New York Times escrito no mês passado, pouco antes da invasão da Ucrânia pela Rússia, Albright argumentou que o líder russo Vladimir Putin estaria cometendo “um erro histórico” ao invadir a Ucrânia e alertou sobre os custos devastadores para seu país. 

    “Em vez de pavimentar o caminho da Rússia para a grandeza, invadir a Ucrânia garantiria a infâmia de Putin ao deixar seu país diplomaticamente isolado, economicamente aleijado e estrategicamente vulnerável diante de uma aliança ocidental mais forte e unida”, escreveu Albright. 

    Uma pioneira

    Albright estava ciente de seu papel como pioneira e muitas vezes falou dos desafios de ser a primeira mulher a liderar o Departamento de Estado dos EUA.  

    “Acho que havia questões reais sobre se uma mulher poderia ser secretária de Estado. E não apenas em termos de lidar com as questões, mas em termos de lidar com as pessoas, especialmente em sociedades hierárquicas. Eu descobri, na verdade, que eu poderia fazer isso”, disse ela à CNN em 2005.

    “E as pessoas, eu acho, agora podem entender que é perfeitamente possível para uma mulher ser secretária de Estado, e estou muito feliz que haja uma segunda”, uma referência à então Secretária de Estado Condoleezza Rice. 

    Ao longo de sua carreira, Albright era conhecida por usar broches ou alfinetes decorativos para transmitir suas mensagens de política externa. Quando ela descobriu que os russos haviam grampeado o Departamento de Estado, ela usou um grande alfinete de inseto na próxima vez que se encontrou com eles.

    Quando Saddam Hussein se referiu a Albright como uma cobra, ela passou a usar um broche de cobra de ouro; quando ela foi chamada de bruxa, ela orgulhosamente brandiu uma vassoura em miniatura.

    Questionada pelo jornal USA Today em agosto de 2020 sobre como definiria coragem, Albright respondeu: “é quando você defende o que acredita quando nem sempre é fácil e você é criticado por isso”.  

    “Demorei muito para encontrar minha voz. Mas tendo encontrado, não vou calar a boca”, disse a ex-secretária. “Vou usá-la da melhor maneira possível para garantir que a democracia seja nossa forma de governo e que aqueles ao redor do mundo que desejam viver em uma democracia tenham a possibilidade de fazê-lo.” 

    Depois que os anos Clinton e os anos 1990 terminaram, Albright se tornou um ícone para uma geração de mulheres jovens que buscavam inspiração em sua busca por oportunidades e respeito no local de trabalho. Ela gostava de dizer: “Há um lugar especial no inferno para as mulheres que não se ajudam”. 

    Legado

    Albright foi o principal rosto da política externa norte-americana na década entre o fim da Guerra Fria e a guerra ao terror desencadeada pelos ataques de 11 de setembro de 2001, uma era anunciada pelo presidente George H.W. Bush como uma “nova ordem mundial”.

    Ela mesma se descrevia como “idealista pragmática”, e cunhou o termo “multilateralismo assertivo” para descrever a política externa do governo de Bill Clinton. A ex-secretária tratou os EUA como “nação indispensável” para usar a diplomacia apoiada pelo uso da força para defender os valores democráticos em todo o mundo.

    “Nós nos erguemos e vemos o futuro mais longe do que outros países, e vemos o perigo aqui para todos nós”, disse ela à rede americana NBC em 1998. “Sei que os homens e mulheres americanos de uniforme estão sempre preparados para se sacrificar por liberdade, democracia e o modo de vida americano”, completou.

    Talvez o seu feito mais notável tenha sido os esforços para acabar com a violência nos Bálcãs, assim como seu papel crucial para pressionar Clinton a intervir no Kosovo em 1999 para evitar um genocídio contra muçulmanos étnicos pelo ex-líder sérvio Slobodan Milosevic. Albright carregava o peso do fracasso da gestão anterior do governo Clinton em acabar com o genocídio na Bósnia.

