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    Maurício Pestana: Mercosul, cor, poder, raça e desigualdade

    Mesmo que a maioria da população de alguns dos países sejam de descendências negra e indígena, no encontro do bloco enxergamos apenas a presença branca de descendência europeia nas mesas de decisões

    Maurício Pestana

    “Pela cara do prefeito você conhece a cidade.”

    A primeira vez que ouvi esta frase ri muito, pois ela parecia apenas engraçada sem muito sentido ou pretensão de ser aqueles dizeres de efeitos que nos fazem refletir. Mas não demorou muito para eu dar a devida importância para a real mensagem contida na frase e ver que o sentido dela me fazia lembrar aquela outra metáfora menos engraçada, mas muito real quando diz que “cada povo tem governante que merece”.

    Ao ver o retrato do Mercosul, encontro que está acontecendo nesta semana, dá para entender um pouco o porquê este pedaço do mundo ostenta números alarmantes de desigualdades.

    Nossa região é a parte do mundo com a maior desigualdade de renda do planeta, como destacou relatório de desenvolvimento humano de 2019 do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).

     

    Na Argentina, por exemplo, atualmente, mais de 11 milhões de pessoas vivem abaixo da linha da pobreza. Os dados mais recentes do Instituto Indec mostram ainda que 36,5% das pessoas recebem até US$ 5,50 por dia no país.

    A pobreza e a extrema pobreza dos argentinos estão maiores que em 2019, antes da pandemia de Covid-19.

    No Chile, país que não faz parte do bloco, mas faz divisa com os principais países do bloco, a história se repete.

    Uma mulher em um bairro pobre de Santiago, capital do Chile, nasce com uma expectativa de vida de 18 anos a menos que outra de uma área rica da mesma cidade.

    Em São Paulo, essa lógica também prevalece. Quem mora, por exemplo, em Paraisópolis, uma das maiores favelas da cidade, vive em média 10 anos a menos do que os moradores do Morumbi, bairro rico ao lado da comunidade, de acordo com o Mapa da Desigualdade, da ONG Rede Nossa São Paulo, que compila dados públicos.

    Mas voltando a foto dos líderes do Mercosul logo me faz lembrar que a desigualdade social é a cor da pobreza nesse pedaço do mundo que também é expressa na cor e procedência social e racial de suas lideranças presentes no encontro.

    Embora a maioria da população de alguns dos países que compõem o bloco sejam de descendências negra e indígena, quando olhamos a composição das lideranças políticas e econômicas presentes no encontro enxergamos apenas a presença branca de descendência europeia nas mesas de decisões.

    Para os menos atentos a essas questões vou dar um exemplo. É como se estivéssemos em uma reunião da União Africana, bloco que reúne 55 países africanos e víssemos 90% dos participantes brancos de descendência europeia. Ou vermos uma conferência de países asiáticos com lideranças da China, Vietnã, Coreia entre outros com pessoas brancas sentadas na mesa decidindo o futuro econômico dos asiáticos. Ou até mesmo ver uma reunião da União Europeia, com todas as lideranças negras.

    Enfim, entender por que os números das desigualdades, das diversas formas de violências que sofrem não os latino-americanos em geral cuja matriz populacional é negra, branca e indígena é perceber que desses povos apenas os de descendência europeia ocupam espaços reais de poder, um privilégio que não é apenas no Brasil, mas em toda a região como mostra o retrato dos líderes do Mercosul que pode se estender a toda América Latina com raríssimas exceções.

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