    Albright acusou Milosevic de criar “um horror de proporções bíblicas” em seu “desejo de exterminar um grupo de pessoas” — a maioria muçulmana do Kosovo. Ela foi alvo de críticas acaloradas em Washington na época, com alguns chamando os ataques aéreos da Otan de “Guerra de Albright”, enquanto outros a acusavam de julgar mal a determinação de Milosevic.

    Sobre isso, a então secretária de Estado disse em 1999: “Assumo total responsabilidade junto com meus colegas por acreditar ser essencial para nós não ficarmos parados e assistir ao que Milosevic estava planejando fazer”, acrescentando que “não podemos assistir a crimes contra a humanidade”. 

    A coalizão da Otan liderada pelos EUA parou a agressão sérvia e Kosovo declarou a independência em 2008.  

    O esforço contrastou com a oposição do governo Clinton à ação internacional para impedir o genocídio de 1994 em Ruanda. Na época em que Albright representava os EUA na ONU, o governo Clinton defendeu a retirada da maioria das tropas da ONU do país nos primeiros dias do genocídio.

    O subsequente massacre, principalmente de tutsis étnicos, bem como alguns hutus moderados por extremistas hutus, deixou pelo menos 800 mil mortos. Anos depois, Albright chamou o episódio de seu “maior arrependimento daquela época”. 

    O mandato de Albright como secretária de Estado também viu os atentados da Al-Qaeda nas embaixadas dos EUA no Quênia e na Tanzânia, que mataram 224 pessoas. Ela classificou o ataque como o “dia mais difícil” de seu mandato, mas rejeitu as críticas de que deveria ter provocado uma ação mais dura dos EUA contra o grupo terrorista que mais tarde realizaria os ataques terroristas de 11 de setembro.  

    “Teria sido muito difícil, antes do 11 de setembro, convencer alguém de que uma invasão do Afeganistão era apropriada”, disse Albright à Comissão do 11 de setembro em 2004. “Acho que foi preciso o megachoque, infelizmente, para fazer as pessoas entenderem a ameaça considerável.”  

    História

    Nascida Marie Jana Korbelova, filha de um diplomata checoslovaco, em Praga em 1937, Albright teve de fugir da então Tchecoslováquia com sua família dez dias após a invasão nazista.

    Sua experiência crescendo na Iugoslávia comunista e depois fugindo para os EUA fez dela uma opositora ao longo da vida do totalitarismo e do fascismo.

    Albright se formou no Wellesley College em 1959 e foi casada com Joseph Albright de 1959 até 1983, quando se divorciaram. Eles tiveram três filhos, as gêmeas Anne e Alice em 1961 e Katharine em 1967. Ela frequentou a Universidade de Columbia para seu mestrado e doutorado, que concluiu em 1976 antes de iniciar uma carreira de décadas no serviço governamental e no trabalho de relações exteriores sob diferentes políticos e causas democratas.  

    Foi nomeada para se tornar a primeira mulher secretária de Estado e confirmada por unanimidade em 1997 por Bill Clinton. Ela ficou no cargo até 2001. 

    Após seu mandato como secretária de Estado, Albright atuou como presidente do Instituto Democrático Nacional para Assuntos Internacionais em Washington de 2001 até sua morte, e lecionou na Universidade de Georgetown.

    Ela também foi uma autora prolífica, escrevendo vários livros, incluindo um livro de memórias em 2003 intitulado “Senhora Secretária”. A ex-secretária também trabalhou no setor privado por um período.  

    Em 2012, Albright recebeu a Medalha Presidencial da Liberdade do presidente Barack Obama, que disse que sua “dureza ajudou a trazer a paz aos Bálcãs e abriu caminho para o progresso em alguns dos cantos mais instáveis do mundo”. 

    Ao longo de sua aposentadoria, Albright continuou trabalhando pela democracia em todo o mundo e falando sobre a política dos EUA, fazendo críticas particularmente duras ao presidente Donald Trump, a quem ela chamou de “o presidente mais antidemocrático da história americana moderna”.  

    Este conteúdo foi criado originalmente em inglês.

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